Lícia Peres
DEU NO ZERO HORA
“Para que não se esqueça.
Para que nunca mais aconteça.”
DEU NO ZERO HORA
“Para que não se esqueça.
Para que nunca mais aconteça.”
Após 40 anos da edição do AI-5, um dos símbolos mais perversos da ditadura militar, que autorizou o fechamento do Congresso, a suspensão do direito de cidadania, a cassação dos mandatos, a demissão e aposentadoria de funcionários, a instituição da censura prévia, que atingiu a imprensa, o cinema, o teatro, a música, instalando um ambiente de perseguição e medo que marcou esse tempo como dos mais atrozes da nossa história, constata-se que 82% dos brasileiros a partir dos 16 anos o ignoram. Ao admitirem o fato de nunca terem ouvido falar do Ato Institucional nº 5, evidenciam as falhas do sistema educacional brasileiro. A pesquisa publicada na Folha de S. Paulo do dia 13/12 demonstra algo que, mais do que deprimente, é trágico e carrega ainda uma certa ironia: a despolitização do nosso povo. E então nos vem à lembrança um dos slogans do autoritarismo repetido incessantemente para justificar a intervenção nos sindicatos e entidades estudantis, as prisões e torturas: Estudante é para estudar, trabalhador é para trabalhar. Assim, o fazer ou participar de atividade política era constantemente desestimulado. Tratava-se de algo indesejável e passível de punição. A meta era objetivamente a despolitização, principalmente dos jovens que sequer tinham acesso aos livros indispensáveis à sua formação acadêmica, muitas vezes obtidos clandestinamente. Tristes tempos.
Convicta da necessidade de divulgar informações sobre esse período, a Comissão do Acervo da Luta Contra a Ditadura, instituída pelo governador Olívio Dutra nas comemorações dos 20 anos da anistia, trabalhou durante vários anos, organizando dados, promovendo exposições, palestras e cursos em Porto Alegre e no Interior. Recentemente nos afastamos, ao constatar a inexistência de apoio para a continuidade da nossa atuação. Mas, buscando contribuir para a constituição de uma democracia consolidada, na qual o respeito aos direitos humanos passasse a representar valor irrenunciável, entreguei em 15 de agosto de 2008 carta ao ministro da Justiça, Tarso Genro, que expressava também o entendimento do ex-presidente da Comissão Bona Garcia e do professor de História Enrique Padrós, sobre medidas que poderiam ser adotadas pelo governo federal:
1 – Direito à verdade
A total abertura dos Arquivos de Segurança Nacional, assegurando o direito à verdade com o acesso da sociedade a todas as informações.
2 – A consolidação de uma cultura democrática e de respeito aos direitos humanos
a) Ação conjunta dos ministérios da Justiça, da Educação e da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, para que na rede pública de ensino fossem recomendados livros sobre o golpe de 64, que, mesmo parte da História do Brasil, são pouco divulgados. Grande parte da juventude desconhece os fatos. Assim, as novas gerações tomariam conhecimento das causas e conseqüências do período ditatorial na sociedade brasileira.
b) Elaboração de material específico para qualificação do magistério, de modo a capacitá-lo a um adequado tratamento do tema.
Exemplos: guias e cartilhas específicas sobre fontes de informação (filmes, depoimentos, livros, peças teatrais e as leis repressivas da época).
A gravidade dos dados publicados na referida pesquisa escancara a necessidade inadiável de enfrentar-se o desafio do desconhecimento histórico para que a realização do processo democrático não seja obstaculizada por uma educação insuficiente e pelo descompromisso com a memória.
*Socióloga, ex-presidente do Movimento Feminino pela Anistia
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