Folha de S. Paulo
Bolsonarismo está vivo, e Tarcísio replica a
política de eliminação que o ex-presidente sempre articulou
O
não comparecimento do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e dos
governadores de São Paulo, Rio de
Janeiro e Minas Gerais, entre outros, à cerimônia para relembrar
a tentativa
de golpe de 8 de janeiro, fomentada por Jair
Bolsonaro (PL)
e oficiais militares, é sinal evidente de que a ruptura institucional ainda faz
parte do horizonte político.
Lira se mantém subserviente ao bolsonarismo
que contamina as bancadas que representam
o agronegócio, as igrejas e a indústria da segurança pública.
Apesar da perda dos direitos políticos, o ex-presidente circula livremente e dissemina o veneno golpista. Em vez de ser execrada, a figura autoritária, criminosa e bisonha de Jair Bolsonaro continua sendo cortejada por forças conservadoras. Seu laboratório de políticas destrutivas está em pleno funcionamento.
Ricardo Nunes (MDB), prefeito de
São Paulo e candidato à reeleição, quer
que Bolsonaro escolha o vice de sua chapa. Aposta na polarização golpista
para conquistar eleitores.
Não por acaso, atenta à pauta bolsonarista de
costumes, a prefeitura de São Paulo suspendeu em dezembro o serviço de aborto
legal, que, em tese, deve ser oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de
Saúde. O
Judiciário reverteu a decisão, mas o agrado foi feito.
Para não melindrar parcela das Forças Armadas
que ainda sente saudades da ditadura militar, a Presidência da República vem se
omitindo e não promove a reinstalação da Comissão Especial de Mortos e
Desaparecidos Políticos, criada por lei em 1995, e arbitrariamente dissolvida
por Jair Bolsonaro no final de sua gestão.
Surgem indicadores preocupantes de que falta
empenho das Forças Armadas na repressão
ao garimpo ilegal em territórios yanomamis.
Tarcísio
de Freitas (Republicanos),
governador de São Paulo e um dos apoiadores silenciosos da tentativa de golpe,
aposta na letalidade policial para formular o discurso da luta contra o crime.
Ao dizer que não vai investir em câmeras
corporais nas fardas de PMs porque elas "não protegem
cidadãos", Tarcísio mente e replica a política de eliminação de suspeitos
que Bolsonaro sempre articulou.
A promessa de Tarcísio foi proferida dias
depois de o Ministério
Público oferecer denúncia criminal, por homicídio qualificado,
contra dois
PMs que participaram da chamada Operação Escudo –chacina concebida
pelo governo estadual para vingar a morte de policial em Guarujá. Os PMs
são acusados de obstruir câmeras corporais e adulterar a cena do crime.
Além de fortalecer mecanismos de controle e
melhorar a produtividade da corporação, o uso de câmeras pela PM protege, sim,
o cidadão (suspeito ou não suspeito) da ação de policiais assassinos e
arbitrários, que recebem de Tarcísio e de outros governadores licença oficiosa
para matar.
Os batalhões que incorporaram o uso das
câmeras corporais tiveram redução
de 76,2% na letalidade dos policiais militares entre 2019 e 2022.
O número
de adolescentes mortos caiu 66,7%, informa o Fórum Brasileiro de Segurança
Pública.
Nos próximos meses, Tarcísio, que costuma
hospedar o ex-presidente golpista em áreas íntimas do Palácio dos Bandeirantes,
escolherá para a chefia do Ministério Público de São Paulo um promotor
bolsonarista. A máquina mortífera da polícia paulista estará ainda mais
azeitada.
A democracia fraqueja porque, em relação às
principais lideranças do movimento que pretendia reverter a vitória eleitoral
de Lula, a
impunidade persiste.
*Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"
Um comentário:
Excelente! Especialmente verdadeiro o seu último parágrafo! Apenas 1 ano depois do 8/1, o primeiro deputado federal foi alvo de busca e apreensão dentro da investigação... Teve 365 dias pra esconder e/ou apagar todas as provas ou evidências que o incriminassem!
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