Além de colocar as contas públicas no vermelho, sistema transfere renda de pobres para ricos
Para comprovar a afirmação de que é da discussão que nasce a luz, o atual debate sobre a Previdência, iniciado no governo Michel Temer, iluminou o aspecto deletério de o sistema funcionar como eficiente usina de produção de injustiças sociais. Não é difícil entender o mecanismo. Como cada sistema previdenciário acumula déficits crescentes, o Tesouro é obrigado a sacar do bolo de dinheiro que arrecada de todos os contribuintes para tapar os rombos existentes em cada seguridade. E, nesta redistribuição, privilegia alguns segmentos afortunados, com grande poder de pressão sobre Congresso, Executivo e Judiciário, e que por isso já ostentam grandes vantagens em aposentadorias e pensões. Um mecanismo de enorme capacidade de concentrar renda.
As cifras do valor médio das aposentadorias no INSS, Executivo federal, Ministério Público, Judiciário e dos funcionários do Legislativo iam, em 2017, de R$ 1.369,9 a R$ 26.823. Entende-se, então, por que os funcionários públicos aposentados estão no topo da pirâmide de distribuição de renda do país. Perfilam-se entre os mais ricos.
Informações compiladas pela Secretaria do Tesouro mostram que, em 2017, os contribuintes foram obrigados a transferir R$ 6.100 para complementar a aposentadoria de cada segurado do INSS; R$ 71.500, no caso dos servidores públicos civis, e R$ 126 mil para cada militar da reserva.
É indiscutível o acerto da proposta incluída na reforma previdenciária do governo Temer, certamente a ser mantida na do ministro Paulo Guedes feita para o presidente Bolsonaro, de estabelecer um teto comum a todas as categorias. No caso, o do INSS (R$ 5.839,45), ou algo semelhante.
Ao se descobrir estes e outros mecanismos de privilégio, constata-se que aí está uma indiscutível explicação para o fato de o Brasil, apesar de ser um país em que os políticos não param de falar em “justiça social”, apresentar uma concentração de renda de monarquia oriental produtora de petróleo.
Explica-se: é porque, para se contrapor ao Bolsa Família, programa correto de transferência direta de renda, existem incontáveis esquemas legais que funcionam, sem ser transparentes para a população, bombeando dinheiro público para castas.
O conjunto de gráficos traz informações sobre o que esta Previdência produz no Brasil: gasta-se mais em Previdência, em percentual do PIB, do que os países ricos, reunidos na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE); e da forma como o gasto é feito, ele não tem impacto em termos de melhora da distribuição de renda. Ao contrário.
Usando-se o coeficiente de Gini (quanto mais próximo de zero, melhor a distribuição; e mais próximo de um, pior), fica evidente a perversidade social nas transferências do Tesouro — em que se destaca a Previdência — e no recolhimento de impostos diretos. Numa comparação entre renda inicial e final, depois dos impostos, o Brasil perde para vários países. Por exemplo, Reino Unido, Canadá, Japão, Estados Unidos e México. A lista é muito maior, e nenhum outro dos países relacionados bate o Brasil em má distribuição de renda.
Firma-se então, e cada vez mais, a percepção de que a reforma da Previdência não é apenas — e isso já é muito — para salvar o Estado da insolvência, mas tem também como objetivo estratégico praticar de fato a justiça social.
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