Ao pôr-se a corrigir a subparticipação histórica de militares, governo incorre em risco
Profissionais egressos das Forças Armadas têm tido preferência no preenchimento de postos de primeiro e segundo escalão do governo Jair Bolsonaro (PSL). Esse padrão, também caudatário do déficit de quadros qualificados no movimento que venceu a eleição em outubro, deve ser visto com reservas.
Os militares brasileiros, em especial os oficiais que alcançaram o topo da carreira após longa e variada trajetória de serviços públicos, qualificam-se para atuar em alguns setores da administração civil.
Conheceram bem o território nacional e seus entraves logísticos, acumularam experiência na segurança urbana e desenvolveram habilidades para lidar institucionalmente com outros Poderes e corpos burocráticos. Com essas credenciais, é de lamentar que tenham atuado pouco nos ramos civis afins em gestões anteriores.
Ao pôr-se a corrigir a subparticipação histórica de militares, o governo Bolsonaro incorre no risco oposto, o de exagerar na dosagem.
Contam-se 21 áreas da administração com indicados oriundos do Exército, da Marinha ou da Aeronáutica. Há militares em setores de pouca relação com a formação precípua dos profissionais da defesa nacional, como a educação, o Banco Central, a Petrobras, a Caixa Econômica Federal e Itaipu.
A concentração de nomeações numa corporação reduz a diversidade de conhecimentos e experiências necessária para tocar com eficiência a máquina federal. Não apenas os valores positivos, mas também as idiossincrasias da caserna influenciarão decisões civis.
Pelo seu peso desproporcional na gestão, os militares poderão angariar privilégios injustos na repartição dos custos sociais da reforma da Previdência, por exemplo.
Com o passar do tempo, a percepção de que os quartéis se tornaram catapultas para cargos de destaque no governo —alguns deles movimentando vários bilhões de reais por ano— tende a solapar a barreira, vital na democracia, entre a política partidária, de um lado, e as Forças Armadas, do outro.
Esse contágio daninho, temido pelos comandantes militares de hoje, será muito difícil de evitar caso se prolongue participação tão extensa e profunda na gestão.
Embora o Executivo federal no Brasil agregue muitas atribuições cujo exercício deveria ser reservado ao melhor saber técnico, os postos de comando nos ministérios e no Palácio do Planalto têm altíssimo teor político. Arbitram demandas legítimas da sociedade que não podem ser todas atendidas.
Um critério representativo, portanto, deveria ser levado em conta na confecção do governo, mas Bolsonaro menosprezou esse aspecto neste início de mandato. A baixa conexão com o Legislativo e a diversidade regional e burocrática é uma aposta arriscada.
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