Partidos pedem mudanças no texto, e Bolsonaro defende regra para policiais
Geralda Doca, Manoel Ventura, Jussara Soares e Gustavo Maia / O Globo
BRASÍLIA - Pressões de partidos, governadores, prefeitos e até do presidente Jair Bolsonaro para fazer ajustes de última hora no texto na reforma da Previdência, além do apetite de parlamentares por mais verbas, atrapalharam o andamento da reforma da Previdência no plenário da Câmara. O plano original do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), era votar o texto ainda ontem, mas, após um dia de negociações, os parlamentares iniciaram as discussões, e a votação ficou para hoje. Ela deve ocorrer após a visita de Bolsonaro à Casa para participar da sessão solene de aniversário da Igreja Universal do Reino de Deus, pela manhã
O primeiro requerimento da oposição para retirara reformada Previdência da pauta foi derrotado por 331 votos a 117, por volta das 22h30m. O número foi expressivo, diante da necessidade de 308 a favor para aprovara reforma.
Maia decidiu adiara conclusão das discussões para hoje e disse que já tinha votos suficientes para aprovara reforma. Ao respondera um parlamentar, afirmou que estava protegido e sacou do bolso um amedalha de Nossa Senhora Aparecida, que ganhou de presente de sua mulher. Hoje, os parlamentares ainda devem lidar com as manobras regimentais da oposição e votar o texto-base.
LIBERAÇÃO DE VERBA
Ao longo do dia, parlamentares que falaram sob anonimato demonstraram insatisfação com os R$ 2,5 bilhões empenhados nos cinco primeiros dias de julho, já que o valor desejado chegaria a R$ 10 bilhões. No fim da noite, ficou acertado, segundo deputados que articularam a votação do texto no plenário, que hoje será editado um projeto de lei do Congresso Nacional (PLN) autorizando a liberação de mais recursos para os partidos.
A sessão do plenário de ontem foi tomada por outros assuntos, como um projeto que regulamenta a vaquejada. Apenas às 20h50m Maia anunciou a abertura dos trabalhos sobre a Previdência. Começaram, então, a ser analisados requerimentos de adiamento da oposição como parte do chamado kit obstrução (manobras regimentais).
O dia começou com Maia dizendo que cada hora seria decisiva para aprovara reforma, como surgimento de vários problemas que precisariam ser enfrentados para não desorganizara base de apoio.
As negociações entre os líderes dos partidos se prolongaram durante o dia. O primeiro ajuste no texto da reforma, acertado com o governo, permitirá melhorar o valor da aposentadoria das mulheres, que poderão se aposentar com tempo mínimo de contribuição de 15 anos. A medida, que terá impacto de R$ 30 bilhões em dez anos, atende a pedido da bancada feminina, formada por 77 deputadas.
A hipótese de retirar os professores da reforma também voltou a ser discutida.
Mais tarde, o problema foi a inclusão dos estados e municípios na reforma. Isso seria feito por meio de um destaque (proposta de alteração) apresentado pelo partido Novo, depois da pressão de governadores como Ronaldo Caiado (DEM-GO) e Eduardo Leite (PSDB-RS), além de 500 prefeitos, junto aos deputados. Como a medida poderia provocar uma derrota na votação, Maia sugeriu que a mudança seja feita no Senado:
— Estamos construindo uma solução em conjunto com eles. O que eu entendo é que é muito difícil que a Câmara aprove esse tema, infelizmente. Todo mundo sabe que sou a favor. Mas, de repente, pode ter uma construção da inclusão no Senado.
Caso o Senado aprove a inclusão de estados e municípios, apenas essa alteração voltaria para a Câmara. O restante da proposta de emenda à Constituição (PEC), sem mudanças em relação ao texto eventualmente aprovado pela Câmara, seria promulgado.
Em meio às discussões, surgiu a possibilidade de um destaque para incluir na reforma somente os municípios. As cidades enfrentam rejeição menor dos deputados, que não querem arcar sozinhos com o ônus de votar um projeto impopular e prejudicar suas bases nos estados. Ainda não há solução para essa questão, mas ela teria apoio do governo.
—Agente está no plenário para tentar incluir os municípios. Estamos conversando com os líderes para incluir. Mas está muito difícil até o momento — reconheceu o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CMN), Glademir Aroldi.
Para complicara situação, Bolsonaro defendeu, mais uma vez, regra especial para policiais federais e agentes de segurança nacionais, que sairiam da reforma. As regras seria meditadas em projeto de lei complementar, após a promulgação da PEC. Desde a semana passada, Bolsonaro tem atuado para que policiais tenham normas mais brandas de aposentadoria.
—Nunca é tarde para desfazerem possíveis injustiças. Uma ou outra categoria se sente prejudicada, é justo o reclame deles—afirmou o presidente, que prometeu ainda a edição de uma proposta específica para a categoria. — O que eu tenho falado é a questão do privilégio. Todo mundo está colaborando de uma forma ou de outra com essa questão da Previdência. Agora, privilégio essa classe nunca teve. Então, acho que o ajuste passa por aí. Pelo que tudo indica, que chegou ao meu conhecimento, é que essas classes (da segurança pública) deverão sair da PEC e deverão compor uma lei complementar tão logo seja promulgada essa PEC.
DESCONFIANÇA
Depois da fala de Bolsonaro, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que foi exonerado para participar da votação da reforma, foi à Câmara e disse que essa questão estava resolvida, “no seu entendimento”. Ele negou que o atraso na votação da reforma tenha relação com a falta de votos. Disse que existem mais de 330 votos favoráveis à matéria:
—Temos uma grande chance de esta semana votar em primeiro e segundo turnos a nova Previdência, e o Brasil oferecer já um novo cenário para os investimentos.
Perguntado ontem se havia desconfiança dos deputados em relação à promessa do governo de liberar verbas extras em troca de votos para aprovação da reforma da Previdência, Maia respondeu:
—Todo o processo do Legislativo de relação com o Executivo é sempre de desconfiança, porque esse governo no início gerou uma desconfiança. Mas acho que isso vai caminhar para o leito normal do rio, e a gente vai construir, daqui para frente, uma relação mais harmônica entre os poderes. (Colaborou Bruno Góes)
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