- Valor Econômico
Tucanos perderam o ativo da ética para a eleição de 2018
Na última contagem do ano, o Palácio do Planalto contabilizou 264 votos favoráveis à reforma da Previdência, que o governo quer votar em fevereiro de 2018. Ainda está longe dos 308 para aprovar a emenda constitucional. Vai depender do humor dos parlamentares na volta do recesso. Em geral deputados e senadores voltam do "contato com as bases" muito mais críticos em relação a tudo o que diz respeito ao governo, mas as pesquisas qualitativas em poder do Planalto indicam que a propaganda sobre a reforma no rádio e televisão encontrou receptividade na população. O otimismo na coordenação política do governo também aumentou, na contra-mão do ceticismo generalizado.
Diz a leitura das pesquisas quantitativas manuseadas no Planalto que o deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ), na ausência de Lula (PT), é o futuro presidente da República. Pode ser. Mas o ex-capitão do Exército aparentemente desacelerou nas pesquisas, enquanto Lula continua em crescimento, segundo o Datafolha do início de dezembro. O problema de Lula é jurídico - ele pode ser enquadrado na Lei da Ficha Limpa e não disputar.
Os marqueteiros e os políticos têm uma opinião em comum sobre a candidatura de Bolsonaro: ela será derretida quando a campanha começar pra valer. Em sua cruzada radical Bolsonaro deixou uma trilha de vídeos que expõem toda sua contradição. Mas nunca é demais lembrar que ele tem 11% na pesquisa espontânea, contra os 17% de Lula - os outros, 1% cada.
A grande interrogação da eleição de 2018 é o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, governador de São Paulo. Aliados como o ex-senador Jorge Bornhausen afirmam que a campanha de Alckmin está muito mais profissional, comparada a de 2006, quando o governador até foi bem no primeiro turno, mas perdeu votos no segundo turno para Luiz Inácio Lula da Silva.
Oficialmente, Alckmin ainda não é candidato, o que limita seu raio de ação. Mas para um candidato que governa o maior Estado da Federação (o que às vezes atrapalha mais que ajuda) e tem o recall da eleição de 2006, esperava-se mais que 8% na pesquisa Datafolha - atrás de Lula, Bolsonaro e Marina Silva (Rede).
É até difícil visualizar uma campanha para presidente sem PT e o PSDB no segundo turno, como ocorre desde 1994, quando Lula entrou como favorito, mas perdeu no primeiro turno para Fernando Henrique Cardoso e o Plano Real, o grande eleitor daquela disputa -Itamar Franco era o presidente da República, mas FHC, que era ministro da Fazenda, ficou com os dividendos eleitorais da derrota da inflação. O PSDB ganhou duas e perdeu quatro, mas nunca esteve fora das finais.
Segundo as pesquisas, isso pode ocorrer agora em 2018. Mas o problema talvez não esteja na falta de sal do candidato. Pode estar no partido, o PSDB, que perdeu o rumo depois de ser apanhado nas teias da corrupção. Em contraposição ao PT, a postura ética poderia ser um dos grandes ativos do PSDB na eleição, mas o partido ficou paralisado, ao ser tragado pelo mesmo ralo que levou os petistas.
Em artigo publicado na semana passada, o sociólogo Bolívar Lamounier, um dos fundadores do PSDB, expõe cruamente o drama da militância tucana. O mais grave fator de desgaste é Aécio Neves. Reconhece que o senador mineiro não é réu em nenhum processo, mas o pedido de empréstimo (R$ 2 milhões) que fez a um empresário de péssima reputação (Joesley Batista, da J&F) foi um "fato ética e politicamente gravíssimo, que está levando um grande número de tucanos, quadros e eleitores, a descrer de vez do partido".
Lamounier prevê uma derrota acachapante de Aécio em Minas. Neste momento, diz Lamounier, "Aécio encarna o avesso da demanda ética que presidiu à fundação do PSDB, cuja recuperação é condição sine qua non para a própria sobrevivência do partido". O texto teve ampla difusão, entre os militantes do PSDB, via redes sociais. O sociólogo sequer poupa os tucanos de São Paulo, acusados de corrupção desde a década de 1990 envolvendo o governo do Estado com as empresas Alstom, Siemens, e o cartel das empreiteiras brasileiras.
"Tenho a mais profunda convicção de que o PSDB não sobreviverá se não passar tudo isso a limpo - "duela a quien le duela" -, e o comandante de tal processo só pode ser o governador Geraldo Alckmin, sob pena de se inviabilizar como candidato à Presidência" - escreveu Lamounier. O sociólogo, que vota partidariamente, admite inclusive não sufragar o PSDB, se assuntos como esses não forem assumidos e resolvidos satisfatoriamente.
Depois de ocupar todo o espaço do PSD destinado à propaganda eleitoral, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, precisa se mover nas próximas pesquisas, para ser levado a sério no seu partido. Ele poderia ser o nome para tentar organizar o centro político, se Alckmin fracassar na tarefa. Também poderia herdar o "legado" econômico se o próprio Michel Temer não se apresentar para a empreitada - tem uma avenida a ser ocupada, se Lula não for candidato. O presidente vai apoiar qualquer nome que defender o "legado" do governo. Além da desconfiança, Meirelles tem pela frente a substituição no Ministério da Fazenda. Por enquanto, nada indica uma sucessão "por dentro" na Pasta.
Depois de 1989, eleição vencida por Fernando Collor e o minúsculo PRN, as grandes organizações partidárias trataram de se blindar contra o outsider. Sem Lula no páreo, por enquanto sobra Bolsonaro. Apenas Marina Silva (Rede) herda uma parte que o Datafolha considera expressiva (cerca de um terço) dos apoiadores do ex-presidente. O número dos que declaram votar branco ou nulo cresce até 30%, sem o nome de Lula na cédula. PT, PSDB e sobretudo o PMDB são partidos nacionais e podem vir a se beneficiar da rede que montaram no país. São os de maior capilaridade. O PMDB desde 1994 não protagoniza uma eleição. PT e PSDB, os polos da disputa nos últimos 24 anos, podem agora ficar fora do segundo turno.
Um comentário:
Parabéns pelo excelente blog! Vou seguir! Abraços e um Ótimo 2018!!
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