- O Estado de S. Paulo
Paulo Guedes ameaçou deixar o governo caso a reforma da Previdência vire uma “reforminha”. Fixou até um piso: economia de R$ 800 bilhões em dez anos. Quais os riscos da ameaça do titular da Economia?
É lobo mesmo? Não é a primeira vez que o ministro mais importante do governo Jair Bolsonaro ameaça pedir o boné caso as coisas não saiam como planejou. Ao usar essa retórica reiteradamente, Guedes vai minando, aos poucos, seu próprio papel de âncora da estabilidade de um governo altamente instável.
Os riscos. Na entrevista à Veja em que afirma que sairá caso haja uma “reforminha”, o ministro: 1) passa o tom de que está pressionando um Congresso já pressionado; 2) deixa Jair Bolsonaro vulnerável num momento em que enfrenta crise de popularidade e as primeiras manifestações de rua, e 3) fixa um novo “piso” para a Previdência, algo temerário no atual momento.
Bolsonaro não gostou. Guedes age como trader, mostrando que pode “rever a posição” caso o cenário não se configure como ele imaginou. Compreensível a reação de Bolsonaro, ao dizer que ninguém é obrigado a ser seu ministro –seria isso ou ficar refém eternamente de ameaças reiteradas. O principal e um dos mais preparados ministros do governo age um pouco como o Pedro da fábula, que, de tanto gritar “olha o lobo”, pode não ser ouvido quando o lobo de fato vier.
O contexto. O aviso de Guedes chega num momento especialmente delicado para o governo. Pesquisa da XP Investimentos mostra que pela primeira vez a aprovação a Bolsonaro é menor numericamente que a rejeição. 36% dos entrevistados avaliaram o governo como ruim e péssimo ante 34% que disseram que é ótimo ou bom. As relações com o Congresso estão em ponto alto de tensão, e os protestos marcados para domingo se apresentam como um risco múltiplo para o presidente.
Equações perigosas. Trata-se de aposta bastante inusitada conclamar a população para as ruas no momento em que a população começa a responsabilizar o atual governo pela situação da economia. O resultado dos atos pode conter várias armadilhas: se forem grandes, darão ao governo a falsa ilusão de que representam o conjunto da sociedade, e, portanto, vale a pena insistir na forma atual de governar e se relacionar com os demais Poderes. Se forem modestos, vão evidenciar o desgaste do governo em sua fase inicial. Nas duas hipóteses, e se as pautas forem majoritariamente de achincalhe dos políticos, podem aumentar a hostilidade do Congresso em relação ao Executivo.
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