• Aliados da presidente vêm sendo acusados de improbidade administrativa
Janaína Figueiredo - O Globo
BUENOS AIRES - Na Argentina, analistas políticos e jornalistas costumam dizer que, quando um governo perde poder ou está próximo de terminar, a Justiça começa a cercá-lo por todos os lados. Isso é exatamente o que está acontecendo com o governo da presidente Cristina Kirchner, que, nos últimos dias, foi alvo de vários procedimentos e decisões judiciais desfavoráveis.
Na mesma semana, o juiz federal Claudio Bonadio ordenou uma devassa no Banco Central, suspeito de estar realizando manobras ilegais no mercado cambial, e processou o diretor do Pami (o INSS local), Luciano Di Cesare, por improbidade administrativa. A sala II da Câmara Federal declarou inconstitucional uma lei de 2006 que reduziu o número de membros do Conselho da Magistratura (órgão encarregado de designar e punir juízes).
Além disso, o juiz federal Norberto Oyarbide absolveu 65 militares e civis denunciados pela ex-ministra da Defesa Nilda Garré, em 2008, por suposta corrupção.
— Existe uma relação inversamente proporcional entre a velocidade da Justiça e o poder — disse o jurista Andrés Gil Domínguez. — Quanto mais poder, mais lenta é a Justiça, e vice-versa.
Para ele, “o Judiciário vai atuar nos próximos meses e muitas autoridades serão vistas caminhando pelos tribunais, talvez a própria Cristina”, envolvida em processos sobre lavagem de dinheiro que, segundo denúncia da oposição, foi cometida pela sociedade Hotesur, da família presidencial, que administra hotéis de luxo.
— Todos deverão dar explicações, a presidente também, e não terão mais proteção — enfatizou Gil Domínguez.
Durante toda a campanha, o candidato da aliança opositora Mudemos, o prefeito portenho, Mauricio Macri, assegurou que, em seu eventual governo, “não haverá impunidade para ninguém”. Existe uma preocupação no governo kirchnerista de que o vice-presidente Amado Boudou seja processado por corrupção.
Reação na Internet
A ofensiva da Justiça foi questionada publicamente pela presidente, que referiu-se, através de sua conta no Twitter, às ações do juiz Bonadio no BC. “É a única coisa que falta judicializar na Argentina, o dólar e a política monetária”. A presidente questionou a decisão do juiz de realizar o procedimento na instituição com agentes da Polícia Metropolitana, criada e comandada pelo governo do prefeito portenho. “Talvez a desvalorização que Macri não se atreve a falar… ele pretende fazer pela via judicial”, disse Cristina.
Bonadio tem em mãos uma denúncia apresentada por dirigentes da Mudemos, que acusaram o presidente do BC, Alejandro Vanoli, de estar cometendo irregularidades em operações de venda de dólares a futuro.
— Não posso fechar os tribunais porque estamos perto de uma eleição — argumentou o juiz.
O processo contra o diretor do Pami está avançado. Di Cesare foi acusado de desviar 14 bilhões de pesos (cerca de US$ 1,5 bilhão) dos fundos do organismo, para comprar, entre 2008 e 2012, letras do Tesouro e financiar o governo kirchnerista.
Outro caso conduzido por Bonadio é ligado a denúncias sobre irregularidades num plano social de ajuda a mulheres grávidas, o programa “Bercinho”. O juiz investiga se o governo pagou preços superfaturados pelos kits entregues às beneficiárias do programa.
A decisão da sala II da Câmara Federal sobre a lei que, em 2006, reduziu de 20 para 13 o número de membros do Conselho da Magistratura também preocupa a Casa Rosada. A mudança foi proposta por Cristina quando ainda era senadora e, segundo juristas, afetou o equilíbrio da instituição.
— O Poder Executivo chegou até onde chegou porque o Judiciário não lhe impôs os limites devidos — opinou o advogado Guillermo Lipera, um dos que elaboraram a denúncia.
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