segunda-feira, 18 de junho de 2018

Lições da eleição de 2002 para a campanha de 2018: Editorial | Valor Econômico

Muito se tem falado sobre as semelhanças da campanha presidencial de 2018 com a eleição de 1989, a primeira disputa direta para o Palácio do Planalto do período pós 64. Na semana em que se completam 16 anos da Carta ao Povo Brasileiro, talvez seja mais interessante comparar o atual momento com período idêntico da turbulenta sucessão de 2002, que terminou com a eleição de um operário para a Presidência da República.

A campanha de 2018, de fato, guarda muitas semelhanças com a de 1989. Ontem como hoje havia grande fragmentação partidária. Ao todo, 21 partidos apresentaram candidatos à primeira eleição direta para presidente depois de 25 anos de regime autoritário. O flagelo da época era a inflação, que o candidato afinal vencedor prometia derrubar com um só tiro. Era uma época de transição da ditadura para a democracia.

O ambiente eleitoral de 2002 também era de crise econômica, mas os pilares da estabilidade estavam assentados. A dúvida era se o governo seguinte teria o interesse de mantê-los, e o então presidente Fernando Henrique Cardoso, mal saído de um apagão de energia elétrica, emitia claros sinais de que não conseguiria fazer o sucessor. A oposição era favorita. Mesmo que FHC tivesse êxito, José Serra, o candidato do Palácio do Planalto, não inspirava confiança aos mercados. A pergunta, naquele junho, como hoje, era até onde poderia chegar o câmbio.

Serra também não ajudava. Era o candidato do governo Fernando Henrique, mas procurava se descolar das crises do governo FHC. O slogan da campanha era o da "continuidade sem continuísmo". O candidato só alimentava as especulações sobre suas diferenças com a equipe econômica da época, chefiada pelo ministro da Fazenda, Pedro Malan. No Banco Central pontificava o economista Armínio Fraga - nada mais diferente que o desenvolvimentista José Serra.

Nos dias de hoje é Henrique Meirelles, ex-ministro da Fazenda e candidato do Planalto, quem procura distância do governo Michel Temer. É certo que havia diferenças doutrinárias entre Serra e a equipe econômica do governo, mas o que o afastava do Planalto e afasta agora Meirelles era também a impopularidade do fim da era FHC no Planalto Central.

Na passagem do governo FHC para o governo Lula começou também a crise de hegemonia política da centro-direita, que hoje se apresenta em frangalhos para as eleições de 2018. Durante oito anos Fernando Henrique governou com a estabilidade assegurada pela aliança PSDB-PFL, amplamente majoritária no Congresso, e franjas do então PMDB (que depois entrou por inteiro no governo) e outras legendas viciadas nas antessalas do poder, não importa quem o exerça. Na eleição de 2002, Serra trocou o PFL pelo PMDB na vice - perdeu os pefelistas e não levou a maioria pemedebista.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato pela quarta vez, pressentia a vitória e aos poucos foi se deslocando da esquerda para a direita. Primeiro virou o "Lulinha Paz e Amor". Depois seguiu um pouco mais na mesma direção com a aliança com o Partido Liberal, hoje PR, que levou o empresário José Alencar à vice-presidência da República. Lula reduziu as críticas à política econômica e abriu o flanco para os ataques de Ciro Gomes e Anthony Garotinho, à época candidatos a presidente do PPS e do PSB. Nem isso bastou para acalmar os mercados.

No dia 22 de junho de 2002, Lula se rendeu, assinou a Carta ao Povo Brasileiro e foi direto ao que interessava: "Premissa dessa transição (na economia) será naturalmente o respeito aos contratos e obrigações do país. As recentes turbulências do mercado financeiro devem ser compreendidas nesse contexto de fragilidade do atual modelo e de clamor popular pela sua superação".

A carta não foi o bastante para conter os movimentos especulativos, o dólar ainda romperia barreiras, mas ao escrevê-la o ex-presidente, até então visto como um radical, agregou o centro político à sua candidatura. Ele já havia levado o PL, mas acabou arrastando também o PP e grande parte do PMDB.

No momento em que a expectativa de retomada do crescimento leva um novo baque e a intolerância parece tomar conta da campanha eleitoral, talvez seja bom olhar para aqueles dias em que a seleção brasileira se tornou pentacampeã na Copa do Mundo do Japão e Coreia do Sul.

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