Cássia Almeida, Aguinaldo Novo e Ronaldo D"Ercole
DEU EM O GLOBO
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Retração nos investimentos do setor industrial, que só devem crescer em 2011, representa entrave à recuperação da economia
A crise ficou para trás, e setores fortemente atingidos pela recessão mundial, como o siderúrgico, já aumentaram em mais de 50% sua produção este ano no Brasil. Num comportamento desigual entre os setores, a economia brasileira deve ter crescido perto de 2% de março a junho - o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) será divulgado na próxima sexta-feira. Economistas acreditam que a produção voltará aos níveis anteriores à crise já neste trimestre. Mas a maior preocupação, tanto da equipe econômica do governo quanto de analistas, é com os investimentos, que só devem se recuperar em 2011.
Julio Gomes de Almeida, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), estima em 10% a queda dos investimentos, retração que seria anulada em 2010:
- Mas ficaríamos empatados no mesmo patamar por dois anos. É como se tivéssemos nadado, nadado, para chegar ao mesmo lugar.
Mesmo aceitando a ideia de que o pior da crise global já passou, o setor industrial como um todo prevê lenta recuperação da produção e, por tabela, dos investimentos. Estima-se que o nível de utilização da capacidade instalada - abaixo de 80% desde dezembro - leve pelo menos mais um ano para voltar ao patamar pré-crise (entre 83% e 86%, dependendo do indicador). Só depois disso, afirmam os empresários, seria possível pensar em novos investimentos.
- A economia deixou de apresentar retração, mas o buraco aberto pela crise ainda não foi superado - diz o gerente de política econômica da Confederação Nacional da Indústria, Flávio Castelo Branco, que prevê queda de 9% para a taxa de Formação Bruta de Capital Fixo (investimento) neste ano.
Como a demanda caiu muito, a indústria está com capacidade ociosa - o que foi citado pelo Comitê de Política Monetária (Copom) ao manter, semana passada, a taxa de juros em 8,75%. Portanto, o setor não precisa ampliar seus investimentos. Além disso, as indústrias construíram novas fábricas, que começam a ficar prontas. Ou seja, mais capacidade de produção.
- E há a incerteza política com as eleições. A tendência é o empresário se retrair e esperar o quadro político se desenhar - diz Sergio Vale, economista da MB Associados.
Linha do BNDES pode ajudar indústria
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou semana passada que a economia teria crescido entre 1,8% e 2% no segundo trimestre. Na equipe econômica, essa euforia é compartilhada, mas há atenção especial para a retomada dos investimentos - que sustentaram mais de 24 meses de expansão do PIB, até o terceiro trimestre de 2008. A Formação Bruta de Capital Fixo, dizem técnicos, deverá reagir entre julho e setembro, na carona da redução de juros pelo BNDES.
O número será decisivo para que a economia cresça, em 2009, entre 0,7% e o 1% previsto no Orçamento da União. Se o patamar se confirmar, a economia "estará girando acima de 4,5% quando 2009 acabar", diz uma fonte.
Francisco Faria, economista da LCA Consultores, prevê um "Pibão" em 2010. A consultoria projeta expansão de 4,9%, otimismo repartido por outros analistas de mercado.
- Ano que vem será o ano do Pibão, mesmo com o comportamento desigual. O setor de máquinas e equipamentos só agora começa a sair do fundo do poço. Porém a construção civil tem reagido - diz Faria.
Incentivos fiscais, aumento do salário mínimo e do Bolsa Família farão o Brasil crescer 0,9% em 2009. Assim, a expectativa de Vale, da MB Associados, é de expansão de 0,2% este ano:
- Sem os incentivos, acreditamos que o PIB ficaria 0,7% menor este ano. A política anticíclica poderia ter sido feita com mais incentivos fiscais e investimentos públicos e não com gasto fixo, como o aumento do salário mínimo. Mas houve efeito claro na economia.
Esses incentivos, principalmente na construção civil, permitiram que a indústria carioca de sondas Maquesonda recuperasse suas vendas. Ainda assim, ela adiou para 2010 os investimentos previstos para este ano, de R$15 milhões. Já a Piraquê, voltada para o mercado interno, não sofreu com a crise: suas vendas aumentaram e ela está contratando.
- O setor de alimentos se beneficiou com a queda no preço das commodities. As pessoas deixaram de comprar eletrodomésticos e evitaram sair. Assim, sobrou recursos para comprar alimentos supérfluos, como biscoito recheado - diz o diretor Alexandre Colombo. - Vamos investir de R$15 milhões a R$20 milhões no biênio 2009/2010.
A produção industrial brasileira, que desabou 20% entre outubro e dezembro, recupera-se lentamente. Entre janeiro e junho, cresceu 7,9%, nem a metade da perda de 2008. Já em julho houve expansão de 2,2%, bem acima da média mensal do primeiro semestre, de 1,2%. Mas Leonardo Carvalho, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), espera queda em torno de 7% no ano.
Importante termômetro do ritmo dos investimentos na economia, o setor de máquinas e equipamentos (bens de capital) fechou os sete primeiros meses do ano com faturamento 24,3% menor que o do mesmo período de 2008, segundo a Abimaq, entidade que reúne os fabricantes. O setor aposta suas fichas na linha especial para a aquisição de bens de capital, criada pelo BNDES no fim de julho, para recuperar parte das perdas.
- Certamente essa linha vai promover uma antecipação de investimentos, porque é improvável que o governo vá prorrogá-la - diz o economista André Rebello, gerente do Departamento de Pesquisas da Fiesp.
Maior fabricante nacional de máquinas-ferramentas (tornos e centros de usinagem) e grande fornecedor de outros setores da indústria, a Romi, de Santa Bárbara D"Oeste (SP), viu as encomendas sumirem entre o fim de 2008 e o início deste ano. Mas os pedidos começaram a voltar em abril.
O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e os projetos de estatais, principalmente a Petrobras, também têm alimentado a produção de alguns setores da indústria.
- As empresas que têm contratos de concessão, como as de energia elétrica ou as operadoras de rodovias, têm obrigações a cumprir e não podem atrasar as obras - diz Paulo Godoy, presidente da Abdib, entidade que representa a indústria de base.
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