domingo, 14 de dezembro de 2014

Luiz Carlos Azedo -Plataformas à matroca

• Parece que tudo na Petrobras foi varrido para debaixo do tapete. A cada denúncia, a resposta padrão da cúpula da estatal passou a ser “nada foi apurado”

Correio Braziliense

Manuais de gerenciamento de crise estabelecem como regra de ouro a necessidade de manter os serviços básicos funcionando por maior que seja a turbulência a ser enfrentada. É famoso o exemplo do leiteiro de Londres que garantia o fornecimento de leite às crianças nos abrigos durante os bombardeios alemães. Para que a população não se sentisse abandonada e deixasse a capital britânica, o primeiro-ministro Winston Churchill chegou a estatizar os serviços básicos de abastecimento para que não faltasse alimentação nos abrigos antiaéreos.

Nos momentos mais críticos das crises, causadas por motivos internos ou externos, o pior dos mundos é quando ocorre um colapso no funcionamento de organização, o que pode vir a comprometer a própria existência futura. Uma empresa de petróleo, considerado o melhor negócio do mundo mesmo quando mal administrado — como acontece com a Petrobras —, dificilmente corre o risco de desaparecer. A não ser que se esgotem seus poços de petróleo.

É aí que a situação da Petrobras, abalada pelos escândalos revelados pela Operação Lava-Jato, tornou-se ainda mais crítica. Além da crise interna, agravaram-se as “externalidades negativas”. Vão das investigações e ações contra a empresa em curso nos Estados Unidos à queda dos preços do petróleo, provocada pelo aumento da exploração de gás, o que torna antieconômica no curto prazo a exploração da camada pré-sal em águas mais profundas.

É do beabá de gerenciamento de crise o levantamento de riscos e o monitoramento de ameaças. Parece que nada disso foi feito pela atual diretoria, que a cada dia é surpreendida por uma notícia negativa. Não são apenas os líderes de oposição, como o deputado Rubem Bueno (PPS-PR) na sexta-feira, e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, logo no começo da semana, que pedem a mudança de toda a diretoria da empresa. Até o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pressiona a presidente Dilma Rousseff para jogar a carga ao mar e tentar restabelecer a credibilidade da empresa.

Mentiras
A Petrobras está como uma plataforma de exploração de petróleo à matroca, cujas âncoras foram à garra e segura apenas pelos dutos dos poços, que estão em águas profundas e ameaçam se romper, causando um desastre ambiental de proporções oceânicas. Os fornecedores da empresa estão sem receber, a indústria naval corre risco de colapso, os bancos já não financiam as operações. E as empreiteiras que contratou, as grandes vilãs da crise, no mínimo, estão ameaçadas de interromper as atividades por razões legais e financeiras.

Com o filme queimado por financiar o maior esquema de corrupção política de que se tem conhecimento no mundo, a empresa tem dificuldades de caixa. Já andava mal por causa dos subsídios aos combustíveis com objetivo de segurar a inflação. As ações não param de cair e ameaçam a saúde dos fundos de pensão. Sua dívida de US$ 110 bilhões compromete um terço das reservas cambiais do país. Para Dilma Rousseff, porém, não há razão para afastar os diretores da empresa, em especial sua amiga Graça Foster, que comanda a companhia.

Parece haver uma queda de braços entre a presidente da República recém-reeleita e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para ver quem pisca primeiro. Além do ex-diretor Renato Duque, que chegou a ser preso durante a Operação Lava-Jato, dois outros personagens que podem ser tragados pela crise, o ex-presidente Sérgio Gabrielli, e o atual tesoureiro do PT, João Vaccari, são notoriamente ligados ao petista. Nunca foram, porém, das relações de Dilma Rousseff, que parece aguardar novos desdobramentos do escândalo para decidir o que fazer.

Ocorre que mentira precisa de cúmplices. Outra regra de ouro de gerenciamento de crise é não mentir. Numa conversa em off com cinco jornalistas logo após assumir o mandato, Dilma Rousseff disse que conhecia os ralos da administração e pretendia fechá-los. Foi o recado do que viria a ser a faxina que tentou realizar no começo do atual governo. A troca de Gabrielli por Graça Foster fez parte dessa operação, mas parece que tudo na Petrobras foi varrido para debaixo do tapete, com a interrupção da faxina. A cada denúncia, a resposta padrão da cúpula da estatal passou a ser “nada foi apurado”. O resultado está aí.

Na sexta-feira, reportagem do jornal Valor Econômico revelou que Graça Foster sabia sobre as irregularidades que estavam ocorrendo na empresa. As advertências à cúpula da Petrobras foram feitas pela ex-gerente executiva da Diretoria de Refino e Abastecimento da empresa Venina Velosa da Fonseca. Antiga subordinada do ex-diretor Paulo Roberto Costa, ela foi transferida para a Ásia após denunciar o esquema de corrupção e, posteriormente, foi afastada. De Cingapura fez novas denúncias sobre superfaturamento em operações internacionais. Resultado: foi ameaçada e defenestrada do cargo.

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