Leniência de políticos e agentes públicos permite que o crime atue em áreas de expansão imobiliária
O Rio tem uma longa história de ocupação desordenada do espaço urbano. Não que seja uma exclusividade carioca, pois favelização é um mal brasileiro. Mas, no Rio, a convivência, lado a lado, de “comunidades” e residências de luxo é algo pouco visto e se tornou marca local.
Esta diversidade deixou traços positivos na cultura carioca, mas entrou em metástase: na saúde pública, na segurança, nas moradias em áreas de alto risco, e assim por diante. Governos perderam oportunidades para a realocação eficiente de famílias de baixa renda. Por falta de planejamento na ampliação a seu tempo da infraestrutura de transportes de massa, para permitir que as pessoas pudessem morar de forma confortável longe de seus lugares de trabalho. Vieram, ainda, ciclos populistas nos governos locais que reforçaram a falta de cuidado com a expansão da cidade.
Até chegarmos ao ponto em que estamos, no qual a ausência do Estado na gestão dos espaços — para tratarmos apenas da questão urbanística — faz com que não haja mais poder público, no sentido real do termo, à frente do crescimento da cidade, sendo este espaço ocupado pela criminalidade. Já há algum tempo, caso da Zona Oeste — Barra, Jacarepaguá, Santa Cruz, para citar apenas alguns bairros onde isso é mais claro —, milícias, um braço do crime organizado, crescem nos negócios imobiliários ilegais. Nas Vargens, outra região típica, imóveis de alvenaria também são construídos e comercializados pelo crime. Ninguém os impede, porque o Estado já está muito débil. Ou infiltrado.
É assombroso que um crime da gravidade do assassinato da vereadora Marielle Franco e de Anderson Gomes, de repercussão mundial, possa estar relacionado ao avanço de milicianos nesses bairros, contra o qual se opunha Marielle. Ausente o Estado, tudo pode acontecer. Como mostrou reportagem do GLOBO de quinta-feira: entre o Morro do Timbau e as favelas Salsa e Merengue, no Complexo da Maré, às margens da Linha Vermelha e Avenida Brasil, não muito longe do Centro, traficantes constroem, sem medo, casas de alvenaria em um terreno que havia sido reservado pela prefeitura para escolas públicas.
O espaço que seria usado para evitar que jovens fossem cooptados pelo crime está sendo utilizado, sem qualquer repressão, para elevar os lucros do próprio tráfico. Chega a ser cruel. A situação ultrapassa limites perigosos, quando bairros passam ase expandir tendo como incorporadores imobiliários o crime.
Não faltam leis e códigos para ordenara cidade, inexiste é vontade de aplicá-los. Deveria haver a mobilização de agentes públicos — promotores, procuradores, juízes etc. —, e não apenas das esferas estadual e municipal, para recolocar o Estado nas suas funções. É o que tem de ser feito para evitara anarquia geral que se aproxima.
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