Políticas afirmativas não podem desconsiderar a baixa qualidade do ensino brasileiro
A adoção do sistema de cotas pela Universidade de São Paulo (USP), o maior e mais bem ranqueado estabelecimento de ensino superior no país e situado entre os cem mais importantes do mundo —e, a depender do segmento, entre os dez —, é um troféu de peso para ilustrar a vitória política do movimento racialista, por conseguir importar este sistema dos Estados Unidos. Depois de muito debate na sociedade, o Supremo Tribunal o sancionou como constitucional. Mas a discussão continua.
Acompanhar, com rigor, a aplicação das cotas em centros de ensino ajudará na discussão. A Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), pioneira nesse sistema, cumpre o previsto e, completados os dez anos de estabelecimento dessa política afirmativa, é feita uma avaliação do método. Há resultados positivos: discrepâncias não muito grandes em relação a não cotistas, evasão alta (25%), mas inferior ao dos não beneficiários da política (37%).
A USP sempre resistiu às cotas, embora adotasse outras políticas afirmativas, para ampliar uma desejável diversidade social. Já havia mecanismos para a absorção de alunos de escolas públicas, oriundos de famílias de renda baixa. Agora, por maioria de votos do Conselho Universitário, a partir de 2018, de maneira escalonada, executará um programa que a levará, em 2021, a reservar metade das vagas a egressos do ensino médio da rede pública, dos quais 37,2% terão de ser negros, pardos e indígenas, em obediência à proporção deste segmento que há na população paulista. Resta continuar o debate e acompanhar de perto a experiência da USP.
As políticas afirmativas de cotas raciais têm suas raízes nos Estados Unidos, cuja sociedade se lastreou na noção de “raças”, ao contrário do Brasil. Aqui preto podia ter escravo, se alcançasse status social. Até negociá-los, como “senhor”.
Já que se deu o fato das cotas raciais, não se deve perder referenciais. Uma delas, que o Brasil avança na educação em geral, mas ainda está em séria crise neste campo, principalmente no ensino médio. O nível melhora, mas o aluno, na média, ainda chega sem base sólida à Universidade.
Basta acompanhar as avaliações, que continuam negativas, de brasileiros no teste internacional Pisa. A USP se destaca, assim como outras, quase sempre estabelecimentos públicos, mas o ensino universitário também deixa a desejar em comparações globais.
A avaliação das cotas precisa ser feita também por este ângulo. Ou seja, do ponto de vista da revolução educacional de que o Brasil precisa, o fato de o cotista ter um rendimento apenas pouco abaixo dos não cotistas pode gerar índices risonhos, mas não ajuda a resolver a questão de uma população mal preparada para enfrentar a concorrência globalizada. Porque o universo com o qual o cotista é comparado não serve de parâmetro de eficácia educacional. Nivela-se por baixo. Por isso, o melhor caminho da integração é mesmo um massivo programa de investimentos na educação básica, em favor de todos, brancos, pretos, pardos, indígenas, cafuzos, mulatos etc. Sem discriminações.
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