Luiz Carlos Mendonça de Barros
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
De todas as iniciativas, a que vai tratar da questão dos mutuários de hipotecas é a que terá efeitos mais claros
O GOVERNO Barack Obama ganhou três instrumentos para enfrentar a crise que atinge os Estados Unidos. O primeiro é o pacote de estímulo fiscal arrancado a fórceps dos senadores republicanos. Outro veio com a definição das regras da segunda fase do Tarp, programa herdado do governo George W. Bush para retirar os ativos tóxicos dos bancos e estabilizar o sistema financeiro. Finalmente, o governo vai usar quase US$ 300 bilhões para tentar estancar o processo de retomada de residências financiadas por hipotecas, os chamados "foreclosures".
De todas essas iniciativas, a que vai tratar da questão dos mutuários de hipotecas é fundamental. Os "foreclosures" são um elemento importante no desequilíbrio atual do mercado imobiliário americano. Em um ambiente fragilizado pela redução da oferta de crédito, a tentativa dos bancos de revender as casas tomadas de seus mutuários provoca uma espiral deflacionária nos preços. Em uma segunda etapa, essa queda dos preços dos imóveis acaba por forçar mais inadimplência por parte dos mutuários porque o valor da dívida supera seu valor de mercado, enfraquecendo ainda mais os bancos já carregados desses créditos.
A legislação americana é muito particular na medida em que permite que o devedor pare de pagar sua dívida hipotecária sem que o banco possa executar outros bens pessoais. A única reação legal do credor é a retomada do imóvel financiado e sua colocação no mercado. Esse círculo vicioso, identificado há mais de um ano, estava sem condições políticas para ser enfrentado. Agora, em razão do agravamento da crise, virou lei.
A primeira versão da legislação que permite a renegociação das condições de pagamentos das hipotecas é de março do ano passado. Mas os republicanos sempre foram contra essas medidas, alegando questões de natureza ideológica e até de ética religiosa. Se tivessem sido aprovadas no ano passado, a crise de hoje seria muito menor e a retomada do crescimento ocorreria com menor esforço fiscal. Mas são coisas da democracia e devemos aceitá-las como mal menor.
Os efeitos dessas medidas no campo das hipotecas serão sentidos ao longo do tempo, pois muitas das negociações serão feitas com a intervenção do Judiciário, caso a caso. Mas um efeito imediato ocorrerá: os bancos vão certamente aguardar antes de executar as garantias, reduzindo a oferta de residências e aliviando o mercado. É possível esperar uma redução gradativa da queda de preços ao longo dos próximos meses. A conferir...
Quanto aos outros dois pacotes, os resultados são menos claros. As medidas fiscais terão seus efeitos espaçados ao longo do segundo semestre deste ano e do primeiro de 2010, mas ainda não se sabe como o consumidor distribuirá a redução de seus impostos entre consumo e poupança financeira. Certamente essas medidas vão provocar alguma melhora na atividade ao longo dos próximos 18 meses, compensando em parte a contração do setor privado.
Mas a grande dúvida é se esse estímulo será suficiente para uma retomada consistente da atividade econômica. Quanto à segunda fase do chamado Tarp, as expectativas de sucesso são ainda menores. A impressão geral é que as medidas não serão suficientes para estabilizar o sistema bancário. Como essa é uma condição necessária para a retomada de crescimento, ainda não há grandes razões para otimismo quanto ao futuro próximo.
Luiz Carlos Mendonça De Barros , 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
De todas as iniciativas, a que vai tratar da questão dos mutuários de hipotecas é a que terá efeitos mais claros
O GOVERNO Barack Obama ganhou três instrumentos para enfrentar a crise que atinge os Estados Unidos. O primeiro é o pacote de estímulo fiscal arrancado a fórceps dos senadores republicanos. Outro veio com a definição das regras da segunda fase do Tarp, programa herdado do governo George W. Bush para retirar os ativos tóxicos dos bancos e estabilizar o sistema financeiro. Finalmente, o governo vai usar quase US$ 300 bilhões para tentar estancar o processo de retomada de residências financiadas por hipotecas, os chamados "foreclosures".
De todas essas iniciativas, a que vai tratar da questão dos mutuários de hipotecas é fundamental. Os "foreclosures" são um elemento importante no desequilíbrio atual do mercado imobiliário americano. Em um ambiente fragilizado pela redução da oferta de crédito, a tentativa dos bancos de revender as casas tomadas de seus mutuários provoca uma espiral deflacionária nos preços. Em uma segunda etapa, essa queda dos preços dos imóveis acaba por forçar mais inadimplência por parte dos mutuários porque o valor da dívida supera seu valor de mercado, enfraquecendo ainda mais os bancos já carregados desses créditos.
A legislação americana é muito particular na medida em que permite que o devedor pare de pagar sua dívida hipotecária sem que o banco possa executar outros bens pessoais. A única reação legal do credor é a retomada do imóvel financiado e sua colocação no mercado. Esse círculo vicioso, identificado há mais de um ano, estava sem condições políticas para ser enfrentado. Agora, em razão do agravamento da crise, virou lei.
A primeira versão da legislação que permite a renegociação das condições de pagamentos das hipotecas é de março do ano passado. Mas os republicanos sempre foram contra essas medidas, alegando questões de natureza ideológica e até de ética religiosa. Se tivessem sido aprovadas no ano passado, a crise de hoje seria muito menor e a retomada do crescimento ocorreria com menor esforço fiscal. Mas são coisas da democracia e devemos aceitá-las como mal menor.
Os efeitos dessas medidas no campo das hipotecas serão sentidos ao longo do tempo, pois muitas das negociações serão feitas com a intervenção do Judiciário, caso a caso. Mas um efeito imediato ocorrerá: os bancos vão certamente aguardar antes de executar as garantias, reduzindo a oferta de residências e aliviando o mercado. É possível esperar uma redução gradativa da queda de preços ao longo dos próximos meses. A conferir...
Quanto aos outros dois pacotes, os resultados são menos claros. As medidas fiscais terão seus efeitos espaçados ao longo do segundo semestre deste ano e do primeiro de 2010, mas ainda não se sabe como o consumidor distribuirá a redução de seus impostos entre consumo e poupança financeira. Certamente essas medidas vão provocar alguma melhora na atividade ao longo dos próximos 18 meses, compensando em parte a contração do setor privado.
Mas a grande dúvida é se esse estímulo será suficiente para uma retomada consistente da atividade econômica. Quanto à segunda fase do chamado Tarp, as expectativas de sucesso são ainda menores. A impressão geral é que as medidas não serão suficientes para estabilizar o sistema bancário. Como essa é uma condição necessária para a retomada de crescimento, ainda não há grandes razões para otimismo quanto ao futuro próximo.
Luiz Carlos Mendonça De Barros , 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).
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