- Valor Econômico
Ações policiais seriam populares em início de mandato
Jair Bolsonaro subirá a rampa do Palácio do Planalto, no dia 1º de janeiro, sob os aplausos de milhares de apoiadores que defenderam com ele o discurso de "tolerância zero contra o crime" na última campanha eleitoral. Nos dias seguintes, o plano de integrantes da equipe de transição é que o Executivo já possa transformar o programa de governo em ações concretas capazes de garantir popularidade ao presidente da República e um antídoto contra eventuais acusações de estelionato eleitoral.
Espera-se, entre auxiliares do presidente eleito, uma série de operações contra o crime organizado logo no início do governo. Essa pode ser a única agenda positiva imediata da próxima administração logo no início do mandato.
Bolsonaro deve assumir a chefia da nação numa conjuntura econômica desafiadora, na qual precisará comprovar a capacidade de aprovação de uma reforma da Previdência e outros projetos que tornem o Brasil mais amigável a empresários e investidores. Até agora, no entanto, ainda é uma incógnita se Legislativo e Executivo trabalharão, na prática, em harmonia. Afinal, corporações e dirigentes políticos alijados do centro do poder por Bolsonaro terão muitas oportunidades para abreviar o clima de romance entre o futuro presidente e a população.
Os parlamentares podem, por exemplo, atrapalhar os planos do governo de alterar a estrutura governamental, enxugar a máquina pública ou reduzir benefícios de setores do funcionalismo público. Tudo isso precisará passar pelo Congresso, e a velocidade de tramitação dessas propostas dependerá da boa vontade de quem conhece os atalhos e as armadilhas dos regimentos internos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Justamente os líderes que Bolsonaro buscará apartar do jogo político.
No Senado, onde as frentes parlamentares não são tão fortes como na Câmara, hoje o presidente eleito teria dificuldades para flexibilizar o estatuto do desarmamento. Provavelmente terá que negociar e construir uma proposta alternativa viável, para conseguir reduzir a maioridade penal. Essa é a percepção, inclusive, de senadores influentes ou que pretendem presidir a Casa no próximo biênio.
Ainda tentando decifrar os anúncios feitos por Bolsonaro via redes sociais, parlamentares recém-eleitos tentam entender para quem telefonarão quando quiserem digitar algum ramal do Palácio do Planalto. A cada dia há, na estrutura de governo em construção, sinalização diferente de quem será esse interlocutor. O caminho não está livre, neste momento, para as propostas de perfil bolsonarista em tramitação no Congresso.
Já os capítulos do seu programa de governo que versam sobre costumes e liberdades individuais também podem ser impedidos de entrar na legislação, em futuros julgamentos a serem realizados pelo Supremo Tribunal Federal.
O STF deve retomar a análise do caso que trata da descriminalização do porte de drogas. Na Câmara dos Deputados, há ainda a esperança de que os ministros do STF se debrucem sobre o projeto "Escola Sem Partido", declarando logo a inconstitucionalidade da proposta e afastando de vez essa polêmica das comissões e dos plenários do Parlamento.
Sem troféus a levantar na área econômica ou na agenda legislativa à disposição no curtíssimo prazo, o governo voltaria suas forças, então, para as medidas que só dependem de seus próprios meios para sair do papel.
Diversos integrantes da equipe de transição possuem experiência na área de combate à corrupção e ao crime organizado. Eles já têm em mãos todo um mapeamento sobre a atuação de facções criminosas, assim como das violentas disputas por elas mantidas em cada região, Estado e presídio do país.
Todos os últimos ministros da área e presidentes da República prometeram combater o crime organizado. Desta vez, no entanto, Bolsonaro prometeu colocar para valer as Forças Armadas em campo. Deve também aproveitar um decreto, assinado pelo presidente Michel Temer, criando uma força-tarefa de enfrentamento ao crime organizado coordenada pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência. A criação de uma Secretaria de Operações Policiais Integradas pelo futuro ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, está nesse contexto.
Integrantes do futuro governo dão como certa a realização de uma série de operações de impacto contra o crime organizado, mas também colocaram na matriz de ônus e bônus dessa iniciativa alguns riscos. Estão no radar, por exemplo, possíveis ações insufladas por facções que possam atrapalhar o livre fluxo em rodovias e no transporte público das principais cidades brasileiras. Mesmo assim, para auxiliares de Bolsonaro, o apoio popular e a manutenção da mobilização de setores organizados da sociedade em favor do governo serão vitais para o sucesso da estratégia desenhada durante a campanha.
Caneladas
Quem acompanhou a atuação de Jair Bolsonaro no Parlamento surpreendeu-se com as caneladas, como o presidente eleito gosta de chamar os desentendimentos verbais em que se envolve, com a Ordem dos Advogados do Brasil. Não por causa da contenda em si, mas por que o assunto até demorou a entrar em pauta.
Em 1992, Bolsonaro protocolou um projeto tentando garantir o exercício da advocacia por militares da ativa bacharéis em direito. O deputado retomou a proposta quatro anos depois, e em 2000 quis garantir pelo menos que os militares pudessem prestar o exame da Ordem.
Em 2007, Bolsonaro então passou a defender o fim da exigência do exame para a inscrição de advogados na OAB, o que elevaria os poderes dos estabelecimentos de ensino credenciados e do Ministério da Educação. O choque entre deputados - entre eles o presidente eleito - e a OAB voltou a ocorrer em 2014. Eduardo Cunha estava à frente do movimento, naquela época. Mais caneladas devem ser trocadas a partir de janeiro.
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