Chegamos a mais de 135 mil vidas brasileiras perdidas para a COVID-19. Lá se vão seis meses de pandemia. Todas as guerras e as grandes crises promoveram além de vítimas, mudanças, inovações e novas oportunidades. Além da tristeza, ficam as lições.
O primeiro aprendizado é que, apesar de nossa federação não garantir o grau de autonomia como nos EUA aos entes subnacionais, e os municípios não serem, diferente do Brasil, componentes da estrutura da organização federativa na maioria dos países, e o Supremo Tribunal Federal ter decidido unanimemente em abril que além do governo federal, governos estaduais e municipais tinham competência para determinar regras de gestão da pandemia em seu território, a coordenação federal é imprescindível.
O governo federal fez uma interpretação torta da decisão do STF e renunciou à liderança nacional. Transferiu para governadores e prefeitos toda a responsabilidade de gerir a situação de crise. E mais, numa postura negacionista, sinalizou contra a estratégia de isolamento social, entrou em conflito com estados e municípios, politizou a questão da cloroquina, abriu mão de centralizar a compra de equipamentos e medicamentos – atitude que evitaria várias situações de desabastecimento e corrupção- e deixou de orientar corretamente a população.
Outro legado importante é a percepção da centralidade da comunicação social nas políticas públicas. Enquanto tínhamos as entrevistas diárias do então ministro Luiz Henrique Mandetta se estabeleceu uma relação de confiança, empatia e de tranquilidade social, na medida do possível.
Havia um rumo. Depois que o governo central parou de se comunicar com o país ou passou a emitir sinais equivocados, a população se sentiu órfã e insegura em relação a medicamentos, isolamento social, vacinas, prevenção, testes, etc.
Aprendizado importante será a valorização do SUS, da atenção primária e das ações de prevenção em saúde. Nós, gestores do SUS, sempre tentamos mostrar que, apesar de todas as dificuldades financeiras e de gestão, o sistema tinha uma boa arquitetura e segurava a barra. Os dados reafirmam as desigualdades brasileiras. A mortalidade foi maior entre pobres e negros.
A mortalidade foi maior nos hospitais públicos do que nos privados. Mas, no limite de suas forças, o SUS deu conta do recado. E ficou claro que nos próximos anos não haverá recursos abundantes adicionais para o SUS, nem aumento da renda das famílias que as permitam contratarem planos privados.
Por isso, ao invés de erguermos “Muralhas da China” temos que perseguir o diálogo entre o SUS e a saúde suplementar, numa parceria que produza ganhos múltiplos.
Os ensinamentos da crise são vários, mas o espaço aqui é curto. Sem saudosismos de estratégias cepalinas de substituição de importações dos anos de 1950, temos que estar atentos à necessidade de seletivamente termos produção local de itens essenciais para não ficarmos tão dependentes em momentos assim de países como Índia e China.
Também é impressionante a desburocratização que ocorreu durante a crise. Decisões que demoravam anos foram decididas em semanas. Fica a lição: é possível um governo ágil. Gostaria de falar sobre a mudança nos processos de trabalho, home work, tele-saúde, tele-educação, inovações e e-comerce, solidariedade social, mas o espaço acabou.
*Marcus Pestana, ex-deputado federal (PSDB-MG)
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