- Folha de S. Paulo
Grupo tem se mostrado leniente com infrações de trânsito e crimes ambientais
Conservadores normalmente se consideram defensores de uma ordem baseada no respeito a uma autoridade tradicional que pune com rigor os desvios da norma social. Já os progressistas costumam se entender como defensores de uma ordem baseada numa autoridade diluída que compreende e respeita a diversidade.
Essas são, grosso modo, as características constitutivas das duas visões de mundo segundo o influente e clássico livro de George Lakoff, "Moral Politics" (University of Chicago Press, 1996).
Embora essa descrição provavelmente seja aceita por atores dos dois campos, ela não parece descrever com precisão o jogo político contemporâneo, especialmente no caso dos conservadores.
Se olharmos com atenção, veremos que conservadores não respeitam toda autoridade tradicional, mas apenas algumas delas. Na verdade, o conservadorismo contemporâneo, pelo menos na sua expressão mais vulgar, tem se mostrado em muitos casos agudamente antiautoridade.
Uma parcela expressiva dos conservadores, por exemplo, tem desafiado a autoridade da ciência, fomentando uma cultura de desconfiança generalizada ao conhecimento científico, que é especialmente forte em temas que foram politizados como mudança climática, segurança pública e orientação sexual e de gênero.
A autoridade profissional do jornalismo também tem sido contestada por conservadores que acusam a cobertura da grande imprensa de ser parcial e esquerdista.
Conservadores também têm assumido uma postura desafiadora das regras da boa educação e respeito à diversidade, apresentando-se como iconoclastas que se insurgem contra o politicamente correto.
Mesmo no tocante ao rigoroso cumprimento da lei, os conservadores têm sido lenientes, em certos casos. Embora punitivistas duros no tocante a crimes contra o patrimônio, têm adotado uma postura relaxada com infrações às leis de trânsito e de proteção ambiental.
No trânsito, diferentes governantes conservadores têm aumentando limites de velocidade, retirado radares e diminuído a penalidade por infrações. No tocante a regras ambientais, vimos Bolsonaro propor reduzir o valor de multas e debilitar regras de proteção.
Embora a visão de mundo conservadora pareça efetivamente estar orientada ao respeito à autoridade tradicional, essa autoridade tem sido questionada sempre que sua recomendação desafia preceitos e valores caros aos conservadores, como quando indica respeitar orientações e identidades sexuais ou limitar o sagrado direito de devastar o meio ambiente e dirigir o seu veículo sem amarras.
*Pablo Ortellado, professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.
Nenhum comentário:
Postar um comentário