Depois da prisão do amigo e ex-PM Fabrício Queiroz em junho, Bolsonaro baixou o tom e procurou aproximar-se do Supremo Tribunal Federal (STF), que antes atacara várias vezes. Mas as instituições não param, e as investigações que tanto preocupam e irritam o presidente prosseguem. Resultado: no inquérito aberto em maio no STF a pedido da Procuradoria-Geral da República, um relatório parcial da PF apontou pela primeira vez a conexão entre atos antidemocráticos realizados pelo país e o Palácio do Planalto.
O inquérito complementa um outro, que trata da produção de notícias fraudulentas dirigidas contra a Corte e seus ministros, distribuídas por bolsonaristas nas redes sociais. Os dois temas, ambos conduzidos pelo ministro Alexandre de Moraes, se misturam.
Já havia evidências de que os canais no YouTube que pregavam golpe militar com Bolsonaro no Planalto recebiam dinheiro do governo por meio da veiculação de publicidade oficial, programada pela Secretaria de Comunicação (Secom), segundo O GLOBO revelou em maio. Informações sobre o desvio de dinheiro público para causas bolsonaristas foram enviadas pela CPI das Fake News à PF, onde as investigações são conduzidas pela delegada Denisse Dias Ribeiro.
No relatório, ela registra que não há provas de que os agentes públicos que lançaram a publicidade na internet tomaram as devidas precauções para evitar que a propaganda oficial fosse veiculada em canais que “difundem ideias contrárias às professadas pelo estado democrático de direito”. O Google, controlador do YouTube, já explicou que seu sistema de edição de publicidade dispõe de ferramentas para destinar os conteúdos a públicos definidos pelo cliente. Logo, o inquérito sugere ter havido intenção de veicular a propaganda nesses canais, para apoiá-los com dinheiro do Tesouro.
Quando o Facebook, numa auditoria mundial para identificar e eliminar contas e páginas usadas ilegalmente, derrubou em julho uma rede de 73 contas e 14 páginas de um grupo bolsonarista, nela estavam os filhos Zero Um e Zero Três, o senador Flávio e o deputado Eduardo Bolsonaro, ao lado de parlamentares do PSL.
Tal varredura jogou luzes sobre a equipe de militantes que, de dentro do Planalto, gerenciava a usina de fake news chamada por Bolsonaro de “minha mídia”. A equipe, conhecida como “gabinete do ódio”, era operada pelo assessor Tercio Arnaud Tomaz, descoberto pelo vereador Carlos Bolsonaro, o Zero Dois, e cedido ao pai para ajudar na guerrilha digital. Tomaz era, segundo a auditoria, um dos vértices do sistema de desinformação, calúnias e agressões à democracia.
O trabalho da PF é uma ação republicana para desmontar um aparelho bolsonarista incrustado na máquina do Estado — a exemplo do que aconteceu nas investigações do mensalão e na Lava-Jato. Trata-se de uma ação pedagógica para ensinar os limites entre o legal e o ilegal. Bolsonaro não tem como se esquivar dela.
Nenhum comentário:
Postar um comentário