terça-feira, 24 de outubro de 2023

Hélio Schwartsman - Paradoxo argentino

Folha de S. Paulo

Duelo de rejeições explica em parte bom resultado de candidato governista

Como o ministro da Economia de um país com inflação de quase 150% consegue sair na frente numa disputa presidencial que foi para o segundo turno? É fácil. É só colocar Javier Milei como adversário a derrotar. Foi assim que o candidato governista Sergio Massa, contrariando o resultado das prévias (Paso) e as pesquisas, abriu uma dianteira de quase sete pontos percentuais sobre o postulante anarcocapitalista, cujo apelido, "El Loco", fala por si.

Os números das Paso, como escrevi aqui em agosto, deveriam ser vistos com um grão de sal. As exóticas prévias argentinas, um pleito antes do pleito cujo valor é principalmente indicativo, são, afinal, um convite ao voto de protesto. À medida, porém, que as eleições se presentificam e o eleitor começa a considerar suas consequências, ele fica mais cauteloso.

Acho que isso explica em parte o bom resultado de Massa, que também tem a seu favor o fato de ser visto como um peronista light, menos umbilicalmente ligado ao presidente Alberto Fernández e à vice Cristina Kirchner (embora tenha sido seu chefe de gabinete).

Daí não decorre que já possamos considerar Milei carta fora do baralho. A terceira colocada, Patricia Bullrich, obteve 24% dos votos. Ela ainda não disse se irá apoiar alguém, mas seus eleitores tendem a ser bem antiperonistas. Isso significa que Milei deverá herdar uma fatia maior de seu espólio. A pergunta é se a diferença bastará para fazê-lo superar Massa.

Não é incomum que eleições se convertam numa batalha de rejeições, em que vence aquele que desagrada menos. Os argentinos, contudo, levaram essa tendência ao paroxismo, a ponto de Massa, que é o atual maestro da crise, estar liderando a corrida. O paradoxo se dilui quando se considera que do outro lado está um candidato antissistema que não economiza em ideias sem volta, como extinguir a moeda nacional, eliminar todos os subsídios sociais e sair do Mercosul.

 

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Carácoles!