Valor Econômico
Concentração de recursos em poucos candidatos
desequilibra a disputa
Num tempo em que a comunicação e a
disseminação de informações eram precárias, acontecia de dois acadêmicos
desenvolverem teorias semelhantes na mesma época, porém de forma totalmente
independente.
O economista alemão Albert Hirschman havia
passado um período na Universidade da Califórnia e em 1945 publicou num livro
um cálculo medindo a competição nos setores de importação e exportação. De
forma paralela, na Costa Leste, o doutorando Orris Herfindahl teve uma ideia
semelhante para mensurar, em sua tese apresentada à Universidade de Columbia, o
poder de mercado de siderúrgicas.
Apesar de pequenas diferenças nas suas formulações, os dois economistas tiveram seus nomes eternizados numa das mais ferramentas mais importantes para análise de concentração de mercados. O HHI (Hirschman-Herfindahl Index) é um parâmetro até hoje utilizado pelos órgãos antitruste na verificação do potencial de danos que uma operação de fusão ou aquisição pode causar.
O uso amplo do HHI para a defesa da
concorrência deve-se à simplicidade do seu cálculo. A fórmula consiste
simplesmente em somar o quadrado das participações de mercado de cada empresa
do setor. Quanto mais próximo de 1 der o resultado, mais forte a tendência ao
monopólio.
Tome-se um exemplo hipotético em que
determinado segmento é liderado por uma companhia com 60% do mercado e outras
quatro firmas com 10% cada uma. O HHI neste caso seria 0,4 (=0,36
+0,01+0,01+0,01+0,01). Já numa outra configuração em que as empresas tivessem
fatias de 40%, 30%, 15%, 10% e 5% - ou seja, um mercado mais disputado - o HHI
seria 0,285 (=0,16 + 0,09 + 0,0225 + 0,01 + 0,0025)
Órgãos de defesa da concorrência de todo o
mundo, como o CADE no Brasil, se guiam pelo índice criado por Hirschman e
Herfindahl para avaliar fusões de empresas e condutas anticoncorrenciais.
Como regra de bolso, os mercados são
classificados como de baixa concentração (HHI inferior a 0,15), moderada (HHI
entre 0,15 e 0,25) e elevada concentração (HHI acima de 0,25).
O Congresso aprovou, e o presidente Lula
acaba de sancionar, um fundão de R$ 4,9 bilhões para as eleições municipais
neste ano. Para estimar como os partidos distribuem essa montanha de dinheiro
público, resolvi calcular o HHI nas eleições de 2022 para deputado federal.
Dá para imaginar o sistema eleitoral como uma
espécie de “mercado” em que os candidatos, antes de disputarem o voto dos
eleitores, brigam por receber uma fatia maior do fundão alocado pelo partido em
seu Estado. Segundo essa lógica, cada diretório estadual do partido pode ser
considerado um setor diferente, e o percentual recebido por cada candidato da
legenda no Estado seria como o seu “market share” no fundão.
Assim, se o HHI do partido X no Estado Y é próximo de zero significa que aquela legenda pulveriza os recursos entre as dezenas de candidatos a deputado, enquanto se o HHI for 1 indica que todo o recurso da agremiação foi aplicado numa única candidatura.
Os resultados confirmam a percepção de que os
partidos brasileiros centralizam o dinheiro do fundão nas mãos de poucos
candidatos. Na média, o HHI para o cargo de deputado federal em 2022 ficou em
0,315, o que, na análise antitruste, é considerado uma concentração elevada.
Os números também mostram que os efeitos das
cotas racial e feminina foram bastante limitados no seu propósito de
democratizar o acesso ao fundo eleitoral. Aplicando o índice de
Hirschman-Herfindahl para a distribuição do fundão segundo as cotas racial e
feminina, constatamos que os partidos afunilam o dinheiro em poucos candidatos
negros e mulheres.
O HHI médio observado na cota racial, em
2022, foi bem superior ao índice geral (0,424). O percentual de diretórios
estaduais com alta concentração de recursos em poucos candidatos foi de 65,2%.
No caso da cota feminina, a distorção é ainda superior. O HHI médio foi de
0,499, e nada menos que 79,4% dos diretórios dos partidos mostraram uma
concentração elevada.
Para se ter uma ideia, em 2022 houve 82
situações em que os partidos destinaram a totalidade dos recursos do fundão
para apenas um candidato negro de seu Estado. No caso das mulheres, foram 111
ocorrências em que os diretórios aplicaram toda a cota feminina em uma única
candidata a deputada federal.
No mercado as empresas mais capitalizadas
conseguem abocanhar para si uma maior parcela de clientes. O mesmo acontece na
política: o dinheiro do fundão desequilibra a disputa em favor dos mais
agraciados. Nas eleições de 2022, apenas 3 entre 5.544 candidatos conseguiram
se eleger gastando menos de R$ 100 mil na campanha. Já entre os 86 concorrentes
que dispuseram de mais de R$ 3 milhões para gastar, 53 saíram vitoriosos.
Assim como o CADE dispõe de instrumentos para
coibir o abuso de poder dominante por parte das grandes empresas, o TSE, como
órgão regulador do “mercado” eleitoral, precisa conter os efeitos danosos da
concentração dos recursos do fundão em poucos candidatos.
Já que reduzir o montante do fundo eleitoral
se mostra politicamente inviável, limitar o percentual dos gastos totais que
podem ser cobertos com o fundão e estabelecer valores mínimos para cada
candidato ajudariam a elevar a competição eleitoral.
*Bruno Carazza é professor associado da
Fundação Dom Cabral e autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do
sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”.
3 comentários:
Excelente! Comprova novamente a decisiva importância da GRANA nas eleições brasileiras.
■■■NÃO FOI SÓ NA DESMONTAGEM DA LAVA JATO que o PT de Lula e Dilma e o PL de Bolsonaro e do Pastor Waldemar se juntaram e agiram juntos contra o Brasil
■■O PL e o PT se juntaram, somaram suas bancadas gigantes e inviabilizaram a proposta do Partido Novo, de não dar esta montanha de dinheiro toda para os candidatos gastarem em campanha e ainda fraudarem prestação de contas e levarem para casa parte da grana.
Reultado::
■Os dois partidos políticos com mais nomes envolvidos com corrupção, o PT e o PL, vão ficar, só os dois, com 30% do bolo //~R$1,5Bilhão// do dinheiro que queríamos aplicado na saúde ou na educação para ela ter chance de deixar de ser uma das piores do mundo.
■E depois, nas regiões em que moramos, logo vemos candidatos que antes moravam em casas simples de bairros simples se mudarem para morar em imóveis caros das áreas mais nobres.
E ainda tem gente que xinga todo dia os caras da Lava Jato que desmascararam essa canalhada de políticos podres.
(Posso ter diferenças de visões de mundo com os caras da Lava Jato. Mas eles certamente são muito melhores que estes canalhas do PT e do PL.
(Claro que há exceções no PT e deve ter no PL também).
Pois é.
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