Bolsonaro deverá passar pela experiência do PT de enfrentar limites constitucionais
O presidente Jair Bolsonaro não inova ao montar um governo em núcleos. Há os polos técnicos, aos quais cabe enfrentar sérias dificuldades na economia e na segurança pública, e ainda existe um grupo de militares qualificados que atuam também em áreas-chave. Algo semelhante aconteceu nos governos Lula, principalmente no primeiro mandato, quando a condução da política econômica, num momento difícil de inflação em alta e recessão, foi entregue à gente experiente, sob Antonio Palocci, ministro da Fazenda, petista de primeiro escalão, mas flexível e permeável ao bom senso.
Lula espalhou militantes e pessoas alinhadas ideologicamente a ele pelo resto do governo, e Bolsonaro fez o mesmo. O Itamaraty, com Lula e agora, tem no seu comando uma réplica ideológica do presidente. O chanceler Ernesto Araújo, em larga medida, está para Bolsonaro assim como Celso Amorim e Samuel Pinheiro Guimarães estiveram para Lula. Na era lulopetista isso ocorreu no entorno do governo, em ministérios e secretarias relacionados às áreas de interesse do partido: reforma agrária, meio ambiente, direitos humanos, educação etc. Além, por óbvio, dos cargos políticos.
O mesmo padrão, digamos, de aparelhamento, ocorre sob Bolsonaro. Intelectuais e ativistas de direita ocupam o MEC, tratam das questões ambientais, preenchem, enfim, cargos relacionados à agenda seguida por Bolsonaro, para atacar a esquerda. É assim na democracia. Da nova pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos, a ministra Damares Alves, pastora, milita contra o aborto, fustiga a comunidade LGBTI, entre outras. Na Agricultura, assumiu a deputada Tereza Cristina (DEM-MS), sugestivamente líder da bancada ruralista, e influente na escolha do responsável pelo meio ambiente.
O governo Bolsonaro é, enfim, neste aspecto de organização, o governo Lula com sinal trocado. O ponto a destacar é que, assim como Lula, Bolsonaro deverá viver a experiência de ser obrigado a obedecer os limites institucionais. Isso deverá ficar visível no campo social e de comportamento. Qualquer proposta progressista ou conservadora que esbarre em dispositivos legais, constitucionais, não prosperará.
A gestão lulopetista fez algumas tentativas de tutela e de controle do jornalismo profissional. Infrutíferas. Além de resistências no Congresso, o Supremo foi muito claro ao revogar a lei de imprensa da ditadura e ao reafirmar a liberdade de expressão, na qual se inclui a de imprensa, como direito constitucional.
O governo Bolsonaro poderá passar por experiências semelhantes, se investir contra avanços sociais já sacramentados pelo Supremo, como a união homoafetiva. Isso só reforçará o saudável reconhecimento de que o estado democrático de direito delimita espaços, independentemente do número de votos tido pelo chefe do Executivo.
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