A prática recorrente das delações premiadas e o recurso indiscriminado à prisão preventiva parecem conferir às iniciativas contra a corrupção uma imagem de eficácia que, com o tempo, vai merecendo alguma qualificação.
Três meses talvez não constituam prazo suficiente para avaliar o curso de investigações necessariamente tão complexas quanto as que hoje envolvem boa parte da classe política nacional.
Não deixa de ser revelador, todavia, o relato das dificuldades enfrentadas pela Polícia Federal ao menos num caso, especialmente rumoroso, de delação premiada.
Segundo reportagem publicada por esta Folha, os depoimentos apresentados por executivos da construtora Odebrecht —naquilo que, à época, se chegou a qualificar como "delação do fim do mundo"— não foram acompanhados, até agora, de diligências e descobertas capazes de comprovar, ou não, as informações apresentadas.
A demora se faz particularmente incômoda porque, com o tom espetaculoso emprestado às acusações, todos os nomes listados já cumprem uma espécie de pena política, tamanho o desgaste a suas imagens públicas.
Oito ministros, 39 deputados e 24 senadores foram apontados como beneficiários de propina ou pagamentos suspeitos por parte da empreiteira. Dos que prestaram esclarecimentos à polícia, não houve quem admitisse malfeitos.
Solicita-se aos funcionários da Odebrecht que deem novos detalhes sobre o declarado; surgem respostas evasivas, narrações inconcludentes, redundâncias sem valor. Há outras maneiras, por certo, de investigar o que terá ocorrido.
Dados sobre a evolução patrimonial dos suspeitos, informes sobre a prestação de contas das campanhas eleitorais, registros de encontros nos gabinetes do Congresso —nada disso se obtém em pouco tempo, e com recursos limitados.
O prazo de 30 dias para tais diligências teve de ser prorrogado. Até agora, não se apresentou denúncia formal relativa ao inicialmente afirmado pelos delatores.
Não seria o caso, claro, de interromper o processo antes da elucidação de todos os fatos. É natural que haja ritmos diferentes em cada apuração, e que a notícia imediata desperte mais atenção do que a minúcia de seus desdobramentos.
O desequilíbrio entre uma e outra etapa não é, contudo, menos real, trazendo em si o risco de um uso desmesurado da delação como forma de investigar, sem que se chegue a aferir a própria verdade daquilo com que se acenou.
Nessa hipótese, corre-se o risco de reavivar a sensação de impunidade, depois do breve desvio pelo escândalo que ceifa reputações.
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