Tem razão o vice-presidente Michel Temer quando tenta minimizar a repercussão das declarações de Dilma Rousseff sobre o “golpismo” por detrás da possibilidade de impeachment e faz um apelo à “unidade nacional” que se impõe para superar a presente crise. Na manhã de quarta-feira, no exercício da chefia interina do governo devido à viagem da titular à Rússia e à Itália, Temer foi categórico: “Não devemos discutir esse tema (golpe). A oposição existe também para ajudar a governar, mesmo quando critica. Temos que fazer uma grande unidade nacional. Mais do que nunca é necessário o pensamento conjugado dos vários setores da nacionalidade”.
Feito o desconto para o fato de que se encontra na posição de eventual beneficiário de um desdobramento da crise que envolva o afastamento de Dilma, a observação de Michel Temer é pertinente, na medida em que coloca em foco uma questão que está acima das conveniências transitórias de partidos ou lideranças políticas: a governabilidade indispensável à preservação dos interesses “dos vários setores da nacionalidade”, ou seja, do conjunto da sociedade brasileira.
Está implícita na declaração de Temer o repúdio à tese do “golpismo”, usada por Dilma para se fazer de vítima e pelo PT para exercitar o ataque como melhor defesa. Afinal, nunca é demais repetir, a possibilidade de afastamento da presidente da República não é a causa da atual crise, mas simplesmente sua consequência natural no campo político. O governo colocou o País no buraco em que se encontra. É natural, portanto, a hipótese de mudança de governo, uma medida extrema no regime presidencialista, mas perfeitamente legítima se observadas as normas constitucionais. O fato de apenas 9% dos brasileiros aprovarem o governo Dilma, se não é justificativa legal para seu afastamento, pelo menos cria condições sociopolíticas favoráveis para o encaminhamento constitucional dessa medida extrema. Num regime parlamentarista a troca de governo já teria acontecido naturalmente.
Justiça seja feita ao vice-presidente da República, ele tem feito o possível para conciliar o que a cada dia parece mais impraticável: a lealdade devida a Dilma Rousseff como seu aliado, com os interesses políticos de seu PMDB, o maior partido da base de apoio ao governo, do qual é presidente honorário. É fácil de imaginar a enorme capacidade de contemporização e de engolir sapos que se exige de quem se associa a um partido no poder que prima pela soberba e o desdém pelos aliados. O indisfarçável boicote do PT e de ministros de Estado ao papel de articulador político atribuído a Temer por uma presidente da República em desespero é uma demonstração eloquente do alto preço imposto aos partidos aliados do governo pelas benesses decorrentes do compartilhamento do poder – que no caso do PMDB, à frente de seis Ministérios, não são nada desprezíveis.
A difícil quadra da vida nacional, no entanto, impõe às lideranças políticas sacrifícios e a capacidade de olhar para a frente em busca dos caminhos da prosperidade econômica e social que os atuais responsáveis pelos destinos do País deixaram escapar por entre os dedos. E, dessa perspectiva, a responsabilidade – ou a culpa – de Michel Temer e de seu partido pelo que acontece pode ser considerada menor apenas do que aquela que cabe ao PT e seus hoje desmoralizados salvadores da Pátria. Os peemedebistas assistiram complacentemente, já a partir do segundo mandato de Lula, à irresponsável guinada em direção à pesada intervenção do Estado na vida econômica que está na raiz de todos os males que hoje assombram o País.
De qualquer modo, na medida em que se coloca com a genuína disposição de usar da influência política que tem para favorecer a “grande unidade nacional” necessária a recolocar o Brasil nos trilhos da normalidade política, econômica e social, Michel Temer presta um bom serviço ao País. Especialmente se tiver a capacidade de neutralizar a preocupante tendência de representantes do PMDB de se alinharem no Congresso a favor de propostas legislativas retrógradas embaladas pelo radicalismo de direita e pelo fundamentalismo religioso.
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