quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Jogo dos muitos erros - Míriam Leitão

Num ano o governo não reajusta a gasolina porque tem eleição; no seguinte, porque a inflação subiu; no terceiro ano, porque tem eleição. Como a democracia veio para ficar, e nela vota-se com frequência, o governo deve deixar a economia fora disso. A importação de gasolina, em dólares, aumentou 374% no primeiro semestre, a Petrobras teve prejuízo, e o setor de etanol está desorganizado.

Os efeitos colaterais da decisão do governo de manter o preço artificial da gasolina estão se acumulando. Os dados da ANP mostram que de janeiro a junho foram gastos US$ 1,56 bi com a importação do produto, quase o mesmo valor importado em todo o ano de 2011. A exportação caiu 60% e foi de apenas US$ 48 milhões. Veja o gráfico. Aconteceu o mesmo com o óleo diesel: as exportações caíram 50% no primeiro semestre, enquanto as importações subiram 30%. A balança comercial do produto ficou negativa em US$ 3,5 bi. Em 2011, fechou no vermelho em US$ 7 bi.

Os números mostram a completa falta de sentido da política de combustíveis. A Petrobras compra lá fora por um preço mais alto do que vende aqui dentro, tem prejuízo e incentiva o consumo de combustível fóssil.

O mérito da presidente da Petrobras, Graça Foster, foi falar com sinceridade. José Sérgio Gabrielli sempre alegava que não iria repassar a volatilidade. Não era isso, tanto que os outros preços, como os de querosene de aviação e de gás para a indústria eram - e são - reajustados mensalmente. Graça admitiu que a defasagem no preço do diesel ainda está em 20,6%. Na gasolina, a diferença é de 18,1%.

O desequilíbrio no mercado de óleo diesel é antigo. As importações do produto já haviam disparado em 2006 e 2007 e só interromperam a trajetória de alta por causa da crise financeira de 2008, que levou a economia brasileira à recessão. Tanto o governo quanto a Petrobras tiveram tempo para mudar esse cenário.

Não mudaram e ainda entraram em outras decisões controversas, como a construção da refinaria Abreu e Lima, projetada para ser feita pela Petrobras e PDVSA e para processar petróleo venezuelano. A Petrobras banca tudo sozinha e o custo da obra deu um salto mortal: de US$ 4 bilhões para US$ 26 bi. Além disso, está atrasada.

O governo incentivou a compra de carro, segurou o preço do combustível e atrasou investimento em infraestrutura. Isso elevou a importação de gasolina e diesel, o que traz o prejuízo para a Petrobras. A indústria do etanol, sem horizontes, encolheu os investimentos. No ano passado, o país importou um bilhão de litros de álcool, e a ideia era que o Brasil virasse exportador.

Na mudança para o diesel com menos enxofre o governo errou também. Nos outros países o S50 substituiu o diesel velho. No Brasil, depois de adiar por vários anos a adoção do combustível menos poluente, a política foi manter os dois produtos. Como o novo custa 5% a 6% mais caro, toda a frota antiga usa o velho. Os postos de gasolina investiram na estrutura para o novo combustível - 2.800 postos estão com o produto - mas as vendas do S50 são de apenas 6% do total. As montadoras não estão conseguindo vender os novos modelos de caminhões e ônibus porque ninguém quer pagar mais pelo combustível tendo a opção do produto sujo e mais barato.

Poucas vezes se viu uma política que provoca tantos equívocos ao mesmo tempo.

FONTE: O GLOBO

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