sexta-feira, 1 de agosto de 2008

DEU NO VALOR ECONÔMICO


ELEIÇÃO SE DEFINE LOGO NA PARTIDA
Alberto Carlos Almeida


O segundo turno é uma nova eleição? Não. Entre 1990 e 2006, ocorreram 69 segundos turnos nas eleições para governos estaduais. Em 71% das vezes, o candidato que chegou na frente no primeiro turno acabou vencendo a eleição no segundo. Em 29% das eleições, houve virada, com o segundo colocado no turno anterior passando a vencedor. Nas eleições com virada, a distância entre o primeiro e o segundo colocados no primeiro turno foi menor do que nas eleições sem virada. Nas 20 eleições nas quais o segundo colocado da primeira rodada venceu na segunda rodada, a distância média em votos válidos foi de 7,15%. Nas eleições sem virada, a distância média foi de quase 10 p.p. - exatos 9,67% dos votos válidos.

A eleição de 2008 não é para governador, é para prefeito. Aquela tendência se verifica? Quando se consideram as eleições de prefeito que foram para o segundo turno, em cidades que não são capitais, a virada é tão rara quanto para as eleições de governador: 29%.

Nas eleições para prefeitos de capitais, a dificuldade de virar de um turno para outro é muito maior. Em três eleições, entre 1996 e 2004, nada menos do que 40 eleições para prefeitos de capitais foram para o segundo turno. Destas, em 88% dos casos, ou 35 eleições, não houve virada. Somente em cinco eleições - ou 12% do total - o vencedor do primeiro turno perdeu no segundo. Foram elas: Campo Grande, em 1996; Recife e Rio de Janeiro, em 2000; Fortaleza e Porto Alegre, em 2004. Nas três primeiras, Campo Grande, Recife e Rio, a distância final entre vencedor e derrotado foi mínima - menos de 1% dos votos válidos. Aqueles que viraram ficaram a uma distância média menor do primeiro colocado no primeiro turno do que aqueles que não viraram: 9,38% e 11,15% dos votos válidos, respectivamente.

Alguns fatos chamam a atenção nesses dados:

1 - Não há duas eleições completamente diferentes, mas apenas uma eleição que é disputada em duas rodadas.

2 - Quando a eleição é em dois turnos, é preciso se empenhar muito para chegar na frente já no primeiro turno. Isso aumenta sobremaneira as chances de vitória no segundo turno.

3 - Quanto maior a vantagem que o candidato que vence o primeiro turno abre sobre o segundo colocado, maiores as chances de que vença a eleição também no segundo turno.

Resumindo: a probabilidade de vitória será maior para quem chegar na frente já no primeiro turno, e com uma vantagem grande.

Esse resultado sintetiza o que aconteceu em 172 eleições ocorridas no Brasil entre 1990 e 2006. Trata-se, portanto, de um resultado que não deixa dúvidas quando analisado sob quaisquer pontos de vista, inclusive o estatístico.

O que mais importa, assim, é compreender as razões desse fato.

A primeira coisa que chama a atenção é a maior dificuldade de virar o resultado eleitoral nas cidades que são capitais, comparando-as com os estados e com as demais cidades grandes que não são capitais. O que provavelmente acontece é que o eleitor de capital é submetido a uma maior quantidade de informação. Isso faz com que ele decida mais rapidamente em quem votar. Isto é, ele não precisa de mais 20 dias de campanha, ou algo assim, para mudar de voto. Sabe-se que a escolaridade média nas capitais é mais elevada do que nos estados, mas isso não é verdade quando essas cidades são comparadas a cidades como Campinas ou São José dos Campos. Também há, contudo, muitas cidades grandes com perfil bastante diferente dessas duas. Isso se verifica nas grandes cidades- dormitório das regiões metropolitanas, com destaque para Rio e São Paulo.

Ainda assim, o argumento permanece válido. Nas capitais de estado há mais informação. Há maior circulação de jornais, mais interesses organizados etc. Isso intensifica o debate e permite que o eleitor adeqüe de forma mais veloz o voto às preferências mais fortemente estabelecidas e que não variam muito no decorrer da campanha eleitoral - por exemplo, a avaliação do governo ou a lembrança ("recall") dos candidatos. É nas capitais que os candidatos precisam se esforçar mais para saírem vencedores já no primeiro turno. Isso não significa que o eleitor de capital de estado seja mais "cabeça feita" do que os demais eleitores, mas sim, apenas, que ele é mais exposto ao bombardeio de informação. Quando a eleição vai para o segundo turno, ele tem menos razão para mudar de voto ou abandonar aquele que considerava ser a sua segunda escolha caso seu candidato não passasse para a segunda rodada.

São raros os casos de virada de candidatos que vão para o segundo turno com rejeição muito elevada. Ou seja, a vitória de Mário Covas sobre Paulo Maluf em 1998 é um ponto fora da curva quando se considera a lógica de uma virada eleitoral. O que faz que ocorra uma virada, na maioria dos casos, é a maior quantidade de informação que chega ao eleitor quando somados o primeiro e o segundo turnos. Naquela eleição, o que permitiu a virada tucana foi a rejeição de Maluf. O ex-prefeito de São Paulo aumentou pouco sua fatia de votos entre um turno e outro, passando de 32,2 para 44,6% dos votos válidos. A margem de vitória de Mário Covas foi, portanto, mais folgada do que são as vitórias quando a eleição é vencida de virada.

Seja qual for a eleição, de prefeito de capital ou de cidades que não são capitais, falar de segundo turno é o mesmo que falar de primeiro turno. O candidato que desejar minimizar os riscos de perder terá que fazer de tudo para ser o vitorioso já no primeiro turno, preferencialmente com uma margem folgada face ao segundo colocado. Assim, a análise das eleições passadas no Brasil sugere uma recomendação baseada nos fatos: concentre todos os seus investimentos, os melhores e mais vultosos, já no primeiro turno. Tal como acontece no futebol, virar o placar é algo difícil, bem mais improvável do que simplesmente manter-se na frente.

Abertas as urnas e contados os votos do primeiro turno, caso sua candidatura fique em segundo lugar, prepare-se para viver fortes emoções caso você vire a disputa. Não será uma vitória folgada. No caso de prefeito de capital, das cinco eleições nas quais houve virada, em três a margem do vitorioso ficou abaixo de 1% dos votos válidos. Isso ocorre também nas cidades que não são capitais e nos governos estaduais. É preciso, portanto, ter sangue frio para vencer de virada. E, depois, sangue frio e paciência para acompanhar a apuração dos votos.

Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" (Record).

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