sábado, 8 de novembro de 2008

A sucessão e, ainda, a Frente Democrática


Vagner Gomes de Souza[1]

Givaldo Siqueira está de parabéns pelo seu artigo “O PPS E A SUCESSÃO” pois um ator político não deve ficar aguardando os fatos. Ao contrário, um partido político democrático da esquerda sempre deve pleitear dirigir os elementos de fortuna da conjuntura. Entretanto, seu ponto de vista poderia ser complementado com algumas considerações sobre a conjuntura nacional. Assim, sugerimos que uma atuação política no pleito de 2010 deve partir de uma reafirmação da política partidária em relação ao Governo Federal.

Vamos completar 20 anos de hegemonia economicista na gestão pública brasileira. O Governo Collor inaugurou esse mundo pragmático pela via radical do neoliberalismo, o que afastou as forças políticas da tradição republicana. Entretanto, a luta política democrática foi colocada em segundo plano pela ideologia do “choque de capitalismo” divulgada pela candidatura do PSDB em 1989.

A transição do Governo Itamar foi uma oportunidade perdida diante da hiperinflação que abriu caminho ao Plano Real. Não percebíamos o quanto a sociedade havia transformado nos anos 80 com a emergência de uma classe média urbana sem valores cívicos. Essa foi a base da opinião pública que se calou diante das privatizações das empresas estatais (particularmente a telefonia) e se afastou da atuação em esferas públicas (associativismo de bairros, sindicatos, partidos políticos, etc.). Não fizemos um programa para essa nova classe média que entendeu a política cada vez mais de forma americanizada. Assim, a instituição da reeleição fortaleceu uma tendência ao bipartidarismo na competição da Presidência da República entre as duas vertentes dessa nova classe média liberal e utilitarista (PT e PSDB).

Não há grandes mudanças na correlação das classes sociais no intervalo de 1994 (primeira eleição de FHC) e 2006 (segunda eleição de Lula). Enfim, as mudanças ocorreram para se conservar a lógica do economicismo em que o desenvolvimentismo, aos poucos, foi reinventado a serviço dos interesses da burguesia financeira cada vez mais internacionalizada após o PROER. A falta de mudanças estaria associada a uma incapacidade na atuação no interior do processo transformista de nossa sociedade, o que foi resultado de uma postura sempre eleitoreira dos diversos partidos políticos do campo democrático e progressista.

Esse segundo Governo Lula aprendeu, com a crise política do “mensalão”, a ampliar seu campo de aliança política e social com grande capacidade de cooptação de lideranças políticas e intelectuais em torno do desenvolvimentismo economicista. Nesse caso, não é estranho as tendências pró-Lula no PSDB (vide o caso de Belo Horizonte) e no PPS (segundo indicações do artigo de Givaldo Siqueira), pois desenvolvimentismo e eleitoralismo é o casamento do conformismo no capitalismo brasileiro. Não há espaço para a “grande política” diante da ausência de uma política que aprofunde contradições na base social do atual governo. Entretanto, a chamada oposição (PSDB/DEM/PPS) segue o legado da liberdade dos modernos, ou seja, não formulou uma política pública que interpele a nova classe média dos anos pós-transição democrática e os “emergentes sociais” do governo Lula (conhecidos como “lulistas”, pois discordo com a simplificação “protofascista”).

Há elementos de um “fascismo de mercado” que o simples compromisso com o desenvolvimentismo não implicará na abertura das mudanças na rota política brasileira. Portanto, não apoiamos uma adesão a oposição de centro liberal (PSDB/DEM) pelas velhas linhas da estratégia democrática e nacional, pois isso seria um adesismo semelhante ao reingresso a base governista ou ao apoio da alternativa mineira. Por outro lado, não há elementos favoráveis a uma candidatura própria de opinião ou no campo oposicionista da velha esquerda (PSOL/PSTU/PCB/PCO).

Consideramos que a sociedade necessita de um processo de reformismo democrático que ainda não recebeu atenção da nova classe média. Essa nova classe social encontra-se eleitoralmente polarizada entre governismo e oposicionismo, mas verificamos que sua força majoritária está à margem da disputa eleitoral tendendo para valores conservadores caso não seja interpelada politicamente. A estratégia passa pela transformação democrática com o aprofundamento dos princípios estabelecidos na Constituição de 1988.

Devemos formular uma constituinte de uma nova força política que seja tenha uma dinâmica eleitoral e que reforce o associativismo da sociedade civil nas camadas médias e nas periferias do capitalismo. Uma política de transformação social com política, cultura e juventude o que está para além de uma simples posição por uma candidatura presidencial em 2010. Hoje, é necessária a fundação do PCB (“partido da constituição brasileira”), portanto a Frente Democrática ainda é a melhor alternativa para fazer chegar a nossa formulação política até as forças políticas em disputa.

Nesse sentido, justificaríamos nossa aproximação com as forças políticas do “centro político liberal” pela política do reformismo democrático que compreenda o novo papel do judiciário brasileiro em mobilizar os interesses dessa nova classe média e dos “emergentes sociais” que vivem à margem do associativismo. O aprofundamento da democracia passa por um Judiciário forte e que adquira canais fortes de participação da sociedade – isso não implica no controle externo do judiciário. Na verdade, há uma possibilidade de americanizarmos esse judiciário com instrumentos até eleitorais (vide o exemplo do Juiz de Paz eleito citado na Carta de 1988 e ainda não regulamentado).

Além disso, o modelo legislativo brasileiro merece ser mais democratizado por uma Reforma Política e Eleitoral que deve contar com um programa mínimo que inove com as chamadas “candidaturas independentes” nas listas partidárias. Por isso, há espaço para diversas candidaturas de opinião nas eleições parlamentares de 2010 que force uma “guinada” do desenvolvimentismo para o democratismo econômico e social. 2010 deve ser o início do ciclo do “Choque de Democracia” e, ainda, com a Frente Democrática.

[1] Mestre em Sociologia

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei, Vagner.
Gosto do ponto que vc ressalta esse afastamento da esfera pública como os associativismo de bairro,etc. Mas, me questiono se isso realmente um dia ocorreu no Brasil...não acho essas práticas ditas como "cidadãs" já estiveram presentes de forma eficaz na agenda cotidiana do cidadão médio brasileiro....não?
Bjs
Sara Ester