sexta-feira, 17 de maio de 2024

Celso Ming - A competição entre protecionismos

O Estado de S. Paulo

O mundo está ficando fortemente protecionista e cria um novo problema de política econômica para o Brasil. O produto brasileiro já não vai competir apenas com um produto produzido por economias liberais. O protecionismo brasileiro terá agora de competir também com o protecionismo dos outros.

Nesta segunda-feira, o presidente Biden, dos Estados Unidos, sobretaxou em 100% os carros elétricos da China. Não ficou só nisso. Aumentou substancialmente as tarifas de importação de semicondutores, baterias elétricas, painéis solares e minerais estratégicos.

O alvo geral não é apenas o produto chinês. A última edição da revista The Economist publicou matéria de capa sobre o “desmoronamento da ordem global liberal”, editada também no portal do Estadão. Lá foi relatada a escalada da guerra de subsídios entre países; a fragmentação dos fluxos globais de capital; a perda de relevância das instituições de salvaguarda do sistema liberal, como a Organização Mundial do Comércio, o Fundo Monetário Internacional e o Conselho de Segurança da ONU. Até mesmo as decisões da Corte Internacional de Justiça, de Haia, não vêm sendo respeitadas.

Esse movimento de retranca tem a ver com muita coisa. Tem a ver, por exemplo, com a perda de hegemonia relativa da principal potência até aqui, os Estados Unidos. Também com a ascensão da China como grande potência econômica e política; e poderá ter muito a ver com a necessidade de uma rápida transição energética, dos combustíveis fósseis para os combustíveis limpos.

Até agora, a ordem econômica liberal construída ao longo do século 20 coincidiu com o interesse maior, de expansão da economia dos Estados Unidos ao redor do mundo. Mas há anos a indústria norte-americana não consegue mais competir com mercadorias de procedência asiática produzidas com mão de obra muito mais barata. Muitas indústrias do Ocidente migraram para a Ásia para achatar custos, com impacto sobre o PIB dos seus países. Agora, a China vem desenvolvendo novas tecnologias, mais baratas e mais eficientes.

O Brasil também vem sentindo o baque da entrada de produtos asiáticos. A indústria de transformação, historicamente tão protegida, continua desmilinguindo inexoravelmente e segue pedindo mais proteção.

Há muita coisa nova a desenvolver no Brasil, especialmente a partir das novas bases da transição energética. No entanto, o governo Lula não consegue fazer outra coisa senão seguir o figurino antigo, que já deu o que tinha de dar e que, a partir dos anos 1990, começou a dar errado. Distribui subsídios, desonerações, reservas de mercado, um perdão fiscal emendado no outro (Refis) e obriga a Petrobras a despejar dinheiro na falida indústria naval, em refinarias e em centrais petroquímicas.

Pior, até agora nem sequer entendeu que não tem condições mínimas de montar protecionismo capaz de competir com o protecionismo dos outros.

 

Um comentário:

Daniel disse...

E onde fica o livre comércio tão vantajoso? E a fantástica e supostamente inevitável globalização?