SOCIÓLOGO VÊ EXAGERO POR PARTE DE PROMOTORES E CRITICA MST
Entrevista: Zander Navarro, Sociólogo
O cientista social Zander Navarro, do Departamento de Sociologia da UFRGS, é um dos maiores especialistas brasileiros em Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).Primeiro, por simpatia com a causa da reforma agrária. Como ele mesmo admite, durante toda a década de 80 e parte da de 90 colaborou como pôde com o MST.
De admirador, Zander se tornou crítico da organização. Diz que a direção do movimento se considera uma "vanguarda iluminada" e que manipula a maioria.O sociólogo, por outro lado, também se mostra contrário à proposta de alguns promotores públicos de colocar o MST na ilegalidade.
Veja por que nesta entrevista concedida por e-mail a ZH:
Zero Hora - O senhor criticou atos recentes do Ministério Público (MP), que incluem remoção de acampamentos do MST e até proposta de colocar o movimento na ilegalidade. Nas ações, são citadas inclusive críticas feitas pelo senhor à cúpula dos sem-terra. Por que o senhor está agora contra os promotores?
Zander Navarro - Houve equívocos e um imenso exagero do MP, fundado em leitura alarmista, que não deriva de nada que eu tenha escrito. Não existe ação de guerrilha, muito menos uma estratégia revolucionária por parte do MST. E a Via Campesina, de fato, é uma inconseqüente articulação comandada pelo MST. Se alguns de seus líderes mais doutrinários falam em socialismo, é por burrice política, porque a sua base social não tem a menor idéia sobre o que seria esse prometido paraíso social.
ZH - Na ação que resultou no desalojamento dos sem-terra na área contígua à Fazenda Coqueiros, promotores mencionam que o MST é organização de cunho leninista, por aplicar tática de agir alternadamente "na clandestinidade e na legalidade". O senhor também diz que o MST tem uma estrutura "de anacrônica feição leninista". Não lhe parece que os pontos de vista seu e do MP coincidem?
Zander - O leninismo é um fato histórico e, também, uma metodologia política. A principal característica deletéria do leninismo é a absurda noção de uma "vanguarda iluminada", na realidade apenas significando que um pequeno grupo manipula a maioria. É a ante-sala de práticas não-democráticas, o que é a face principal da estruturação do MST. Por outro lado, o MST não é revolucionário e nunca o será. Para isso precisa de quadros, que não tem, e de um ambiente político que lhe favoreça. As instituições democráticas se consolidaram, e os agricultores sonham em se integrar aos mercados e crescer economicamente.
ZH - De tudo que o senhor conhece do MST, os assentados têm liberdade de escolher seus líderes?
Zander - Nos assentamentos que conheço, especialmente no Sul, onde é forte a presença do MST, evidentemente que não. Os líderes são escolhidos por sua lealdade ao movimento, não por sua capacidade e por escolha livre dos assentados.
ZH - É possível fazer pressão sem invadir terras? Qual seria a alternativa?
Zander - O MST mudou a correlação de forças política em muitas regiões rurais, o que representa sua maior vitória. Praticamente não existe mais imóvel que seja inteiramente protegido de sua ação, bastando que se ocupe a propriedade inúmeras vezes, até que o proprietário "jogue a toalha". O erro do MST foi não se institucionalizar quando estava no auge, no final da década passada, e se transformar na maior organização dos pobres do campo. Usaria outras formas de pressão, sem abandonar as ocupações de propriedade, sua arma principal. As ocupações estão para o MST como as greves para os sindicatos. Mas manter-se como organização semiclandestina é um delírio completo.
ZH - O senhor é filiado a partido? Foi ligado ao MST?
Zander - Servidores públicos servem a todos e deveriam ser proibidos de filiação partidária. É uma posição sonhadora, mas acredito que deveria ser assim, por isso nunca fui filiado. Quanto ao MST, durante toda a década de 80 e parte dos anos 90 colaborei como pude, inclusive com parte do meu salário, e também ocupando terras, quando foi possível. Nunca fui, contudo, um "intelectual orgânico", mas apenas um forte simpatizante, pois julgava essencial a reforma agrária naqueles anos, o que deixou de ser verdade nos anos mais recentes. Os principais problemas sociais do país atualmente são totalmente distintos.
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