Governo vai fazer superavit prometido em 2011, mas gasta mal e não tem plano fiscal para o longo prazo
Uma estimativa muito errada dos economistas neste ano dava conta de que o governo federal não entregaria o superavit primário que prometeu. Economistas de consultorias e bancos diziam que Dilma Rousseff e Guido Mantega não poupariam parte da receita de tributos o bastante para chegar a 3,1% do PIB (somadas as contribuições de estatais, Estados e municípios).
Lembre-se sempre de que poupança se trata aqui: despesa menos receita afora gastos com juros. Pago o custo da dívida pública, o setor público brasileiro deve ficar com deficit de uns 2,5% do PIB.
Chegar a 3,1% ou 3,2% do PIB de "poupança" era importante porque: 1) Assim o governo daria alguma contribuição à contenção da "demanda", de consumo e de investimento, em ano de inflação ascendente; 2) O governo daria um lustro na imagem de país "fiscalmente responsável". Isto é, de um governo com as contas mais ou menos em ordem, pelo menos no curto prazo.
Recorde-se que neste ano, num documento da cúpula do G20 de novembro, se dizia coisa dessa espécie sobre o Brasil, durante décadas um país que nem sabia quanto gastava, noutros períodos em moratória, quase sempre tido como risco de crédito muito alto: "Alemanha, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia e Indonésia, onde as finanças públicas continuam relativamente sólidas...".
Na verdade, o Brasil ainda tem um problema fiscal (de gastos públicos) enorme. Além de despesas ineficientes e mal controladas, temos deficit e dívida demais.
Quanto é "demais"? Nossa dívida não é menor que as euro-americanas e japonesa? É. Mas seu custo financeiro gira em torno de 11%, 12% ao ano (se considerada a taxa "básica" de juros, a Selic. O custo "implícito", real, no caixa, da dívida, roda em torno dos 15% ao ano).
É juro alto demais para a nossa dívida; e também a dívida é alta demais para o nosso crédito na praça.
Isto posto, nossa situação ao menos tem melhorado, aos pouquinhos. Mas com quantos pouquinhos se faz uma canoa fiscal sólida? Considere-se a situação deste ano.
A despesa deve crescer em torno de 3,5%, nas contas do economista Maurício Oreng, do Itaú, em relatório de ontem sobre o balanço fiscal. Ainda é um ritmo um pouco maior que o do PIB, mas se trata de quase um milagre no Brasil. No ano passado, o gasto subiu quase 9%.
Quais foram os santos do milagre? Neste ano não houve reajuste de salário de servidor -houve quase apenas aumento vegetativo da folha. É uma raridade. Mas o talho maior ocorreu no investimento do governo "em obras", que deve cair mais de 8% neste ano. Como de costume, o ajuste fiscal é de baixa qualidade: menos corte em despesa de custeio, mais em investimento.
Ainda assim, o governo fez um esforço considerável para conter as despesas de manutenção da máquina, esforço que vai ser difícil de repetir no ano que vem (e, no caso do investimento, é quase inviável manter a seca deste ano).
Qual o resumo da ópera? Não é mais possível fazer esses ajustes na boca do caixa. Não são duradouros, criam ineficiências, desarranjos na administração e, ainda pior, no investimento. É preciso mudar o padrão do gasto e o seu controle. Para tanto, é preciso um plano de longo prazo. Não temos.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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