Foi bonita a festa. Não há a quem não tenha surpreendido pela magnitude e impacto. A cada palavra de ordem, apupo ou vaias emergia uma sensação de descontentamento, de revanche e até mesmo de raiva para com os vereadores. Moços e moças que lotaram o plenário da Câmara Municipal de Franca na quinta-feira, dia 6 de outubro de 2011..., conseguiram manter em 15 o número de vereadores, ainda que isto já fosse previsível, uma vez que não havia entre estes quem defendesse, naquele momento, o aumento do número de vagas para a próxima legislatura.
O ambiente de euforia com a participação (pouco vista) desmentiu muitas coisas. Mostrou que a juventude, ao contrário do que tergiversam alguns, se importa com a política. Mais do que is so, sabe se mobilizar e conquistar espaços de participação, sabe construir seus discursos, ainda que estes padeçam às vezes de algum exagero compreensível. Essa juventude deu um grande exemplo de participação democrática com o qual a cidade e alguns de seus políticos não estão acostumados a conviver.
O que essa juventude e aqueles que a seguiram parecem não reconhecer é que movimentos como esses às vezes não expressam tão limpidamente as “forças profundas” que comandam a nossa cultura política.
Os oportunistas usaram o episódio, fazendo reluzir sua retórica demagógica por meio da qual manipulam o povo e garantem seus interesses partidários e pessoais. Outros, expressando o senso comum, extraíram conclusões delirantes que professam a integral inutilidade da função dos vereadores, o que poderia sugerir a supressão dessa dimensão da representação na nossa República.
Como sabemos, o delírio é muitas vezes capaz de revelar aquilo que, sob o domínio da razão, permanece oculto. Refinando o olhar sobre o episódio se percebe, assim, que nele também se repôs velhos mantras da cultura política liberal-reducionista que quer a minimização do Estado e de sua representação.
Nessa concepção, políticos são, no essencial, desnecessários, e o Estado um mal necessário que deve figurar apenas para garantir ordem ao fluir dos negócios. Essa visão carrega consigo a utopia de que o número de vereadores deveria ser tendencialmente zero.
A despeito da inteira razão que existe na critica da população ao desempenho e à eficácia dos nossos representantes políticos, sabemos que essa questão só poderá ser enfrentada de maneira positiva com o aperfeiçoamento das instituições políticas. Sem estas e sem aqueles não há democracia que funcione no mundo.
A democracia do nosso tempo é a institucionalização do conflito, da diferença e da divergência, no âmbito das instituições do Estado.
A contrademocracia, conceito de Pierre Rosanvallon, é o pulsar e a expressão critica da sociedade que dá vida à democracia, fora das instituições representativas, ao demandar reformas no sistema político que sustenta tais instituições. É o reconhecimento do encontro desta duas dimensões da democracia que precisa ser assimilado como lição da festa que se viveu.
*Alberto Aggio é Professor titular de História da Unesp-Franca
FONTE: Comércio da Franca (SP), 12/10/2011)
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