Cármen Lúcia: qualquer censura é inconstitucional
• Ministra do STF diz que Marco Regulatório pode ser "forma camuflada" de restringir a liberdade
André de Souza – O Globo
BRASÍLIA e RIO - A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia repudiou ontem qualquer tentativa de restringir a liberdade de expressão, mesmo que de forma camuflada. Segundo ela, medidas desse tipo não passam de censura e serão consideradas inconstitucionais. Cármen Lúcia participou da abertura do 7º Fórum Liberdade de Imprensa & Democracia, realizado em Brasília.
No Rio de Janeiro, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) promoveu uma série de debates para celebrar o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. No ato, o ministro Edinho Silva (Comunicação Social) também falou sobre a importância dos profissionais de imprensa para a consolidação da democracia brasileira.
Em Brasília, Cármen Lúcia citou a Constituição para marcar sua posição sobre o assunto:
- A Constituição brasileira é taxativa. Não se tolera censura no Brasil. Qualquer marco que de alguma forma possa restringir ou ser uma forma camuflada de censura será considerada inconstitucional - afirmou a ministra.
Em outro momento, ela disse que deve partir dos jornalistas o consenso sobre um eventual marco regulatório sobre o tema. Mas destacou que, muita vezes, a expressão "marco regulatório" é usada apenas para camuflar uma tentativa de censura.
- O que se chama às vezes de marco regulatório acabam sendo formas camufladas de censuras, e isso não privilegia em nada a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e principalmente o pluralismo político de uma sociedade multidiversificada como é a brasileira. Mas, se os jornalistas chegarem a um consenso sobre isso, eu acho que o papel é muito mais dos senhores. A nós juízes, vai competir apenas, posto isso como necessário para dar densidade àquela norma constitucional, se não frustrou outro direito - disse Cármen Lúcia.
Ela destacou ainda a interdependência entre democracia e imprensa livre:
- Não há democracia sem imprensa livre, e não há imprensa livre sem democracia. Dito de outra forma, a opressão não tolera a imprensa. Ponto.
O presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Daniel Slaviero, também criticou um marco regulatório da mídia, mesmo que restrito à esfera econômica. Segundo ele, não tem como garantir que isso não vá afetar a liberdade de imprensa.
- O que eles (o governo) querem dizer (com regulação econômica)? Ainda não está claro. O que não dá para dissociar, para achar é que uma regulação econômica não pode atingir a liberdade de imprensa - disse Slaviero.
2014, um ano violento
O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, mais conhecido como Kakay, criticou a forma como a imprensa cobre julgamentos de grande repercussão. Kakay representou, por exemplo, o publicitário Duda Mendonça no julgamento do mensalão no STF. Ele também defendeu o doleiro Alberto Youssef nos processos da Operação Lava-Jato, que investiga principalmente irregularidades na Petrobras. Ele saiu do caso após o doleiro concordar em fazer um acordo de delação premiada para colaborar com a Justiça em troca da redução da pena.
- Defendo pessoas que são massacradas pela mídia, que acusa, julga e condena. A defesa normalmente não aparece, mas faz quase um ciclo completo de um julgamento. E essas pessoas, quando têm a superexposição e são absolvidas, a regra é que elas sequer apareçam - afirmou.
O evento, realizado pela Imprensa Editorial e patrocinado pelo Grupo Globo, tem o apoio da Imprensa Nacional, da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Abert, Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner), ABI, Agência Radioweb, Associação Nacional de Jornais (ANJ) e Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj).
No ato da ABI, no Rio, o ministro Edinho Silva defendeu a imprensa de forma taxativa:
-Não existe democracia sem liberdade de imprensa, sem liberdade de expressão. Não existe democracia sem que, efetivamente, a sociedade possa manifestar aquilo que ela pensa, aquilo que ela sente, aquilo que ela entende como opinião, como capacidade de criação, como capacidade de formulação de suas ideias. E não existe liberdade de imprensa sem profissionais de comunicação.
Os casos de ameaça e de assassinatos, como o do jornalista Tim Lopes, da TV Globo, em junho de 2002, e do cinegrafista da TV Bandeirantes, Santiago Andrade, em fevereiro do ano passado, foram lembrados na palestra.
- O ano de 2014 foi um dos mais violentos na história da imprensa contemporânea - afirmou o presidente da ABI, Domingos Meirelles. - Uma ONG chamada Artigo 19 contabiliza 15 assassinatos só em 2014, entre jornalistas, radialistas e blogueiros. Quem perde é o país.
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