DEU EM O GLOBO
Onze milhões de barriga vazia
INSEGURANÇA ALIMENTAR
Número de brasileiros que não come todos os dias cai, mas famintos equivalem a uma "São Paulo"
Cássia Almeida, Clarice Spitz e Isabela Martin
A fome ainda assombra 11,2 milhões de brasileiros, praticamente a população da cidade de São Paulo. Mas já foi pior. Pesquisa sobre segurança alimentar divulgada ontem pelo IBGE mostrou que a parcela da população que sofre com insegurança alimentar grave, quando as famílias não conseguem pôr comida em casa todos os dias, caiu de 8,2% em 2004, correspondendo a 14,856 milhões de pessoas, para 5,8% em 2009.
A ampliação do alcance do programa de transferência de renda Bolsa Família, que subiu de 6,6 milhões de famílias em 2004, para 12,3 milhões em 2009, é um dos principais motivos para a redução no quadro de fome no país. Aliada ao aumento real do salário mínimo que foi de 28,5% nesse período ajuda a explicar essa queda na insegurança alimentar, considerada bastante expressiva pelos especialistas.
- A única meta a se perseguir é zerar a insegurança alimentar grave - diz Márcia Quintslr, coordenadora de Trabalho e Rendimento do IBGE.
Francisco Menezes, diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e membro do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), vê "um progresso visível e relevante":
- Esse progresso não acontece do dia para noite. Sabemos que a pobreza extrema, com renda per capita de um quarto do salário mínimo, está intimamente ligada à insegurança alimentar. O benefício do Bolsa Família, em média, é de R$95. Para as famílias nessas condições mais vulneráveis, deveria se pensar em elevar o valor transferido.
O especialista reconhece que o programa está bem focado, chegando "perto dos que sofrem com a insegurança alimentar".
O secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento Social, Rômulo Paes Sousa, achou significativa a redução do contingente de famílias em estado de insegurança alimentar grave. O número de domicílios nessa situação caiu de 3,6 milhões em 2004 para 2,9 milhões em 2009:
- Houve queda de 50% na insegurança alimentar entre as famílias com renda até um quarto do salário mínimo. É uma mudança importante num período de tempo muito curto. Houve ganhos substanciais principalmente para as mulheres e negros, no Nordeste e no Norte.
Quando crianças choram de fome, mãe vai às ruas pedir: "Trago nem que seja pão seco"
Segundo o secretário-executivo, ainda há três milhões de famílias a serem atendidas pelo Bolsa Família. E atendê-las é uma meta imediata, diz Sousa.
- São famílias que não têm domicílio permanente, documentos, são populações indígenas e quilombolas. É importante que a presidente Dilma (Rousseff) tenha elegido a erradicação da pobreza extrema como meta principal.
Grávida de cinco meses do nono filho, a fome ronda a casa de Rejane Ferreira Domingues, de 37 anos, em Bom Jardim, periferia de Fortaleza. O marido, o pedreiro Jonas da Silva Maciel, está desempregado. Além dos R$134 do Bolsa Família, o que entra vem de bicos lavando roupa ou fazendo faxina. Antes de receber o Bolsa Família, há dois anos, a situação era pior. Muitas vezes só faziam uma única refeição por dia.
Quando consegue um bico, Rejane sai cedo e só volta à tarde. Nesses dias, as crianças já ficam sem almoçar porque não tem quem faça. Em compensação, a mesa fica mais farta na volta com as doações das patroas.
- Elas me dão comida e eu faço arroz, feijão, macarrão. A gente come por dois dias - diz ela. - Gosto de fazer assim porque, no dia que falta, as crianças estão fortes para aguentar.
Rejane vive com quatro dos nove filhos e o marido numa casa de um único cômodo às margens de um canal. As crianças ficam a maior parte do tempo na escola e voltam para casa já alimentadas. Mas, quando acontece de faltar comida e as crianças chorarem de fome, Rejane ganha as ruas e pede. Nunca volta de mãos vazias, segundo ela.
- Trago nem que seja pão seco - diz.
Onze milhões de barriga vazia
INSEGURANÇA ALIMENTAR
Número de brasileiros que não come todos os dias cai, mas famintos equivalem a uma "São Paulo"
Cássia Almeida, Clarice Spitz e Isabela Martin
A fome ainda assombra 11,2 milhões de brasileiros, praticamente a população da cidade de São Paulo. Mas já foi pior. Pesquisa sobre segurança alimentar divulgada ontem pelo IBGE mostrou que a parcela da população que sofre com insegurança alimentar grave, quando as famílias não conseguem pôr comida em casa todos os dias, caiu de 8,2% em 2004, correspondendo a 14,856 milhões de pessoas, para 5,8% em 2009.
A ampliação do alcance do programa de transferência de renda Bolsa Família, que subiu de 6,6 milhões de famílias em 2004, para 12,3 milhões em 2009, é um dos principais motivos para a redução no quadro de fome no país. Aliada ao aumento real do salário mínimo que foi de 28,5% nesse período ajuda a explicar essa queda na insegurança alimentar, considerada bastante expressiva pelos especialistas.
- A única meta a se perseguir é zerar a insegurança alimentar grave - diz Márcia Quintslr, coordenadora de Trabalho e Rendimento do IBGE.
Francisco Menezes, diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e membro do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), vê "um progresso visível e relevante":
- Esse progresso não acontece do dia para noite. Sabemos que a pobreza extrema, com renda per capita de um quarto do salário mínimo, está intimamente ligada à insegurança alimentar. O benefício do Bolsa Família, em média, é de R$95. Para as famílias nessas condições mais vulneráveis, deveria se pensar em elevar o valor transferido.
O especialista reconhece que o programa está bem focado, chegando "perto dos que sofrem com a insegurança alimentar".
O secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento Social, Rômulo Paes Sousa, achou significativa a redução do contingente de famílias em estado de insegurança alimentar grave. O número de domicílios nessa situação caiu de 3,6 milhões em 2004 para 2,9 milhões em 2009:
- Houve queda de 50% na insegurança alimentar entre as famílias com renda até um quarto do salário mínimo. É uma mudança importante num período de tempo muito curto. Houve ganhos substanciais principalmente para as mulheres e negros, no Nordeste e no Norte.
Quando crianças choram de fome, mãe vai às ruas pedir: "Trago nem que seja pão seco"
Segundo o secretário-executivo, ainda há três milhões de famílias a serem atendidas pelo Bolsa Família. E atendê-las é uma meta imediata, diz Sousa.
- São famílias que não têm domicílio permanente, documentos, são populações indígenas e quilombolas. É importante que a presidente Dilma (Rousseff) tenha elegido a erradicação da pobreza extrema como meta principal.
Grávida de cinco meses do nono filho, a fome ronda a casa de Rejane Ferreira Domingues, de 37 anos, em Bom Jardim, periferia de Fortaleza. O marido, o pedreiro Jonas da Silva Maciel, está desempregado. Além dos R$134 do Bolsa Família, o que entra vem de bicos lavando roupa ou fazendo faxina. Antes de receber o Bolsa Família, há dois anos, a situação era pior. Muitas vezes só faziam uma única refeição por dia.
Quando consegue um bico, Rejane sai cedo e só volta à tarde. Nesses dias, as crianças já ficam sem almoçar porque não tem quem faça. Em compensação, a mesa fica mais farta na volta com as doações das patroas.
- Elas me dão comida e eu faço arroz, feijão, macarrão. A gente come por dois dias - diz ela. - Gosto de fazer assim porque, no dia que falta, as crianças estão fortes para aguentar.
Rejane vive com quatro dos nove filhos e o marido numa casa de um único cômodo às margens de um canal. As crianças ficam a maior parte do tempo na escola e voltam para casa já alimentadas. Mas, quando acontece de faltar comida e as crianças chorarem de fome, Rejane ganha as ruas e pede. Nunca volta de mãos vazias, segundo ela.
- Trago nem que seja pão seco - diz.
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