Há consenso na sociedade, no governo e no Congresso sobre a necessidade e urgência da reforma política. No entanto, a cada vez que o Senado e a Câmara dos Deputados se reúnem para tratar do assunto a discussão, em geral, termina em impasse. Aparentemente é o que está acontecendo com a nova tentativa em curso no Legislativo para enfim dotar o país de um sistema político e eleitoral duradouro, ou pelo menos este deveria ser o objetivo.
A atual rodada da reforma política padece do mesmo mal das que a antecederam: é feita de afogadilho, às vésperas das eleições gerais de 2018 e está contaminada pelo interesse eleitoral imediato de cada candidato e partido. A diferença da atual tentativa é que ela é emulada também pela proibição do financiamento privado das campanhas eleitorais. Os congressistas gostariam de primeiro acertar como as eleições serão financiadas para só depois definir o modelo político e eleitoral a ser adotado.
Não é a primeira vez que uma intervenção do Supremo Tribunal Federal (STF) na política, em que pese suas boas intenções, se revela um tiro pela culatra. Não faz muito tempo o STF derrubou a cláusula de barreira aprovada pelo Congresso para regular o funcionamento dos partidos políticos. Resumidamente, eles precisariam obter um determinado número de votos em um determinado número de Estados para assumir plenamente a representação no Congresso. Deu no que se vê: 35 partidos registrados, outra dezena a caminho e uma poluição de siglas que tornam o país ingovernável.
O Supremo agora proibiu o financiamento eleitoral e não sugeriu nem colocou nada no lugar. É fácil judicializar a política. O difícil é sair do labirinto judicial. Repartir a conta entre os contribuintes pareceu a saída mais fácil para os congressistas, mas tiveram de recuar diante da reação popular. Evidentemente a democracia tem custo, mas no caso específico o recuo parlamentar é bem-vindo: era o fundo de R$ 3,6 bilhões que definiria o modelo eleitoral para 2018 e não o contrário.
O distritão, ideia em discussão, além de reduzir a renovação, permite um quinhão maior para cada candidato; no atual sistema proporcional, o dinheiro será dividido por milhares de candidatos. Não é preciso ser adivinho para imaginar a tendência dos parlamentares. O problema continua do mesmo tamanho: como financiar as campanhas de 2018, visto que, do jeito que está, o sistema beneficia os candidatos já conhecidos, as celebridades, igrejas, o crime organizado e os milionários que podem arcar com a própria campanha, como ficou evidenciado nas eleições municipais de 2016.
Ao fim e ao cabo, é possível que volte o financiamento empresarial, iniciativa do PSDB que vem ganhando corpo no Senado. A maioria é a favor, o problema é que poucos querem assumir e defender publicamente essa posição. Há o receio dos deputados e senadores, também, de que as empresas prefiram passar ao largo da próxima campanha eleitoral. Gato escaldado tem medo da água fria.
Os problemas da atual rodada da reforma política são os mesmos que já abateram outras tentativas de uma reforma de verdade, ampla, capaz de dar consistência ideológica e programática aos partidos, combater a corrupção, assegurar o equilíbrio na disputa eleitoral e aproximar os representantes dos representados. O que se observa, no entanto, é uma tentativa estreita, movida em grande parte pelos interesses de cada partido na eleição de 2018 e por imposições do STF (financiamento público). Essa é uma prática regular do Congresso, desde a redemocratização: uma regra para cada eleição.
Melhor seria trocar o conjunto de casuísmos batizado na Câmara de reforma política, por algo mais realista, depurando o que já existe de modo a que se possa efetivamente avaliar virtudes e defeitos do atual modelo: o fim da coligação nas eleições proporcionais, o que desfigura a representação, e a criação da cláusula de barreira, para conter a proliferação das legendas de aluguel. Estima-se que em apenas duas ou três eleições o atual número de partidos na Câmara seria reduzido de 30 para algo em torno de seis ou sete agremiações.
A questão do financiamento deve ser resolvida num diálogo transparente com a sociedade. Pode ser uma solução provisória, é certo, mas o Congresso não pode fugir da responsabilidade de mais adiante dotar o país de regras políticas permanentes.
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