quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

Nilson Teixeira - Uma lista de desejos para 2023

Valor Econômico

Dificilmente o futuro governo escapará de uma alta significativa da carga tributária, mesmo que provisória

Há um ano, apresentei uma lista neste espaço de políticas públicas que provavelmente não avançariam em 2022. Infelizmente, todas as nove previsões sobre o fracasso na atuação do governo neste ano provaram-se corretas. Desta vez, optei por listar políticas que, se adotadas em 2023, fortaleceriam os fundamentos domésticos e contribuiriam para a melhoria permanente das condições de vida da população mais pobre - prioridade tida como absoluta pelo futuro governo.

A lista não inclui ações de melhoria das relações internacionais, de respeito à diversidade e de adoção de políticas responsáveis para o meio ambiente, entre outras, pois essas medidas já parecem sacramentadas para implementação a partir de janeiro.

1 - Melhoria da qualidade da educação básica - essa é a prioridade para melhorar as condições de vida dos mais pobres no longo prazo. O governo eleito precisa investir em estímulos para a universalização do ensino em tempo integral, o fortalecimento do aprendizado, a melhoria da qualidade da alimentação escolar e a adoção de um sistema robusto de incentivos para professores e diretores. A ampliação da avaliação e do monitoramento dos alunos e das escolas precisa ser acompanhada por um sólido regime de qualificação de educadores e de eventual intervenção em escolas com desempenho defasado.

2 - Aprimoramento do SUS - apesar da justa melhoria da sua avaliação nos anos de pandemia, o sistema precisa ser aprimorado com diversas ações, entre as quais: universalização de iniciativas para marcação de forma eletrônica de consultas e de exames, eliminação das filas para procedimentos cirúrgicos, treinamento continuado dos profissionais da área da saúde, revitalização dos programas de vacinação, recuperação da Farmácia Popular, entre outras.

3 - Controle das contas públicas - o governo eleito precisa explicitar rapidamente a forma de financiamento do aumento do gasto público. A postergação do anúncio da proposta para o novo arcabouço de controle das contas públicas para o próximo ano é temerária, pois insere imprevisibilidade sobre a trajetória dos indicadores fiscais, prejudicando, consequentemente, os prognósticos para o país.

4 - Aprovação da Reforma Tributária - o presidente Lula sinalizou que essa é a agenda prioritária no Congresso. A discussão do tema está avançada nas duas casas legislativas e requer poucos meses para sua aprovação final, a menos que o governo decida propor alterações exageradas na proposta. Além disso, dificilmente o futuro governo escapará de uma alta significativa da carga tributária, mesmo que provisória, para cobrir o aumento de gastos programados para os próximos anos.

5 - Corte de privilégios - antes de elevar as alíquotas dos impostos, é preciso revisitar as renúncias tributárias, eliminando privilégios que não trazem benefícios para os mais pobres nem elevam a produtividade no país. Como o corte de renúncias é sinônimo de aumento da carga tributária, o correto seria reduzir impostos dos mais pobres ou, ao menos, cortar alíquotas de alguns tributos para não onerar ainda mais a sociedade, em vez de elevar os gastos públicos.

Esse caminho dificilmente será seguido. Ao contrário, as equipes temáticas têm sugerido novos benefícios que podem até fazer sentido, mas pressionam o desequilíbrio das contas públicas. Além disso, vários setores já apresentaram sugestões de mais intervenções e subsídios, parafraseadas como incentivos. A oferta de mais vantagens no âmbito do BNDES, por exemplo, além de comprovadamente não ter elevado o crescimento potencial nas últimas décadas, só aumentaria as distorções ao prover mais privilégios inúteis para grupos organizados, sem privilegiar a camada mais vulnerável da sociedade.

6 - Avanço da Reforma Administrativa - a sugestão de participantes da equipe de transição de elaborar nova proposta de reforma pelo futuro governo é equivocada, uma vez que uma profunda avaliação da estrutura de pessoal da União já foi realizada em 2019 e 2020. O futuro governo poderia simplesmente propor ajustes à reforma em tramitação. Uma nova proposta só adia ou evita a necessária diminuição de vantagens injustas da elite do funcionalismo público, entre as quais o privilégio associado à elevação salarial com base apenas no tempo de serviço, como os quinquênios.

7 - Manutenção de políticas públicas bem-sucedidas - o ideal seria que as iniciativas de sucesso do atual governo, como os incentivos às concessões de serviços de saneamento, fossem absorvidas pela futura administração.

Apesar já ter se manifestado contra as privatizações, seria positivo se o presidente Lula revisitasse essa decisão e continuasse com os processos de concessões e de desestatizações. A eficiência do Estado aumentaria, melhorando as condições de vida de toda a população caso os esforços do setor público em várias áreas fossem mais direcionados para a regulação e o controle setorial.

8 - Melhoria dos controles do Bolsa Família - será necessário evitar o registro familiar de forma desmembrada e definir contrapartidas por parte dos seus beneficiários. Ações dessa natureza garantiriam uma alocação mais eficiente dos recursos, liberando parte dos R$ 175 bilhões destinados para o programa.

A aprovação de grande parte da lista só exige vontade política do futuro governo, haja vista que essas medidas não contrariam as preferências de parte expressiva dos parlamentares. Essas ações requerem apenas empenho para formulação de políticas que se tornem, assim como no caso do Bolsa Família, iniciativas de Estado e não atuações circunscritas à uma administração específica.

Além de atender a principal meta do governo, essas medidas contribuiriam para, no médio prazo, melhorar o ambiente de negócios no país, estimular os investimentos, elevar o crescimento potencial e diminuir a inflação. Apesar de os benefícios serem evidentes e responderem à busca da redução da pobreza, temo que uma parte da lista não avance tanto quanto necessário.

Por fim, agradeço a Rita Leite pelos comentários e revisões das minhas publicações nesta coluna em 2022.

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