sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Rogério F. Werneck - Farra federal com impostos estaduais

O Globo

Chegou a conta da redução arbitrária do ICMS para controlar a aceleração inflacionária

Quem quer que tenha testemunhado o penoso esforço de construção — e reconstrução — do complexo arcabouço de controle fiscal montado no país ao longo das últimas três décadas não tem como evitar um sentimento de desolação diante da derrubada institucional que o governo e o Centrão têm promovido, para tentar viabilizar a qualquer custo a reeleição de Jair Bolsonaro.

Notícias recentes dão conta de que, em reação à imposição arbitrária e eleitoreira de alíquotas máximas de ICMS sobre combustíveis, energia elétrica e serviços de telecomunicação, vários estados já conseguiram respaldo do Supremo Tribunal Federal a seus pleitos de redução do pagamento dos serviços de suas dívidas com a União, em face da perspectiva de perda de receita tributária com que terão de lidar.

Trata-se de um desabamento institucional que qualquer pessoa com um mínimo de conhecimento do federalismo fiscal brasileiro teria sido capaz de prever. E, no entanto, não há registro de que, em Brasília, as autoridades fazendárias tenham feito chegar ao Planalto e ao Centrão suas apreensões, para não dizer seu alarme, quanto à inevitabilidade de tal desabamento.

Muito ao contrário, o que se vê é o Ministério da Economia fazendo-se de atônito e claramente a reboque de boa parte do vale-tudo que vem sendo orquestrado pelo Planalto e o Centrão, mas sempre disposto a dar sua bênção, a posteriori, aos despropósitos que vêm sendo cometidos.

No caso da redução de tributos imposta aos estados, o ministério prontificou-se a classificá-la como um movimento “tecnicamente correto”.

Se a ideia era reduzir o impacto do encarecimento de combustíveis sobre segmentos mais desfavorecidos da população, a solução deveria ter envolvido medidas mais bem focadas e menos onerosas para as contas públicas.

Dessa perspectiva, é indefensável que todos os consumidores de combustíveis fósseis do País tenham sido alegremente agraciados com tamanha redução de carga tributária.

Mas a ideia que inspirou, de fato, a redução de ICMS foi outra: conter, na marra, ainda que momentaneamente, a aceleração da inflação que vinha assombrando a campanha da reeleição no Planalto. Não é por outra razão que a desoneração incluiu também energia elétrica e serviços de telecomunicação.

Para culminar, a demagogia foi perpetrada com chapéu alheio, em brutal afronta ao pacto federativo. Uma medida populista, tomada na esfera federal, de redução draconiana de um imposto cobrado pela esfera estadual e compartilhado com os municípios. Tecnicamente correta?!

A lei complementar que assegurou a redução das alíquotas de ICMS prevê que os estados só serão ressarcidos caso venham a sofrer queda de receita superior a 5%. E, tendo em conta o excelente desempenho da arrecadação estadual nos últimos meses, o que se esperava, em Brasília, é que os estados não teriam como evidenciar queda de receita dessa magnitude ainda em 2022.

Essa era a essência da esperteza. Fazer uso ilegítimo do aumento de arrecadação dos estados, para, à bruta, reduzir impostos cobrados na esfera estadual e ampliar o escopo da farra fiscal eleitoreira em que a esfera federal está engajada. E, ao mesmo tempo, reduzir a capacidade de gasto dos governadores, majoritariamente de oposição, no ano eleitoral.

O que deu errado é que, no caminho, havia o Supremo. Que prontamente acolheu o direito dos estados de já compensarem suas perdas de receita no pagamento do serviço de suas dívidas com a União. Tudo isso, ao custo de mais uma ruptura inconsequente e custosa das regras do jogo que regulam o complexo arranjo de federalismo fiscal com que conta o país.

Tendo se deixado levar por incurável fascínio pela recriação da CPMF, o governo mostrou-se incapaz de liderar uma reforma de mais fôlego da tributação do valor adicionado, na linha dos projetos que tramitam há anos no Congresso. E, agora, ao cabo do vale-tudo em curso, deixa como legado, aos desafios da reforma, grave mixórdia adicional na legislação que regula a cobrança do principal imposto indireto do país.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

O DESgoverno Bolsonaro é um DESASTRE em todos os setores! DESeducação, corrupção, incompetência generalizada, militarização de serviços que funcionavam, desrespeito às mulheres e tribos indígenas... E o genocida vociferando sua total incapacidade e maldade!