• O carnaval não é refresco para os descalabros econômicos e políticos que assombram o Brasil
- The Economist / O Estado de S. Paulo
Janeiro é um mês morto no Brasil. Tirando a agitação dos ensaios das escolas de samba, que se preparam para seus desfiles cheios de luxo e libertinagem, o País para e os brasileiros curtem férias no verão escaldante do Hemisfério Sul. Diminui o número de carros atravancando as ruas; aumenta o número de corpos seminus refestelando-se nas praias.
Os políticos geralmente fazem como todo mundo e ficam de papo para o ar. Embora o recesso parlamentar termine em 2 de fevereiro, dificilmente os congressistas retomarão suas atividades antes da Quarta-feira de Cinzas. Apesar disso, nem eles nem a presidente Dilma Rousseff poderão relaxar. Um surto do assustador zika vírus colocou as autoridades área da saúde em estado de alerta. Nesse meio tempo, aprofundam-se as mazelas políticas e econômicas do País. Quando voltarem ao trabalho, os políticos talvez se arrependam do tempo que tiraram para descansar, em vez de se dedicar a enfrentá-las.
A economia continua a andar para trás. O número de postos de trabalho fechados no setor formal chegou a 1,5 milhão em 2015, com as demissões seguindo o ritmo mais acelerado desde o início da série histórica, em 1992. E analistas dizem que a economia corre o risco de perder mais 1 milhão de empregos este ano. As vendas de automóveis sofreram queda de 20% em 2015. O Fundo Monetário Internacional (FMI), que em outubro projetava uma retração de 1% para a economia brasileira em 2016, agora diz que o PIB do País encolherá 3,5%. Apesar da recessão, a inflação está em quase 11%, nível mais alto desde 2002.
Em comparação com crises anteriores, quando os principais afetados pelo desemprego eram mulheres e jovens, há uma proporção maior de pais de família no contingente de novos desempregados, observa Naercio Menezes, do Insper. Isso significa que as dificuldades causadas pela recessão atual serão maiores. Para os relativamente jovens, ficar sem emprego é novidade. Muitos ingressaram no mercado formal de trabalho durante o boom de commodities, que se estendeu de 2003 a 2013. Ninguém sabe como eles reagirão aos tempos de adversidade, alerta o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Lava Jato. O agravamento da crise vem acompanhado da diminuição na margem de manobra do governo para atacar suas causas. Os procuradores que integram a força-tarefa da Operação Lava Jato devem apresentar denúncia contra figuras centrais do PT, cuja imagem, mesmo antes dos desdobramentos mais recentes, já havia sido prejudicada pelo escândalo de corrupção envolvendo contratos da Petrobrás. Para a presidente Dilma, uma preocupação ainda maior é o pedido de impeachment que corre na Câmara dos Deputados, baseado em alegações de que ela teria consentido com truques contábeis para ocultar o verdadeiro tamanho do déficit fiscal brasileiro.
Isso deixa o governo ainda mais dependente da boa vontade do PT e dos sindicatos alinhados com o partido, que se opõem visceralmente às reformas necessárias à estabilização da economia. No início do mês, Dilma se atreveu a reconhecer que os brasileiros se aposentam muito cedo (aos 55 anos, em média, no caso dos homens), chegando mesmo a admitir que o governo não conseguirá equilibrar as contas públicas enquanto continuar destinando 40% de seus gastos (excluído o serviço da dívida) ao pagamento das pensões da Previdência Social. Mas, diante da resistência de seu partido e dos sindicatos, a presidente voltou atrás. Aumentar a idade mínima para a aposentadoria é inaceitável, anunciou o PT esta semana.
Para o recém-nomeado ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, isso tornará ainda mais árdua a tarefa de conter o déficit orçamentário, que se aproxima de 10% do PIB. A principal ideia de Barbosa é reintroduzir a CPMF, detestada pelos empresários, mas popular entre os aliados de esquerda da presidente. Acontece que o imposto deve gerar somente R$ 10 bilhões em receitas adicionais, ao passo que o endividamento líquido do governo provavelmente chegará a R$ 500 bilhões este ano. Dilma diz que a reativação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão, desmobilizado em seu primeiro mandato, ajudará o governo a encontrar soluções para a crise. Parece mais uma tática diversionista.
Política monetária. Não bastassem os problemas da política fiscal, os economistas começam a se preocupar também com a política monetária. Depois de passar várias semanas dando indicações de que iria elevar os juros para combater a inflação, o Banco Central (BC) decidiu, em reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), realizada no dia 20, manter sua taxa básica em 14,25%. A decisão pode até ter sido justificável: uma alta dos juros esfriaria ainda mais a economia e prejudicaria o esforço fiscal. Mas a impressão que ficou foi a de que se tratou de uma capitulação a pressões políticas. Dois dias antes da reunião do Copom, o presidente do BC, Alexandre Tombini, esteve com Dilma. Na ocasião, Tombini deu pistas de que planejava uma reviravolta na política monetária, aludindo à deterioração das projeções do FMI para o crescimento do Brasil e da economia mundial, coisa que naquela altura já não era surpresa para ninguém. A atitude, em vez de fortalecer a credibilidade financeira do Brasil, deixou-a ainda mais abalada.
É pouco provável que, retornando ao trabalho, os congressistas tomem decisões que restaurem essa credibilidade. Em reservado, os defensores do impeachment de Dilma admitem que dificilmente reunirão a maioria de dois terços dos deputados necessária para enviar a moção ao Senado. Mas pretendem fazer com que a tramitação se arraste pelo tempo que os (vagos) prazos legais permitirem. Atingirão seu objetivo enfraquecendo a presidente. Não que isso melhore as perspectivas do Brasil.
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