Valor Econômico
Inflação e juros devem seguir altos em
2023, independentemente de quem vencer as eleições de outubro
O ano de 2023 promete ser bastante
desafiador, em que pese o recente otimismo do mercado financeiro com a
possibilidade de se trazer a inflação nas economias avançadas, próxima de
atingir os dois dígitos, de volta à meta de 2% ao ano sem um forte aperto monetário
e sem uma recessão. A realidade é que, ou os bancos centrais (BCs) sobem os
juros bem mais do que ora precificado nos mercados futuros, e os mantêm lá por
mais tempo do que hoje se prevê, ou o mundo irá retornar a um período de
estagflação.
No cenário mais provável em que os BCs, ainda que a contragosto, apertam bem mais a política monetária, o quadro que se colocará para as economias emergentes não será fácil, com o dólar se valorizando, a liquidez internacional diminuindo e o comércio internacional em queda. Isso significará inflação e juros mais altos e uma atividade econômica mais retraída nessas economias. Em alguns casos, isso resultará em instabilidade política e crises de financiamento externo. O que estamos vendo na Argentina atualmente já é, em parte, um resultado desse quadro global mais desafiador.
O Brasil apresenta alguns indicadores que
vão ajudá-lo a navegar nesses mares revoltos, como o déficit em conta corrente
relativamente pequeno e financiado pela entrada de investimentos externos, além
de um câmbio já desvalorizado para padrões históricos. Mas isso não significa
que não teremos um ano difícil pela frente.
Nossa inflação segue alta e trazê-la para
baixo não será fácil, nem rápido. A política fiscal expansionista adotada
pré-eleições é parte do problema, mas também contribuem para ele a inércia
elevada, fruto de a inflação estar alta e disseminada há tanto tempo, e as
expectativas desancoradas, com a perda de relevância das metas de inflação.
Isso significa que inflação e juros devem
seguir altos em 2023 e, possivelmente, depois disso. Essa previsão, me parece,
independe de quem vai vencer as eleições de outubro. O mesmo é provável em relação
à esperada desaceleração da atividade econômica, não se podendo descartar uma
recessão em 2023, e à piora das contas públicas, com a alta na despesa de juros
sobre a dívida pública, a queda das receitas, fruto da atividade mais fraca, e
a pressão por mais gastos públicos, típica de governos com viés populista.
Seja disfarçadamente, como tem feito o
atual governo, seja ostensivamente, como promete o ex-presidente Lula, também
deve se acabar com o teto de gastos introduzido pela Emenda Constitucional 95,
de 2016. Com isso os juros longos devem seguir altos, encorajando um certo
encurtamento dos prazos da dívida pública.
Por outro lado, uma área em que o resultado
da eleição fará diferença diz respeito ao nível e à forma de intervenção do
Estado na economia. O atual governo manteve reformas importantes aprovadas no
governo Temer, como a trabalhista e a redução dos subsídios de crédito dados
pelo BNDES, com a substituição da TJLP pela TLP, que são criticadas pelo PT.
Em termos de privatização, ainda que os
resultados tenham ficado bem aquém das promessas iniciais, é inquestionável que
o atual governo registrou avanços relevantes. A operação de maior destaque foi
a transferência da Eletrobrás para a iniciativa privada, mas há outros exemplos
importantes, como as vendas de várias subsidiárias de empresas estatais. Além
disso, se avançou bastante nas concessões para a iniciativa privada na área de
infraestrutura. Mais operações como essas devem ocorrer em caso de reeleição do
atual presidente, destacando-se as companhias Docas e, possivelmente, a
Petrobras.
O ex-presidente Lula fala pouco de seus
planos para a política econômica caso seja eleito. Porém, a julgar pelos
documentos publicados pela Fundação Perseu Abramo e assinados por algumas das
principais lideranças do PT, a tendência seria voltar às práticas do segundo
governo Lula e da administração Dilma, com a farta distribuição de subsídios
públicos.
Por exemplo, em documento publicado três
meses atrás (Frente de Expansão da Renda, do Emprego e do Investimento),
defende-se que "[p]ara a construção dessa nova indústria são fundamentais
instrumentos como conteúdo local, compras governamentais, crédito direcionado,
investimentos públicos, financiamento de clusters e start-ups, além de outras
políticas industriais, comerciais, de CT&I e de desenvolvimento regional,
compondo um complexo que impõe a necessidade de atuação do Estado e coordenação
do governo central" (pag. 25). Em documentos de dois anos atrás se propõe,
mesmo, a reversão de algumas privatizações.
Obviamente, o que prevalecerá, na prática,
vai depender de bem mais do que só os planos e desejos de quem vencer as
eleições de outubro. A necessidade de lidar com o cenário externo desafiador, a
inflação elevada e a economia retraída, além de um quadro fiscal em
deterioração, vai forçar a nova administração a ser mais ortodoxa do que talvez
estivesse nos planos. Por outro lado, a tendência é que a atual polarização
política siga forte em 2023, o que aumentará a tentação por soluções simples e
rápidas, mas erradas. Em síntese, apertem os cintos!
*Armando Castelar Pinheiro é professor da FGV Direito Rio e do Instituto de Economia da UFRJ e pesquisador-associado do FGV Ibre
Um comentário:
O articulista conseguiu ver positividade na política econômica do governo Bozo!
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