quarta-feira, 21 de agosto de 2024

Fernando Exman - Efeitos da repactuação das emendas parlamentares

Valor Econômico

Espera-se que o acordo também possa alterar a dinâmica das articulações para a sucessão no Senado

Há nos bastidores do governo a expectativa de que o entendimento sobre as emendas parlamentares ao Orçamento também possa alterar a dinâmica das articulações para a sucessão no Senado. Um efeito colateral, espera-se, é a redução da força gravitacional que existe em torno do senador Davi Alcolumbre (União-AP), referência na gestão desses recursos na Casa.

Outros impactos institucionais e econômicos podem ser identificados com mais facilidade. A repactuação promovida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, fortaleceu o Executivo e reposicionou o Judiciário, em um jogo que tem como objetivo buscar o equilíbrio entre os Poderes. Ela colocou no centro do tabuleiro a Corte, que estrategicamente demonstrou coesão: todos os seus 11 magistrados participaram da reunião realizada no gabinete de Barroso com a presença de dois ministros enviados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os presidentes da Câmara e do Senado.

O acordo também altera a lógica na gestão dos recursos públicos, a poucos dias de acabar o prazo para o governo enviar ao Congresso a proposta de Orçamento para o ano que vem.

A intenção do governo é transformar 2025 em um ano marcado pelo avanço do Novo Programa de Aceleração do Crescimento, que foi lançado há um ano e ainda está sem um balanço público de suas realizações. Recuperando o conceito ideal das emendas de bancada e de comissão, ou seja, transformando-as em um mecanismo para canalizar verbas para projetos estruturantes de forma impessoal, de fato o Novo PAC pode ganhar um impulso.

É muito dinheiro. Uma das contas que circulou no Supremo antes de os ministros proferirem a decisão que enfureceu o Congresso se refere ao Orçamento de 2024, ao qual foram apresentadas 7.934 emendas - 6.207 de deputados, 1.053 de senadores, 419 de bancada estadual e 255 de comissão. Ao todo, elas somam R$ 53 bilhões. Segundo técnicos em contas públicas, o montante representa cerca de 25% das despesas primárias discricionárias e 33% dos investimentos das empresas estatais.

“Não tem lógica ter mais de R$ 50 bilhões nas mãos do Congresso. Qual é a política pública que se institucionaliza no Brasil? Nenhuma. Qual é o lugar do mundo que o Congresso tem isso? Não existe”, exaspera-se um auxiliar do presidente Lula.

Mas ainda há, em paralelo, um cálculo político. Acredita-se que a reunião entre as cúpulas dos Poderes também acabe por gerar uma reacomodação das forças no Senado.

Presidente da poderosa Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e cotado para retornar ao comando do Senado a partir de fevereiro do ano que vem, Alcolumbre já travou uma batalha silenciosa com o Executivo sobre a transparência dos senadores contemplados pela liberação de recursos de emendas. Na percepção de articuladores políticos do governo, em vez de viabilizar a consolidação de uma base aliada, a atuação de Alcolumbre visava mais seu próprio projeto político.

Procurado, Alcolumbre não comenta este assunto. Nem outros temas que estão sob sua esfera de influência e preocupam o governo.

Um é a tramitação da proposta de emenda constitucional que dá autonomia financeira ao Banco Central (BC). Em vez dessa PEC, a equipe econômica preferia ver avançar um projeto para introduzir no Brasil o chamado modelo “twin peaks”, levando o BC e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) a virarem “superórgãos” reguladores. A pauta pressiona o Executivo, mesmo diante da iminente mudança no comando da autoridade monetária.

O preenchimento de vagas em agências reguladoras também está na lista de aflições do Planalto e ministros setoriais. O governo considera que o senador quer fazer muitas indicações para essas estratégicas instituições e, teme-se, as demandas só tendem a crescer com seu eventual retorno à presidência do Parlamento.

É nesse contexto que existe a esperança, entre autoridades do governo, de uma possível mudança na dinâmica proporcionada pela permanente e intensa perspectiva de poder emanada por Alcolumbre. Um cenário é o surgimento de candidaturas alternativas à presidência do Senado ou, pelo menos, que emissários do Planalto possam sentar-se com o senador do Amapá para uma conversa em novos termos.

Em junho, por exemplo, o senador Otto Alencar (BA), líder do PSD, partido com a maior bancada, afirmou aos repórteres Julia Lindner e Caetano Tonet que no tempo certo pretendia reunir a legenda e ouvir o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) sobre a disputa da Mesa Diretora. “Em qualquer Casa Legislativa, o comandante da sucessão é o próprio presidente, conversando com diversos partidos. Eu ainda não ouvi do presidente Pacheco a preferência pelo nome do Davi, do meu ou de um outro senador”, ponderou o baiano.

Aliado do governo, ele também sinalizou à oposição nessa entrevista ao Valor. Disse que uma eventual candidatura asseguraria a ela participação na Mesa Diretora. E afirmou não existir, naquele momento, a menor possibilidade de o Senado fazer impeachment de ministro do Supremo. Na sua visão, o que se via era apenas integrantes do STF tomando decisões que de alguma forma se chocavam com interesses políticos.

Otto Alencar também argumentou que a sucessão somente deveria ser tratada depois das eleições municipais. O momento está se aproximando.

 

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