Denise Chrispim Marin
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Países deixam de fora da declaração final de cúpula em Quito menção ao uso de bases colombianas pelos EUA
Sem saída interna para solucionar as divergências sobre a presença americana em bases militares da Colômbia, a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) optou ontem por convidar o presidente dos EUA, Barack Obama, para tratar das garantias de não-agressão aos países vizinhos.
A sugestão partiu do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, ao final da reunião de cúpula da Unasul, em Quito, tentou abafar o tom mais agressivo de seus colegas Hugo Chávez, da Venezuela, e Rafael Correa, do Equador, propondo uma saída conciliadora.
A declaração final do encontro assinada pelos presidentes não trouxe nenhuma menção ao uso das bases colombianas pelos EUA. Durante a reunião, porém, Chávez rompeu o protocolo, que não previa debates em razão do tempo exíguo, e disse que a presença militar americana na Colômbia é uma agressão à Venezuela e traz uma séria ameaça à estabilidade da região.
"Ventos de guerra começam a soprar na América do Sul", afirmou Chávez. "Hoje, isso pode ser o começo de uma nova tragédia. A Unasul é um bebê e está sob ameaça."
Correa, que se mantivera alheio ao tema em seu discurso de posse como presidente temporário da Unasul, tomou novamente a palavra para qualificar o acordo entre EUA e Colômbia como uma "provocação" e para alertar que o acerto trará um "grande perigo para a região". "Esse não é um assunto de soberania de um país", afirmou Correa, em contraposição a um dos argumentos de Bogotá. "É uma questão de segurança."
Outro aliado bolivariano, o presidente Evo Morales, da Bolívia, defendeu que a Unasul declarasse estado de emergência. Durante os debates, os presidentes concordaram em realizar uma reunião de ministros da Defesa e de Relações Exteriores dos países da Unasul no dia 24, em Quito, para tratar do tema.
Correa propôs que, em seguida, fosse organizada uma reunião extraordinária de cúpula da Unasul, ainda sem data, em Buenos Aires ou Bariloche. A Argentina funcionaria como "território neutro", onde Álvaro Uribe, presidente da Colômbia, não encontraria entraves diplomáticos para comparecer nem desculpas para se ausentar, como ocorreu no encontro de Quito.
"Ficou claro também que não dá para discutir a questão da Colômbia sem a presença da Colômbia, e o presidente Uribe não poderá se sentar na (próxima) reunião como se fosse réu. Ele tem de participar em igualdade de opinião", afirmou Lula.
Clemencia Forero, vice-chanceler colombiana e representante do governo Uribe, ressaltou que as futuras reuniões não devem se ater apenas à questão das bases, mas incluir também outros temas que causam tensões e desestabilização na América do Sul, como o tráfico de drogas, de armas e a ação de "grupos ilegais" na região.
A colombiana teve um cuidado especial para não mencionar as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), grupo que, para Bogotá, recebe ajuda material da Venezuela e do Equador. Como presidente da Unasul, Correa acatou a ideia.
GRUPO DE AMIGOS
Lula deu um passo além, na reunião de Quito, ao propor um novo encontro entre a Unasul e Obama no mesmo formato que ocorreu na Cúpula das Américas, em abril, em Trinidad e Tobago.
Lula deve telefonar na semana que vem para Obama para conversar sobre o assunto. Em princípio, as chancelarias do Brasil e de outros países da Unasul trabalharão com a ideia de promover um encontro em Nova York, em paralelo à abertura da Assembleia-Geral da ONU, em setembro.
À imprensa, antes de embarcar de volta ao Brasil, Lula deixou claro que não vislumbra um conflito armado na América Sul, seja em por causa das bases colombianas ou de outra questão. Explicou que essa é a visão de Chávez, líder que se mostra "desconfiado e sensível" porque sofreu um golpe de Estado em 2002.
Segundo o presidente brasileiro, seria interessante tratar com Obama de problemas que se acumulam nas relações entre a América do Sul e os EUA, como a garantia de que as ações de seus militares na Colômbia não se estenderão aos países vizinhos e a reativação da 4ª Frota Naval, em 2008.
"Temos de discutir nossa inconformidade com Obama. O clima de inquietação que há na região me incomoda", afirmou. "Mas também temos de nos colocar de acordo sobre o futuro da Unasul. Senão, deixaremos de ter um processo de integração para sermos só um grupo de amigos", completou.
VIZINHO NA MIRA
Hugo Chávez
Presidente venezuelano:
"Ventos de guerra começam a soprar na América do Sul"
"A Venezuela se sente ameaçada. Isso pode causar uma guerra. Não vou permitir que façam com a Venezuela o que fizeram com o Equador. Isso pode ser o começo de uma nova tragédia"
Rafael Correa
Presidente equatoriano
"Vejo com muita preocupação o que está acontecendo na América Latina. Isso pode desestabilizar a região. Com todo o respeito, a Colômbia é um dos países mais estáveis e tem as eleições mais antigas da região, mas tem paramilitarismo, narcotráfico e narcopolítica. Ter a presença estrangeira (na Colômbia) não é só um tremendo perigo, mas uma provocação para a região. Esse não é um assunto de soberania de um país. É um tema de segurança"
Luiz Inácio Lula da Silva
Presidente brasileiro:
"Em algum momento, a Unasul terá de convocar o governo dos EUA para conversar sobre a relação deles conosco"
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