Entrevista - Marco Aurélio Santana
Estudioso do movimento sindical, o sociólogo Marco Aurélio Santana – professor da UFRJ e autor de vários livros sobre o tema – percebe diferenças significativas na relação da presidente Dilma com o setor, em comparação com Lula. Nesta entrevista ao JC, ele critica a falta de debate em torno do projeto do novo fundo de previdência, mas não acredita em rompimento dos líderes sindicais com o governo que ajudaram a eleger.
JC – Depois de toda a relação que Lula construiu com as centrais sindicais – sobretudo a majoritária CUT – a ponto de serem chamadas de “chapa branca”, a aprovação do projeto do novo fundo de aposentadoria complementar indica que essa relação mudou?
Marco Aurélio Santana – Era esperado que a relação de Dilma com os sindicatos se desse de forma diferente da desenvolvida por Lula. Por perfil, trajetória e personalidade, Lula transitava tranquilamente entre aqueles que, um dia, foram seus pares. Ele, como é notório, é fruto do meio político-sindical. Dilma vem de outra trajetória política e o seu ângulo mais técnico indica uma outra forma de relacionamento. Devemos lembrar que mesmo Lula, por vezes, chegou às rusgas com os sindicalistas, mesmo os da CUT, fazendo-lhes duras críticas, apesar de sua aproximação. Não creio que o rompimento se dê assim de forma tão imediata. Até duvido que ele se dê. E aí, não de trata só de nomes e pessoas, mas de política.
JC – As principais centrais sindicais apoiaram a eleição de Dilma Rousseff em 2010. Mas reclamam que a presidente não demonstrou consideração pelo movimento sindical, como fazia Lula. Ela corre o risco de perder o apoio do setor?
Marco Aurélio – A CUT, embora não tenha de aceitar tudo, tem boa parte de responsabilidade por estes governos. Seus membros trabalharam muito, por anos, para que este projeto de governo se instalasse. Não sei se por este ou aquele ponto divergente, se proporia uma ruptura com o projeto como um todo. Já ocorreram tensões até entre o PT e a CUT antes. Mas, claro, o rompimento pode vir, sim. Como em qualquer processo de aliança política. Faz parte do cenário.
JC – O que o senhor pensa desse projeto do fundo de aposentadoria complementar? Faltou debate com os setores interessados?
Marco Aurélio – A tensão quanto ao Fundo de Aposentadoria Complementar se dá em termos de forma e conteúdo do projeto. Já era mais que esperada alguma forma de intervenção deste governo no plano da previdência. Mas, poderia-se esperar também que tal projeto pudesse ter vindo acompanhado de um debate mais amplo e profundo. Aí, inclusive, se poderia ter produzido uma diferença substancial em relação aos projetos anteriores. Não foi o que ocorreu. Além disso, o governo Lula promoveu uma recomposição necessária na máquina pública que havia sido dilapidada. E, como circula, a ser verdade que se está segurando as contratações dos já concursados até a aprovação do projeto, se é, para alguns, tecnicamente justificado, política e socialmente é danoso.
FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)
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