Maria Lima, Isabel Braga e Leila Suwwan
DEU EM O GLOBO
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Manifesto assinado por 39 pede que Sarney deixe comando da Casa
Um dia após o arquivamento das acusações contra o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), um novo bate-boca no plenário da Casa, com xingamentos e até um palavrão, reacendeu a guerra entre oposição e governo. Um dos comandantes da tropa de choque de Sarney, o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), pediu a cassação do líder tucano, Arthur Virgílio (AM), e Tasso Jereissati (CE) defendeu o correligionário. Renan chamou Tasso de "coronel", e este rebateu chamando o peemedebista de "cangaceiro". Renan xingou o tucano com um palavrão. Sarney, que presidia a sessão, ficou impassível, sem condições de conter o tumulto. Quatro partidos contrários ao arquivamento das acusações contra Sarney divulgaram manifesto assinado por 39 senadores de vários partidos, pedindo seu afastamento. Na primeira reunião da CPI da Petrobras, os governistas barraram pedidos da oposição e adiaram votações sobre a Receita Federal e a Fundação José Sarney.
"Cangaceiro de 3ª categoria"
"Coronel de merda"
Após arquivamento de denúncias contra Sarney, clima de guerra volta com bate-boca entre Tasso e Renan
O arquivamento sumário das quatro primeiras representações contra o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), pelo Conselho de Ética levou ontem a uma conflagração geral no plenário da Casa. O confronto violento entre aliados e adversários de Sarney quase terminou em agressão física. O clima de guerra, com xingamentos, palavrões e leitura de dossiês na tribuna, se deu diante de Sarney, que assistiu a tudo sem mudar o semblante. A sessão mostrou que Sarney perdeu as condições de conter a onda crescente de ameaças e intimidações na Casa.
O momento de maior tensão aconteceu quando Tasso Jereissati (PSDB-CE) e o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), aos gritos, quase partiram para a troca de ataques físicos. O estopim foi a leitura da representação do PMDB contra o líder tucano, Arthur Virgílio (AM), da tribuna, por Renan. A leitura foi recheada de ironias e pesados ataques a Virgílio.
Um aliado de Renan, sentado numa das laterais do plenário, começou a provocar Virgílio, chamando-o de "vestal" e "falso moralista". Nervoso, Tasso pediu a Sarney que o retirasse do plenário. Renan retrucou dizendo que ele, como minoria, não podia agir como maioria e mandar o homem para fora. Começou o bate-boca.
- Senador Renan, não aponte esse dedo sujo para cima mim! Não aponte esse dedo sujo para cima mim! Estou cansado de suas ameaças.
- O dedo sujo, infelizmente, é o de Vossa Excelência, são os dedos dos jatinhos que o Senado pagou - retrucou Renan, em referência à denúncia de que Tasso usou parte de sua cota de passagens para fretar jatinhos.
- Pelo menos, era com o meu dinheiro, o jato é meu. Não é do que o senhor anda, dos seus empreiteiros. O dinheiro é meu, é meu, é meu! - rebateu Tasso, exaltado.
Fora do microfone, Renan gritou:
- Seu coronel de merda!
- Eu coronel? Cangaceiro! Cangaceiro de terceira categoria! Olha o decoro parlamentar. Repita o que você disse aí - disse Tasso, que escutou Renan dizer "coronel de merda".
- Você não é coronel de nada. Você é minoria com complexo de maioria. Me respeite - continuou Renan.
- Presidente, o senador Renan Calheiros acabou de quebrar o decoro parlamentar me dirigindo palavras de baixo calão. Eu peço que seja feita uma representação sobre isso - pediu Tasso ao presidente Sarney.
- Presidência, eu peço desculpas e peço para vossa excelência retirar da sessão de hoje que minoria com complexo de maioria é falta de decoro parlamentar - tentou consertar Renan.
Antes do bate-boca, mostrando frieza, durante a leitura da representação contra Virgilio, Renan se disse constrangido de fazê-lo. Depois, quando pediu a palavra, Virgílio devolveu as ironias, chegando a dizer que Renan era "quase um super-homem".
Patrimonialismo e tráfico de influência
Ao ler a representação, Renan enfatizou que Virgílio era réu confesso de atos que constituem quebra de decoro parlamentar. Acentuou o fato de o tucano manter, por 18 meses, o pagamento de salário e horas extras de seu funcionário Carlos Alberto Nina Neto, quando ele estudava teatro no exterior, com um custo de R$210 mil.
Também citou o pagamento, pelo Senado, de valores acima do previsto no tratamento de saúde da mãe de Virgílio, e a "doação" de R$10 mil que teria recebido do ex-diretor Agaciel Maia, "prática vedada pelo Código de Ética porque ele era uma autoridade pública". Renan disse que Virgílio pagava com verba do Senado seu personal trainer, Oswaldo Alves. Disse que o tucano não usa mais o carro oficial de senador, mas impôs humilhações a 20 motoristas da Casa; que ele escondeu da Receita Federal a doação que recebeu de Agaciel e o imóvel em que mora; e que levou um policial do Senado para fazer serviços domésticos. Renan afirmou ainda que Virgílio empregava outros parentes de Nina Neto.
"O senador Arthur Virgílio elevou às culminâncias do absurdo a prática do clientelismo, do patrimonialismo e do tráfico de influência, exacerbando o uso das prerrogativas parlamentares", diz um trecho da representação.
Virgílio, da tribuna, devolveu as ironias, citando reportagens com denúncias contra Renan: o inquérito que responde no Supremo Tribunal Federal, por enriquecimento ilícito, corrupção e notas fiscais frias; o emprego de funcionários fantasmas; e acusação de que a Polícia Federal investiga vazamento de informação da Operação Mão de Obra (sobre superfaturamento em contratos do Senado) para beneficiar Agaciel, entre outras.
- V. Excelência representa o PMDB. Ulysses (Guimarães) perdeu a vez. Está tão poderoso que temo que me tome o PSDB e me destitua da liderança - disse, irônico. - Mas pode estar cometendo o maior erro de sua vida: ter avançado o quanto avançou. É uma advertência que faço. Não tenho lobista pagando minhas contas - disse, referindo-se ao episódio de que o lobista de uma empreiteira bancava despesas de sua filha fora do casamento, que resultou em processos contra ele no Conselho de Ética.
Renan reagiu:
- Eu não tenho!
Muitos senadores se mostraram assustados com o tumulto.
- Hoje experimentei talvez a sessão mais degradante na minha vida aqui no Senado. Chegamos a um ponto extraordinariamente baixo. Temos que dar um basta a isso. Para que existe o Senado? Para que existe o Congresso Nacional? Somos um bando de fouchês, figuras menores que vêm aqui com o único objetivo do enriquecimento pessoal e não para defender os interesses da sociedade? - discursou Demóstenes Torres(DEM), citando o político francês Christian Fouchet, que buscava o poder a todo custo.
Sarney assistiu a tudo em silêncio. Apenas disparou a campanhia e ssuspendeu a sessão por dois minutos após o bate-boca. Tasso requisitou as fitas da sessão, para estudar representação contra Renan.
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