• Manobras para retardar os trabalhos do Conselho de Ética ultrapassam tudo o que já se viu no Congresso, nos últimos tempos, em desfaçatez e desrespeito
O Congresso já assistiu a muitas manobras e chicanas de parlamentares na tentativa de escapar de punições. As mais comuns eram a fuga pela porta dos fundos da renúncia, para o retorno nas eleições seguintes, por meio de votos ordenhados, geralmente, pelo assistencialismo. A Lei da Ficha Limpa revogou de vez a malandragem.
Mas o arsenal à disposição desse tipo de esquiva continua farto, principalmente se for manipulado por um presidente da Câmara e se ele se chamar Eduardo Cunha (PMDB-RJ), conhecido pela ousadia e falta de medidas.
O que o deputado tem feito para retardar ao máximo a tramitação de processo contra ele no Conselho de Ética da Casa ultrapassa tudo o que se viu neste campo no Congresso, nos últimos tempos, em desfaçatez e em desrespeito ao próprio Legislativo e à inteligência alheia.
Indicado por “colaborações premiadas” de acusados na Operação Lava-Jato de ser beneficiário de propinas pagas pela Petrobras no esquema do petrolão, Cunha afastou as denúncias — normal —, mas passou a usar poderes do presidente da Casa para se defender.
Confirmada a existência de contas na Suíça não declaradas à Receita, do deputado, mulher e filha, Cunha foi formalmente acusado no Conselho de Ética. Pois garantira à CPI da Petrobras, instalada sob sua inspiração para barganhar apoio do governo Dilma e PT — vê-se hoje claramente —, que jamais tivera contas no exterior. Perjúrio, portanto. Logo, quebra de decoro.
Já com o nome encaminhado ao Supremo pela Procuradoria-Geral da República, o deputado não desiste. Depois de uma explicação nada crível do deputado para as contas suíças, Cunha e aliados ultrapassaram todos os limites, quinta-feira, para evitar que o Conselho ouvisse a leitura do relatório do deputado Fausto Pinato (PRB-SP). O plano é empurrar qualquer decisão do Conselho para 2016. Nisso, vale tudo. Eduardo Cunha chegou a abrir uma sessão no plenário da Casa mais cedo que o normal, para impedir os trabalhos no Conselho de Ética (segundo o regimento, comissões param de funcionar enquanto há sessões plenárias).
Até um ministro do Supremo, Marco Aurélio Mello, defendeu a renúncia de Eduardo Cunha. Mas a trincheira cavada por ele é eclética. O PT, já há algum tempo protetor do presidente da Câmara para que ele não despache algum processo de impeachment contra Dilma, participou das manobras de quinta-feira para sabotar o Conselho de Ética. Também o PSDB, no passado, e por motivo oposto ao do PT — quer o início da tramitação do impeachment —, fingiu nada haver contra Eduardo Cunha.
É imprevisível o desfecho desse circo de barganhas. Só não se discute que o deputado não tem condições de continuar a presidir a Casa, e que tudo isso prejudica a imagem da política e da própria democracia representativa. Não precisava ser assim.
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