domingo, 11 de agosto de 2024

Lourival Sant’Anna - O namoro de Lula com o autoritarismo

O Estado de S. Paulo

Lula fecha os olhos para a opressão e continua apegado aos populistas de esquerda

A crise entre Brasil e Nicarágua revelou o tamanho da resistência do presidente Lula em se distanciar dos regimes ditatoriais de esquerda que ele apoia há duas décadas. Só um pedido irrecusável, do papa Francisco, pôde mover a balança do governo em favor da democracia, em detrimento das afinidades ideológicas. Ainda assim, com muita hesitação.

O embaixador do Brasil em Manágua, Breno Costa, não compareceu à comemoração, no dia 19 de julho, do 45.º aniversário da Revolução Sandinista, liderada pelo ditador Daniel Ortega. Foi avisado de que seria expulso. Em vez de vir logo embora, como faria o funcionário de uma diplomacia “ativa e altiva”, esperou duas semanas, até a expulsão ser consumada.

Só então, a contragosto, Lula se viu forçado a expulsar a embaixadora nicaraguense, Fulvia Castro, que logicamente já havia voltado para Manágua. Para deixar claro que o Brasil não se opõe ao regime, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, explicou que a expulsão seguiu o princípio da reciprocidade.

Ou seja: ditadores, não se preocupem com o Brasil. O governo se acostumou a ser humilhado por países pequenos, que não reconhecem sua liderança. Uruguai e Chile, por exemplo, governados respectivamente por presidentes de direita e de esquerda, denunciaram a fraude na eleição venezuelana, enquanto Lula busca uma saída honrosa para Nicolás Maduro.

A ausência do embaixador brasileiro decorreu de decisão do governo de esfriar as relações com o regime sandinista. Isso, depois que o papa Francisco pediu a Lula, em junho do ano passado, que convencesse Ortega a libertar o bispo Rolando Álvarez. Preso desde 2022, ele havia se recusado a embarcar para os EUA com outros 222 presos políticos.

DESAFIO. Confinado numa solitária sem ventilação, apelidada de “Inferninho”, na penitenciária de segurança máxima La Modelo, Álvarez foi condenado a 26 anos de prisão por “desprezo às instituições e espalhar notícias falsas”. O Vaticano fez gestões para que o bispo, junto com outros 18 religiosos, fossem desterrados para Roma, o que acabou acontecendo em janeiro.

A Igreja Católica nicara-guense está engajada na luta pelos direitos humanos. Mas a conduta do regime expôs as contradições de Lula. Católico, ele surgiu como líder sindical na luta contra a ditadura militar, na qual a Igreja teve papel fundamental.

Hoje, Lula fecha os olhos para a opressão. Ele continua apegado aos populistas de esquerda, que chegaram ao poder pela via democrática e capturaram o Estado para se perpetuarem no poder, com apoio do presidente brasileiro. Agora, ele é obrigado a escolher entre seus compromissos históricos com o populismo autoritário ou com a democracia.

 

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