Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Com uma explanação inicial bem ensaiada sobre o papel do Supremo Tribunal Federal, gestos de bom efeito - como levantar um exemplar da Constituição ao molde de bíblia e fartos elogios ao Congresso -, esquivando-se da essência das perguntas mais complicadas ao ponto de "esquecer" se havia ou não orientado a defesa do ex-ministro Silas Rondeau, o novo ministro do STF, José Antônio Toffoli, saiu-se a contento da sabatina na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
Não sofreu as prometidas contestações, não enfrentou questionário rigoroso, foi irrepreensível na observância do manual do bom candidato e absolutamente profissional no treinamento e na montagem do lobby direcionados ao resultado pretendido, alcançado com larga margem de vantagem.
Isso, a despeito de todas as restrições existentes ao nome dele, numa conjugação de fatores adversos inédita. Toffoli - do ponto de vista dele - merece, portanto, nota 10.
Já o Senado ficou no zero a zero de sempre. Desincumbiu-se da função de submeter o indicado à sabatina como quem carimba um requerimento emitido pelo presidente da República, mas não permitiu ao público saber se o novo ministro é ou não adequado para o cargo.
Tomara que brevemente venha a demonstrar que seja, pois o Senado não deu a chance ao País nem cumpriu o seu dever de esclarecer a questão antes do fato consumado. Não pôs a prova o exigido notório saber, a reputação ilibada e a independência do indicado.
À exceção dos senadores Álvaro Dias, Pedro Simon e mais um ou outro, não se fez referência às restrições que nos dias anteriores à sabatina suscitaram polêmica e justificaram o lobby, cuja organização incluiu a contratação de empresa de comunicação especializada.
Mesmo os questionamentos sobre os assuntos em pauta ocorreram como se fossem parte de um roteiro preestabelecido, para constar. Os senadores aceitaram passivamente o alegado "esquecimento" sobre o caso Rondeau, a afirmação de que as condenações na Justiça do Amapá por recebimento indevido de recursos públicos foram equivocadas, o juramento de que as ligações estreitas com o PT, Lula e José Dirceu são "páginas viradas", bem como o compromisso com a independência nos julgamentos do STF.
Palavra contra palavra, valeu a do questionado. Ao aprová-lo sem questionamento o Senado deu um voto de confiança, quando o que se esperava era que desse um voto consciente.
De preferência, evitando cenas como a do líder do PSDB, Artur Virgílio, dizendo que seu voto a favor havia sido recomendado por um advogado amigo em comum.
Um espetáculo tosco. Não por causa de Toffoli. Mas pelo conjunto da obra de subserviência e displicência do Legislativo para com as suas prerrogativas.
Por isso é um equívoco achar que o erro está no fato de o presidente da República indicar os ministros do Supremo, porque a deformação é de quem aceita as coisas sem discutir.
Algo de podre
Com todo respeito que não merece uma Justiça que fere a Constituição e censura, é altamente suspeita a decisão do Tribunal de Justiça de Brasília de levar dois meses para se declarar incompetente para julgar a liminar proibindo o Estado de divulgar informações sobre a operação da Polícia Federal que investiga Fernando Sarney, filho do presidente do Senado.
Um juiz, o autor da liminar, já foi declarado impedido por suas relações de amizade com a família Sarney. O TJ-DF, bem como outros tribunais com endereço na capital da República, é um ambiente de trânsito sabidamente fácil para o senador.
O envio da questão para julgamento no Maranhão, feudo da família, não contribui para a confiabilidade do Judiciário. Ao contrário, produz desconfiança.
Apesar de todas as incongruências do processo - o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, já disse que é incompreensível a demora na decisão final -, a censura continua em vigor.
Enquanto um jornal continuar impedido de informar, não se pode dizer que o Brasil esteja em situação de normalidade democrática.
Viva Lula
O Tribunal Superior Eleitoral condenou a maior parte da "reforma" na lei eleitoral feita pelo Congresso, mas aplaudiu - com veemência - o veto do presidente Lula às restrições ao uso da internet. Retrocesso que, no entender do TSE, foi a, bom tempo, corrigido pelo presidente.
Nunca antes
O cidadão Celso Amorim tem assegurado seu direito legal de filiação partidária. O chanceler, porém, tem (ou teria) o dever de manter sua condição de servidor do Estado, que permanece, e não de governos, que se alternam.
Amorim já havia inovado quando da filiação ao PMDB. Agora, na transferência para o PT em busca de "um palanquezinho", superou-se.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Com uma explanação inicial bem ensaiada sobre o papel do Supremo Tribunal Federal, gestos de bom efeito - como levantar um exemplar da Constituição ao molde de bíblia e fartos elogios ao Congresso -, esquivando-se da essência das perguntas mais complicadas ao ponto de "esquecer" se havia ou não orientado a defesa do ex-ministro Silas Rondeau, o novo ministro do STF, José Antônio Toffoli, saiu-se a contento da sabatina na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
Não sofreu as prometidas contestações, não enfrentou questionário rigoroso, foi irrepreensível na observância do manual do bom candidato e absolutamente profissional no treinamento e na montagem do lobby direcionados ao resultado pretendido, alcançado com larga margem de vantagem.
Isso, a despeito de todas as restrições existentes ao nome dele, numa conjugação de fatores adversos inédita. Toffoli - do ponto de vista dele - merece, portanto, nota 10.
Já o Senado ficou no zero a zero de sempre. Desincumbiu-se da função de submeter o indicado à sabatina como quem carimba um requerimento emitido pelo presidente da República, mas não permitiu ao público saber se o novo ministro é ou não adequado para o cargo.
Tomara que brevemente venha a demonstrar que seja, pois o Senado não deu a chance ao País nem cumpriu o seu dever de esclarecer a questão antes do fato consumado. Não pôs a prova o exigido notório saber, a reputação ilibada e a independência do indicado.
À exceção dos senadores Álvaro Dias, Pedro Simon e mais um ou outro, não se fez referência às restrições que nos dias anteriores à sabatina suscitaram polêmica e justificaram o lobby, cuja organização incluiu a contratação de empresa de comunicação especializada.
Mesmo os questionamentos sobre os assuntos em pauta ocorreram como se fossem parte de um roteiro preestabelecido, para constar. Os senadores aceitaram passivamente o alegado "esquecimento" sobre o caso Rondeau, a afirmação de que as condenações na Justiça do Amapá por recebimento indevido de recursos públicos foram equivocadas, o juramento de que as ligações estreitas com o PT, Lula e José Dirceu são "páginas viradas", bem como o compromisso com a independência nos julgamentos do STF.
Palavra contra palavra, valeu a do questionado. Ao aprová-lo sem questionamento o Senado deu um voto de confiança, quando o que se esperava era que desse um voto consciente.
De preferência, evitando cenas como a do líder do PSDB, Artur Virgílio, dizendo que seu voto a favor havia sido recomendado por um advogado amigo em comum.
Um espetáculo tosco. Não por causa de Toffoli. Mas pelo conjunto da obra de subserviência e displicência do Legislativo para com as suas prerrogativas.
Por isso é um equívoco achar que o erro está no fato de o presidente da República indicar os ministros do Supremo, porque a deformação é de quem aceita as coisas sem discutir.
Algo de podre
Com todo respeito que não merece uma Justiça que fere a Constituição e censura, é altamente suspeita a decisão do Tribunal de Justiça de Brasília de levar dois meses para se declarar incompetente para julgar a liminar proibindo o Estado de divulgar informações sobre a operação da Polícia Federal que investiga Fernando Sarney, filho do presidente do Senado.
Um juiz, o autor da liminar, já foi declarado impedido por suas relações de amizade com a família Sarney. O TJ-DF, bem como outros tribunais com endereço na capital da República, é um ambiente de trânsito sabidamente fácil para o senador.
O envio da questão para julgamento no Maranhão, feudo da família, não contribui para a confiabilidade do Judiciário. Ao contrário, produz desconfiança.
Apesar de todas as incongruências do processo - o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, já disse que é incompreensível a demora na decisão final -, a censura continua em vigor.
Enquanto um jornal continuar impedido de informar, não se pode dizer que o Brasil esteja em situação de normalidade democrática.
Viva Lula
O Tribunal Superior Eleitoral condenou a maior parte da "reforma" na lei eleitoral feita pelo Congresso, mas aplaudiu - com veemência - o veto do presidente Lula às restrições ao uso da internet. Retrocesso que, no entender do TSE, foi a, bom tempo, corrigido pelo presidente.
Nunca antes
O cidadão Celso Amorim tem assegurado seu direito legal de filiação partidária. O chanceler, porém, tem (ou teria) o dever de manter sua condição de servidor do Estado, que permanece, e não de governos, que se alternam.
Amorim já havia inovado quando da filiação ao PMDB. Agora, na transferência para o PT em busca de "um palanquezinho", superou-se.
Um comentário:
Quem tem medo de Toffoli?
As objeções da imprensa oposicionista não desqualificam José Antônio Toffoli para ocupar uma vaga de ministro do STF. Ninguém com seriedade de propósitos acredita que a idade, o grau de formação ou a militância partidária garantem ou impedem competência em qualquer área. Todos esses argumentos infantis cairiam em minutos, se alguém os tivesse utilizado quando era FHC a indicar ministros.
Toffoli assusta a direita porque, embora conservador ele próprio, simboliza uma renovação de mentalidade. Carcomido por vícios históricos, preso a valores e rituais putrefeitos, o Judiciário tem ojeriza a abordagens modernas, vigorosas e inovadoras. Com todas as dificuldades iniciais (e os inegáveis obstáculos causados pela inexperiência), cada novo magistrado representa um alívio saneador nesse Poder tão maltratado, e que às vezes causa tamanhos males ao país.
Mas há também interesses localizados a induzir essa campanha anti-Toffoli, com base em sua atuação pretérita e nos julgamentos dos quais poderá participar nos próximos meses: ele defendeu a demarcação contínua da reserva Raposa do Sol (RR); foi advogado de João Capiberibe contra famosos coronéis políticos do Amapá; apoiou a política de ação afirmativa nas universidades brasileiras, questionada no STF pelo DEM (PFL); considerou lícita a concessão de asilo político a Cesare Battisti (não significa defender o asilo); propôs limitar o lucro dos cartórios; se posicionou contra o julgamento dos crimes da ditadura; e declarou a inconstitucionalidade da lei antifumo de José Serra.
É bom lembrar também que o STF em breve julgará os acusados pelo Mensalão e pelo Valerioduto, além da descriminalização da drogas (já em vigor, tecnicamente, no Estado de São Paulo). A múltipla atuação de Toffoli como Advogado-geral da União pode ser conhecida na página da instituição.
Postar um comentário