O governo central gastou até agora menos do que poderia para cumprir o teto constitucional, mas resolveu abandonar as metas fiscais deste ano e do próximo, de R$ 139 bilhões e R$ 129 bilhões, respectivamente. Ambas serão agora de R$ 159 bilhões - um simbólico R$ 1 bilhão a menos do que o déficit primário deixado em 2016, ano em que a presidente Dilma Rousseff foi retirada da Presidência.
A meta fiscal de 2017 se revelou inexequível, não pela falta de controle das despesas, mas por uma arrecadação bem menor do que a prevista - e superestimada. Afrouxar a meta de 2018 foi precipitado, mas a folga atende ao calendário eleitoral.
A mudança das metas, na existência do teto de gastos, não será um desastre. Mas é um péssimo sinal: ao contrário do prometido, o governo Temer não terá conseguido melhorar o resultado fiscal nos dois anos em que exercerá plenamente o poder. Os resultados negativos só serão cadentes depois que ele deixar o Planalto. O primeiro superávit, de R$ 10 bilhões, previsto para 2020, se tornará um déficit de R$ 62 bilhões.
O presidente Michel Temer deve sua sobrevida no Planalto aos políticos, que não querem aumento de impostos, o que é defensável, nem corte de despesas, o que é mais do que necessário. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, escudado no teto de gastos, é refém de receitas. A previsão de crescimento nominal de 10% na arrecadação de 2017 chocou-se com a realidade. Já as de 2018 estão provavelmente subestimadas.
Além da frustração de receitas, contou-se demais com recursos não recorrentes (R$ 54,9 bilhões), que também não deverão ser obtidos. Os deputados deformaram o novo Refis, que quase não produzirá receita adicional no ano, ante ingresso esperado de R$ 13 bilhões. Várias concessões e desestatizações planejadas não estão asseguradas. Apesar das sucessivas promessas, o planejamento é lento e indeciso - ainda se discute, por exemplo, quais aeroportos serão concedidos em 2018, por exemplo. Falta competência na execução.
Com a mudança do regime fiscal, o relevante é a manutenção do teto de gastos. A meta fiscal passou a ser uma decorrência das receitas, embora uma gestão ativa continue relevante para influir na magnitude do déficit primário, que tem impacto na dívida bruta, em crescimento acelerado.
A alteração das metas pode não ser tão relevante para 2017, mas o é para 2018, quando as despesas estarão comprimidas dentro de um figurino muito estreito - poderão subir pouco mais de 3% e não contarão com a folga dos 7,2% da correção atual (na prática, um aumento real de 3,5%).
A equipe econômica sabe disso e estima, segundo avaliação de receitas e despesas do terceiro bimestre, que os gastos sob a regra do teto terminarão o ano em R$ 1,272 trilhão, abaixo do R$ 1,309 trilhão permitido - folga de R$ 37 bilhões (2,8%). Essa "poupança" permitiria algum alívio em 2018, quando as despesas poderão aumentar cerca de R$ 40 bilhões. Só a evolução dos gastos previdenciários (por baixo, mais R$ 18 bilhões) e da folha de pagamentos (mais R$ 22 bilhões) consumirão toda essa margem e exigirão o controle estrito das demais rubricas do orçamento.
Na ausência da reforma da Previdência, os cortes de gastos pontuais auxiliarão na manutenção do teto por algum tempo. O governo proporá elevação para 14% da contribuição previdenciária do funcionário que ganha acima de R$ 5 mil e também cortará vento - promete acabar com 60 mil cargos vagos no Executivo. Os reajustes dos servidores serão postergados por 12 meses e o de cargos comissionados, cancelados. Foi prometida a reestruturação de carreiras do Estado, algo fácil de falar e difícil de fazer. Será aumentada a tributação sobre fundos exclusivos. Com as medidas, é esperada economia de R$ 14,5 bilhões no curto prazo.
O governo jogou a toalha em 2018, quando as receitas podem surpreender, embora pela projeção oficial sejam menores que as de 2017 (20,5% e 20,6% do PIB, respectivamente). O economista Francisco Lopes fez outras contas e antevê drástica reversão no quadro fiscal, com o déficit podendo cair abaixo de R$ 130 bilhões, a meta agora abandonada.
O recuo nas metas indica que o teto de gastos se tornou mais frágil e o conserto da péssima situação fiscal, uma tarefa de mais longo prazo ainda do que se previa, com chances maiores de ruir no meio do caminho.
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