Com o Congresso em recesso, política partidária dará trégua
A depender de acordos de delação fechados entre o Ministério Público, a Polícia Federal e acusados na Operação Lava-Jato, nas próximas duas semanas a economia voltará ao centro dos debates. A política partidária dará uma trégua, graças ao esvaziamento do Congresso, que entra em recesso amanhã. Os parlamentares retomam os trabalhos em 1º de agosto.
Abre-se, portanto, uma "janela de oportunidade", no jargão do mercado, para abordagem de outras questões também relevantes ao futuro do país - ainda que esse futuro esteja umbilicalmente ligado às forças políticas patrocinadoras do próximo presidente da República. Questões políticas, jurídicas e policiais dominam fortemente o interesse e as discussões dos brasileiros há um mês, desde a delação dos irmãos Batista, controladores da JBS, que destacou o presidente Michel Temer na Operação Lava-Jato como um político, mais um, que supostamente teria recebido propina em troca de facilidades no governo.
O início do processo que determinará se o Supremo Tribunal Federal (STF) poderá ou não investigar o presidente pelo crime de corrupção passiva, a partir da denúncia atada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), instalou de vez Michel Temer no foco do mercado financeiro. A sessão plenária para a votação da denúncia está marcada para 2 de agosto. Também em agosto, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deve apresentar mais duas denúncias contra o presidente, por corrupção passiva e obstrução à Justiça.
Até agosto novas informações poderão vir à tona e complicar ainda mais a situação de Temer, mas não só a dele. Eventuais acordos de delação premiada de três detidos da Lava-Jato provocam inquietação: Lúcio Funaro, Eduardo Cunha e Antônio Palocci. Os dois primeiros podem se tornar uma pedra no sapato do presidente da República, e Palocci no sapato do ex-presidente Lula.
De sexta-feira, antevéspera de o Congresso entrar em férias, até ontem cresceu o interesse de leitores do site do Valor por assuntos econômicos ou com repercussão econômica e empresariais. Destacam-se entre eles a minuta da medida provisória com mudanças que serão feitas no texto da Reforma Trabalhista, a perspectiva de o governo lançar algum tipo de ajuda às empresas sobretudo com linhas de crédito, a ampliação do Refis com desconto de até 99%, o resultado do Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) de maio (queda de 0,51% ante maio de 2016), a venda da Alpargatas pela J&F (holding dos irmãos Batista) por R$ 3,5 bilhões, o lançamento de plano de demissão voluntária pelo Bradesco.
Parte dos leitores migrou para um território mais familiar aos executivos de finanças e produção. "Voltar-se para questões objetivas, com menos atores envolvidos e mais compreensíveis a partir da combinação de dados, é decisão imperativa quando há pouca ou nenhuma margem para se cometer equívocos. É isso o que oferece uma economia que tombou 7,5% em dois anos", diz à coluna um analista de um grande banco brasileiro que prefere manter o anonimato.
Em entrevista à coluna, Nicola Tingas, economista-chefe da Acrefi, afirma que o setor empresarial não tem condições de suportar mais uma virada recessiva no Brasil. "Estamos vivendo em um ambiente com grande carga de imprevisibilidade e não de incerteza, porque se fosse assim poderia ser precificada, e os riscos são elevados. Não há mais lastro de capital para perdas que também seriam desastrosas para o país."
Neste momento de incerteza quanto à continuidade de Michel Temer na Presidência da República, principalmente o mercado financeiro defende e aposta na manutenção da equipe econômica por ter convicção de que ela dá credibilidade à agenda de reformas que não se esgotará em um único governo.
"A âncora hoje é a equipe econômica, e não a política. A questão que se coloca é como chegar até o destino", pondera Tingas. "Na travessia há duas variáveis a considerar. A primeira é o tempo disponível até o encerramento do atual mandato presidencial, porque não existe previsão ou sustentação para uma eleição direta ou para a convocação de uma eleição. O novo governo será conhecido de fato nas eleições. A segunda variável a considerar para chegar ao destino é a cisão entre a política e a atividade política que hoje está em baixa junto à sociedade. Há também um desgaste das instituições. Os três poderes são afetados por atitudes e medidas que estão sendo tomadas."
Para o economista da Acrefi, a perspectiva de que o país poderá ter um bom governo também traz a oportunidade de ingressar em um ciclo de retomada mais consistente e mais sustentável. "Mantida a direção correta é possível ganhar - tem avanços - em 2019. Isso vale para nós e também para os investidores estrangeiros, que devem sentir que podem se manter próximos ao Brasil, entrando e saindo, enquanto aguardam um novo governo para fazer investimentos mais fortes com um cenário definido. Há chance de o Brasil chegar a um cenário consistente. A baixa renda já não acredita em um governo salvador da pátria. Podemos esperar atitude da classe média depois de ver como o país é governado. O capital vê que é necessário emergir lideranças e elas só poderão emergir da classe empresarial, pois é ela a que está mais organizada. O sistema político eleitoral deverá passar por uma transição para um modelo mais sofisticado, mais desenvolvido"
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