Folha de S. Paulo
Melhor é que se esqueça do BC, que venha
calmaria e que a Selic fique onde está, por ora
Luiz Inácio
Lula da Silva enfim indicou Gabriel
Galípolo para presidir o Banco Central.
O que de melhor pode acontecer a Galípolo? Que se esqueçam dele, pelo menos no
que diz respeito a taxas de juros.
Infelizmente, tão cedo não vão esquecer
Galípolo. Assim sendo, será melhor que fale muito pouco. Ao falar, que seja
contido e tedioso. Difícil também. O novo presidente do BC terá de
demonstrar "credibilidade". De resto, nos acostumamos à
falação exagerada dos encarregados da política monetária —e sobre eles.
Em particular em países periféricos, como o Brasil, instáveis na economia e na política, com o problema fiscal sabido, a direção do BC está quase sempre vendida, arrastada por correntes econômicas e financeiras. Mais importante é evitar besteiras, excessos maiores nos juros. O que são essas correntes?
Taxas de juros e mudanças maiores de ritmo da
economia americana. Preço de commodities. O preço do dólar, que depende também
dos primeiros dois fatores. O ritmo do
crescimento da dívida do governo brasileiro.
Quando há turbulência nessas correntes,
espera-se que a direção do BC diga alguma coisa, dê alguma direção. O mundo do
dinheiro espera que qualquer chefe de BC insinue algo sobre o que fazer a
respeito. No caso de Galípolo,
nomeado por um governo petista, que alardeava esperar outra
"filosofia" no BC, questões e testes serão imediatos e intensos. Como
diz o clichê, se espera que Galípolo seja "duro", implacável com o
risco de inflação.
Com alguma sorte e sensatez, espera-se que o
trabalho de "manter a fama de mau" do BC seja feito na transição
de Roberto
Campos Neto para Galípolo. A rigor, porém, não há motivo
decisivo para alta da Selic,
embora a taxa de juro real na praça esteja perto de 7,5% ao ano e se espere
Selic perto de 11,5% (até março, a taxa real esteve entre 5,8% e 6%).
É muito
provável que a taxa básica de juros dos Estados Unidos comece a baixar em
setembro; que a economia americana desacelere sem se estatelar
(crise americana provoca aversão a risco, fuga de capital e alta do dólar).
Essa perspectiva e alguma sensatez fiscal no Brasil podem contribuir para a
valorização do real, outra ajuda para inflação e juros aqui.
Há uma discussão sobre o efeito do
mercado de trabalho aquecido na inflação, mas está difícil ter juízo
mais preciso. O "impulso fiscal" (gasto extra do governo), embora
relevante, será menor em 2025. De resto, na própria projeção do BC a inflação
no primeiro trimestre de 2026 baixaria a 3,2% caso a Selic ficasse em 10,5% a
perder de vista. Como diz o jargão, a Selic está em "terreno
contracionista": em tese, segurando o ritmo do PIB. Algum sangue-frio e
linguagem "dura" poderiam evitar, por ora, nova alta
da Selic —infelizmente,
"o mercado" está ouriçado, e a próxima reunião do BC é daqui a apenas
20 dias.
Ainda assim, na perspectiva otimista de
calmaria na finança dos EUA e de contenção fiscal mínima no Brasil, é possível
baixar o preço do pedágio que os donos do dinheiro vão cobrar de Galípolo.
Nesse mundo mais róseo, restaria ao presidente do BC administrar uma calmaria e
tirar o BC do centro da confusão, a partir do fim deste ano e durante 2025. Se
o governo também ajudar.
Claro que há gente no governo e no PT que
espera reviravolta. Não pode haver: pelas próprias normas definidas por este
governo, o regime é de metas de inflação, com o objetivo de
3% pelos próximos três anos. Há até quem espere do BC mudança que
eleve o ritmo do PIB, reindustrialização (sic), fim do rentismo, rios de leite
e mel etc. É maluquice.
Por ora, quanto à política monetária (o BC
tem outras funções importantes), o que interessa é fazer o BC sair da confusão
entre o governo e "o mercado". Que o esqueçam.
Um comentário:
Sei.
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