• País não pode se contentar apenas com a arrumação das contas públicas; é preciso oferecer ao Brasil uma nova agenda de desenvolvimento
Não há como dourar a pílula. A crise política e econômica é das mais graves, e as incertezas quanto aos seus desdobramentos provocam desânimo adicional em investidores e consumidores. Um ciclo vicioso que asfixia o país.
Embora as circunstâncias tornem mais difícil a tarefa de distinguir ruídos breves das tendências e oportunidades duradouras, é urgente encontrar caminhos capazes de dar maior envergadura às expectativas nacionais. É crucial identificar uma nova agenda de desenvolvimento para o Brasil.
Se um quadro como o atual não se desenha com apenas um erro, nenhum traçado estará completo se não levar em conta um equívoco decisivo: o diagnóstico que o governo Dilma Rousseff (PT) fez a respeito das mudanças no panorama internacional a partir de 2011.
Para o país, o principal não era o baixo crescimento das nações ricas, mas o movimento de redução dos preços das matérias-primas. O buraco nas transações com o restante do mundo cresceu e atingiu 4,5% do PIB em 2013 e 2014.
No ambiente doméstico, o impacto interno esperado era o esgotamento do empuxo de consumo financiado por transferências governamentais e crédito facilitado.
O fim dessa dinâmica observada na década passada demandava uma gestão diferente na economia, mais direcionada para o crescimento da produtividade e menos fundada nas benesses oficiais.
A presidente Dilma, no entanto, resumiu seu primeiro mandato a uma tentativa de resistir a essa orientação. Aplicou o que imaginava ser um remédio: gastos públicos crescentes, intervenções setoriais e leniência com a inflação.
Tratava-se de veneno, contudo. Os sintomas não tardaram: PIB estagnado ou encolhendo e inflação sempre elevada. O desemprego até se manteve baixo por um tempo, mas à custa de desequilíbrios crescentes que agora cobram a fatura.
Como se a dose já não fosse suficientemente alta, o estelionato eleitoral torna a recuperação mais tormentosa. A sociedade brasileira não foi preparada para a mudança de rumo. Sem credibilidade, Dilma tornou-se refém da conjuntura.
Pelo menos no curto prazo, o rumo é claro. Não há alternativa a não ser persistir na arrumação das contas e no controle da inflação.
A situação das finanças é a mais complexa. Em quatro anos, um superavit primário (saldo das receitas e despesas antes do pagamento dos juros) de 3% do PIB se transformou em deficit de 1,5%.
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tenta voltar ao azul e atingir até 2016 um saldo de 2% do PIB, o mínimo necessário para estabilizar a dívida. A recessão e a irresponsabilidade do Congresso, porém, tornam o aperto mais difícil.
Na batalha da inflação, o Banco Central deve sair-se vitorioso --aliás, corre o risco de exagerar na artilharia--, tendo em vista a contração da economia, que ajustará salários e empregos.
Como resultado, a inflação deve cair em breve e abrir espaço para um ciclo de cortes de juros --a taxa Selic, que chegou a 7,25% em 2012, hoje está em 13,75%.
Mas é preciso ir além do ajuste e construir uma estratégia de longo prazo. Depois de esgotado o ciclo do consumo, que não criou --nem poderia-- condições perenes de crescimento, quais podem ser os novos vetores de dinamismo? Há pelo menos dois candidatos.
Um deles é a indústria, o setor mais prejudicado nos últimos anos --a produção manufatureira regrediu ao nível de 2006.
A atual combinação de câmbio desvalorizado com menores pressões salariais pode aos poucos abrir nova perspectiva. Para aproveitá-la, será preciso formar consenso em torno de maior abertura econômica e integração comercial com as cadeias mundiais de produção, além de simplificar os tributos que mais oneram a produção, como PIS/Cofins e ICMS.
É uma agenda para vários anos, mas que precisa começar o quanto antes. Há, felizmente, sinais favoráveis tanto na orientação menos protecionista de empresários como na aparente disposição do governo de buscar acordos comerciais.
Outro vetor possível é a infraestrutura. Verdade que o horizonte próximo parece comprometido em decorrência da Operação Lava Jato. Mas o país tem um deficit de investimento de 3% do PIB ao ano que precisará ser coberto. O novo plano de concessões do governo dá conta de 10% das necessidades até 2018. É um início viável.
Se for possível reestabelecer os marcos de regulação e destravar a burocracia, haverá financiamento privado para cumprir essa etapa e preparar o país para saltos maiores.
Indústria e infraestrutura, ademais, têm potencial para dinamizar a produtividade e a geração de empregos de qualidade.
Não se trata de agenda simples, sobretudo porque mobilizar forças produtivas e sociais para a nova etapa de expansão econômica depende de liderança política --um recurso escasso no mercado brasileiro.
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