DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
À medida que chega a hora de deixar o Planalto, Lula parece oscilar entre o desejo de uma vida "anônima" e a melancolia antecipada do poder perdido
Leonencio Nossa e Luiz Alberto Weber
A menos de seis meses de deixar o poder, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva revela ansiedade com o fim do mandato. Ao mesmo tempo, mostra-se vacilante em cumprir o rito de passagem que o levará do Planalto, depois de oito anos, à planície dos "ex". "Aqui, na Zâmbia, eu tomo café. Se estivesse na Escócia, eu tomaria scotch", disse Lula, num dos poucos momentos de alma aberta durante a viagem de uma semana que fez na semana passada à África. Um assessor palaciano contou ao Estado que o café não foi servido frio - metáfora que descreve o período de fim de governo marcado pelo esboroamento do poder.
Mesmo com a bebida fumegante, Lula não escondeu o enfado com as tradicionais batucadas nas chegadas a países remotos do continente. O presidente que vestia túnicas de chefes tribais, tocava atabaque em cada aeroporto, ria da própria saia justa de posar ao lado de ditadores deu sinais de cansaço da festa do poder e da melancolia de quem deixará o cargo.
Um estado de espírito que já tomara conta de Lula pouco antes da viagem. Em junho, mês que sacramentou a candidatura governista de Dilma Rousseff ao Planalto, o presidente fez uma "despedida" a cada dois dias.
Análise dos discursos oficiais desse período revela um homem oscilante entre o desejo de uma vida "anônima" e o banzo antecipado do poder perdido.
A vida própria adquirida por sua criatura política, a ex-ministra da Casa Civil, repercutiu nos discursos de Lula. Mesmo na condição de principal cabo eleitoral de Dilma, ele demonstrou irritação com o surgimento dos primeiros sintomas de "lame duck" - expressão inglesa que significa pato manco e identifica políticos desprestigiados em fim de mandato.
"Se eu fosse presidente tinha alguém que vinha aqui me oferecer água; como eu estou no final do mandato... você viu que eu tenho que agachar sozinho, pegar minha água. Os meus assessores já estão todos pensando na próxima Presidência", disse em 8 de junho, em Fortaleza. Em Natal, no dia seguinte, o mesmo diapasão: "Eu estou falando e a minha assessoria nem olha para mim, eles já estão de olho em quem será o próximo presidente, já estão querendo agradar a quem vai ser", disse, aborrecido com a demora da assessoria em entregar-lhe um documento.
Na África, a liturgia do poder o agastou. Nada irritou mais o presidente que as bandinhas que tocavam de forma espalhafatosa e sem ritmo o Hino Nacional brasileiro. Na Tanzânia, ele foi obrigado a ouvir a charanga local tocar seis vezes o hino do país e seis vezes o brasileiro. No dia seguinte, na Zâmbia, penúltima etapa da viagem, não suportou quando o grupo zambiano apareceu para tocar o hino pela quarta vez: "Porra", lamentou baixinho.
No dia anterior, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, saiu da tenda onde hino havia sido executado para dar orientações ao cerimonial. "O hino está muito grande. Temos de trazer uma partitura reduzida", disse a um assessor.
Nas viagens pelo Congo, Burquina Faso, Nigéria e Angola em 2008, Lula posou tocando atabaques e chocalhos de grupos musicais que o recepcionavam nos eventos. Agora, na visita a Malabo, na Guiné Equatorial, manteve-se distante de crianças que dançavam ao som de tambores.
Na segunda-feira, ele foi surpreendido no saguão do aeroporto de Malabo por um homem e uma mulher que lhe entregaram sete gravatas vermelhas, um quadro com sua foto, camisetas e bandeiras. Aceitou posar com os dois rapidamente e pediu a um ajudante para guardar os brindes.
À medida que chega a hora de deixar o Planalto, Lula parece oscilar entre o desejo de uma vida "anônima" e a melancolia antecipada do poder perdido
Leonencio Nossa e Luiz Alberto Weber
A menos de seis meses de deixar o poder, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva revela ansiedade com o fim do mandato. Ao mesmo tempo, mostra-se vacilante em cumprir o rito de passagem que o levará do Planalto, depois de oito anos, à planície dos "ex". "Aqui, na Zâmbia, eu tomo café. Se estivesse na Escócia, eu tomaria scotch", disse Lula, num dos poucos momentos de alma aberta durante a viagem de uma semana que fez na semana passada à África. Um assessor palaciano contou ao Estado que o café não foi servido frio - metáfora que descreve o período de fim de governo marcado pelo esboroamento do poder.
Mesmo com a bebida fumegante, Lula não escondeu o enfado com as tradicionais batucadas nas chegadas a países remotos do continente. O presidente que vestia túnicas de chefes tribais, tocava atabaque em cada aeroporto, ria da própria saia justa de posar ao lado de ditadores deu sinais de cansaço da festa do poder e da melancolia de quem deixará o cargo.
Um estado de espírito que já tomara conta de Lula pouco antes da viagem. Em junho, mês que sacramentou a candidatura governista de Dilma Rousseff ao Planalto, o presidente fez uma "despedida" a cada dois dias.
Análise dos discursos oficiais desse período revela um homem oscilante entre o desejo de uma vida "anônima" e o banzo antecipado do poder perdido.
A vida própria adquirida por sua criatura política, a ex-ministra da Casa Civil, repercutiu nos discursos de Lula. Mesmo na condição de principal cabo eleitoral de Dilma, ele demonstrou irritação com o surgimento dos primeiros sintomas de "lame duck" - expressão inglesa que significa pato manco e identifica políticos desprestigiados em fim de mandato.
"Se eu fosse presidente tinha alguém que vinha aqui me oferecer água; como eu estou no final do mandato... você viu que eu tenho que agachar sozinho, pegar minha água. Os meus assessores já estão todos pensando na próxima Presidência", disse em 8 de junho, em Fortaleza. Em Natal, no dia seguinte, o mesmo diapasão: "Eu estou falando e a minha assessoria nem olha para mim, eles já estão de olho em quem será o próximo presidente, já estão querendo agradar a quem vai ser", disse, aborrecido com a demora da assessoria em entregar-lhe um documento.
Na África, a liturgia do poder o agastou. Nada irritou mais o presidente que as bandinhas que tocavam de forma espalhafatosa e sem ritmo o Hino Nacional brasileiro. Na Tanzânia, ele foi obrigado a ouvir a charanga local tocar seis vezes o hino do país e seis vezes o brasileiro. No dia seguinte, na Zâmbia, penúltima etapa da viagem, não suportou quando o grupo zambiano apareceu para tocar o hino pela quarta vez: "Porra", lamentou baixinho.
No dia anterior, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, saiu da tenda onde hino havia sido executado para dar orientações ao cerimonial. "O hino está muito grande. Temos de trazer uma partitura reduzida", disse a um assessor.
Nas viagens pelo Congo, Burquina Faso, Nigéria e Angola em 2008, Lula posou tocando atabaques e chocalhos de grupos musicais que o recepcionavam nos eventos. Agora, na visita a Malabo, na Guiné Equatorial, manteve-se distante de crianças que dançavam ao som de tambores.
Na segunda-feira, ele foi surpreendido no saguão do aeroporto de Malabo por um homem e uma mulher que lhe entregaram sete gravatas vermelhas, um quadro com sua foto, camisetas e bandeiras. Aceitou posar com os dois rapidamente e pediu a um ajudante para guardar os brindes.
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