domingo, 11 de fevereiro de 2018

‘O auxílio mina a credibilidade da Justiça, que já está desgastada’

Ex-ministra do STJ e ex-corregedora-geral da Justiça diz que defesa do auxílio-moradia por entidades de classe de juízes está ‘mal arrumada’ legal e moralmente

Miguel Caballero / O Globo

• Como a senhora tem acompanhado a discussão sobre o auxíliomoradia para o Judiciário?

Todas as vezes que o magistrado se locupleta de alguma gratificação que não está bem explicada, existe um grande desgaste para a credibilidade da Justiça, que já está bem fragilizada. Temos de fazer força para que a sociedade cada vez mais acredite no Judiciário. E este é um problema que mina a credibilidade.

• Por que o auxílio não deveria existir, na sua opinião?

Minha posição não é de agora, que estou aposentada. Votei contra o auxílio no Conselho da Justiça Federal, quando estudei bem a questão. A Lei Orgânica da Magistratura (Loman) não contempla o auxílio-moradia para juiz, a não ser na circunstância específica de quando está fora de seu foro natural. Fora isso, é um puxadinho.

• Alguns juízes argumentam que o auxílio serve como uma espécie de compensação para uma categoria que não tem recebido reajustes.

Ora, se é aumento salarial, deveria incidir imposto de renda e pagar também aos aposentados, o que não ocorre. Pela condução da própria defesa do auxílio-moradia, vê-se que não é uma coisa muito arrumada do ponto de vista da legalidade, nem da moralidade. E aí se amplifica a coisa. O que está errado é como boi que passa numa cerca: pelo portão que passa um, passa uma boiada. Aí, há gente com imóvel próprio na cidade onde vive recebendo auxílio, caso de marido e mulher ganhando, e por aí vai... (o caso mais conhecido em que um casal de juízes recebe dois auxílios é o dos juízes federais Marcelo e Simone Bretas, no Rio). Não quero ser palmatória do mundo, mas no íntimo não acho uma coisa certa.

• Qual a melhor solução para o caso?

Seguir a lei, a Loman. Esse mal-estar entre os juízes com o auxílio-moradia surgiu por duas circunstâncias. Primeiro, muitos juízes que estavam em Brasília recebiam, corretamente, porque foram afastados de seus foros naturais. Outro fator foi que, quando um juiz é promovido e vai para outro lugar, seu foro natural o acompanha, ou seja, não tem o auxílio. Mas se ele leva junto juízes para assessorá-los, outros funcionários, esses têm direito. Muitos juízes diziam “meu assessor tem e eu não tenho?”. Tudo isso colaborou para essa pressão pela generalização de um benefício que não é para todos.

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